Foto: Divulgação / IDEC

Por Maria Vitória de Moura

Em 2020, o México aprovou uma nova rotulagem frontal nos alimentos, a fim de alertar o consumidor sobre produtos com alto teor de açúcar, sódio, gorduras saturadas, gorduras trans e calorias. A medida adotada foi a rotulagem de advertência, com alertas no formato de hexágonos pretos na frente das embalagens indicando a presença desses componentes. Os novos rótulos foram aprovados com o objetivo de levar as pessoas a fazerem melhores escolhas em relação à sua alimentação. 

A nova norma de rotulagem foi aprovada pelo governo mexicano após diversas discussões e contribuições de organizações da sociedade civil e de saúde pública. Durante o processo de atualização da norma, foram realizadas mais de 20 reuniões envolvendo os comitês de saúde e economia, dentre outros relacionados ao tema, além de uma consulta pública. 

Os rótulos receberam reconhecimento internacional da Organização Mundial da Saúde (OMS), assim como da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), que realizou um estudo de avaliação para a América Latina e concluiu que a rotulagem permite que as crianças façam melhores escolhas alimentares.

“A reformulação de produtos tem sido enorme. A indústria de leite, pão, bebidas açucaradas, baixou os ingredientes que estão diretamente ligados às principais causas de morte no país: doenças cardiovasculares e diabetes”, disse Alejandro Calvillo, diretor da ONG mexicana El Poder del Consumidor, sobre o sucesso da nova rotulagem na diminuição do consumo de ultraprocessados. 

Em 2020, ano em que foi implementada a nova rotulagem, houve 240 mil mortes causadas por questões relacionadas ao sobrepeso e obesidade no México. Além disso, o país era o maior consumidor de bebidas açucaradas no mundo. Hoje, dois anos depois, o México encontra-se em quarto nesse ranking. Especialistas confirmam a importância da nova rotulagem na mudança de estilo de vida entre os mexicanos.

Segundo a ONG El Poder del Consumidor, o único setor que se posicionou contrário à nova rotulagem foi o da indústria de ultraprocessados. Setores da indústria chegaram a conseguir, ainda em 2020, uma liminar para suspender a norma, mas essa foi prontamente rejeitada por unanimidade pelo tribunal responsável pelo caso.

Neste ano, algumas indústrias de ultraprocessados voltaram a entrar com uma liminar contra a nova rotulagem, principalmente pela queda em seus faturamento após a adoção da medida. A liminar realizada pela empresa Barrilito será resolvida hoje (09/11) no Supremo Tribunal de Justiça da Nação (SCJN). A instituição El Poder del Consumidor informou que o SCJN já recebeu outros cinco casos para eliminar a medida sanitária, das empresas Santa Clara, Mondelez, Herdez, McCormick e Nutrisa. Organizações civis se manifestaram exigindo que o Supremo mantenha os novos rótulos de advertência. 

O domínio dos ultraprocessados no consumo diário dos mexicanos interrompeu uma sociedade de cultura alimentar rica, com receitas tradicionais envolvendo alimentos in natura, como milho e feijão. A chegada das indústrias de junk food no país, em conjunto com a precarização do trabalho e o aumento do preço dos alimentos tradicionalmente consumidos, levou os mexicanos a incorporar cada vez mais os produtos ultraprocessados, com poucos nutrientes e muitos ativos químicos, ao seu dia a dia. 

Essa transição alimentar do milho para o Big Mac ocorreu em torno dos anos 1970. De lá pra cá, a obesidade triplicou no México. Também como efeito do maior consumo de ultraprocessados, a diabetes se tornou uma epidemia no país, afetando 1 em cada 6 adultos. A proposta da nova rotulagem é justamente colocar um freio na influência que as grandes corporações possuem sobre a alimentação da população mexicana, o que tem dado resultados significativos e incomodado profundamente as empresas de ultraprocessados.