Eletrobras tem prejuízo líquido de R$ 88 mil no 3º trimestre e setores contrários à privatização cobram iniciativa do presidente eleito Lula

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Por Mauro Utida

Contrariando as previsões mais otimistas, que apostavam num resultado robusto no primeiro balanço inteiramente sob gestão privada, a Eletrobras apresentou prejuízo líquido de R$ 88 mil no terceiro trimestre do ano. Em igual período de 2021, a empresa havia reportado lucro de R$ 965 milhões.

Com mais uma previsão incorreta do mercado, o debate sobre a retomada do controle estatal da maior elétrica da América Latina torna-se ainda maior com a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência. O presidente eleito manifestou em campanha que iria reverter a estatização da Eletrobras caso fosse eleito.

O Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE), que foram contrários a privatização da Eletrobras pelo governo de Jair Bolsonaro (PL), através da Medida Provisória 1031/2021, tem essa pauta como principal para discutir com o governo eleito.

Para a especialista em Energia e Sociedade no Capitalismo Contemporâneo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e trabalhadora do Sistema Eletrobrás, Fabiola Latino Antezana, o governo Lula vai precisar agir neste sistema para não carregar uma grande bomba relógio nas mãos, pois a energia no governo petista será vendida mais mais cara para o povo por causa da privatização.

“O que aconteceu com a Eletrobras foi um verdadeiro crime, sobre todos os aspectos não apenas financeiro. As empresas estatais tem um papel estratégico. Pensando no país e no povo por um energia a preço justo, além de uma transição energética, alguma coisa vai ter que ser feito”, declarou Fabiola, que também é integrante da Plataforma Operária e Camponesa de Água e Energia.

O especialista em energia e membro da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Fernando Fernandes, alerta que as consequências pela privatização da estatal começaram a ser sentidas pela população a partir de 2023, pois o impacto do aumento da conta de luz foi prolongado para não prejudicar a campanha eleitoral de Bolsonaro.

“Existe possibilidade técnica e jurídica de reverter a desestatização, mas Lula vai precisar comprar briga com o capital financeiro”, informa Fernandes, que também é membro e secretário nacional da Plataforma Operária e Camponesa da Água e Energia.

As iniciativas elencadas pelo especialista em energia passam por questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre fragilidades no processo de venda e vão até uma possível recompra de ações da companhia para que o governo volte a deter mais de 50% da empresa.

Aumento da conta de energia

A privatização da Eletrobras foi aprovada na Câmara e no Senado, em junho de 2021, através da Medida Provisória 1031/2021, de Jair Bolsonaro (PL). Vender o controle da estatal ao mercado financeiro foi executado pelo Ministro da Economia Paulo Guedes, porém o projeto havia iniciado no governo golpista de Michel Temer (MDB).

Além da Eletrobras, a privatização também atingiu suas empresas subsidiárias: Chesf, Eletronorte, Furnas, Eletrosul, Cepel, entre outras. Hidrelétricas como Tucuruí, Belo Monte, Xingó, Sobradinho, Itaparica, Paulo Afonso e dezenas de outras, em pleno funcionamento e estratégicas para o país, foram transferidas para o controle de uma minoria privilegiada do mercado financeiro.

O governo Bolsonaro justificou que a privatização poderá diminuir em 7,36% a tarifa de energia. Porém, Fernandes explica que este argumento é uma falácia completa, pois junto com a Lei da Privatização da Eletrobrás, o governo conseguiu aprovar uma série de outras medidas que, juntas, aumentarão o custo da energia aos consumidores finais. Resumindo, com a privatização, essa diferença será repassada integralmente em aumentos futuros nas contas de luz da população.

“Antes a energia era vendida a preço de custo pela Eletrobras, por R$ 65,00 a cada 1.000 kWh (R$ 65/MWh), já as usinas privadas vendem a R$ 300,00 a cada 1.000 kWh. A primeira medida será igualar o preço do mercado para poder beneficiar os acionistas. Ainda não sentimos este aumento porque o governo do Bolsonaro se preocupou com a consequência negativa para ele durante o período eleitoral, mas a partir do próximo ano o brasileiro poderá ter um aumento de 20% na conta de luz”, alerta Fernandes.

“Este aumento pode impactar seriamente no desemprego com o aumento do custo para as médias e pequenas empresas, além do aumento do preço dos alimentos”, completa.

Análise do balanço da Eletrobras

Segundo a empresa, provisões operacionais e encargos adicionais afetaram o resultado do balanço do terceiro trimestre, principalmente devido aos encargos da dívida com a incorporação da Santo Antônio Energia.

Segundo Fabíola Antezana, que também é diretora do Sindicato dos Urbanitários do Distrito Federal (STIU-DF),
o aumento da dívida líquida da Petrobras é consequência do vale tudo do governo Bolsonaro para garantir a privatização.

“Eles não mediram consequências para entregar a empresa ao mercado financeiro chegando ao ponto de aumentar a dívida líquida da empresa em valores bilionários. O balanço negativo da Eletrobras neste terceiro trimestre é fruto sim da privatização da estatal pelo Governo Bolsonaro”, critica a especialista em Energia.

No fim de setembro, a dívida líquida ajustada da Eletrobras era de R$ 33,522 bilhões, 75% maior que o visto no mesmo intervalo do ano anterior, substancialmente afetada pela dívida da Santo Antônio Energia, de aproximadamente R$ 19,8 bilhões.

A previsão do mercado, na média das estimativas de cinco casas de análise (BTG Pactual, Itaú BBA, JP Morgan, Santander e XP Investimentos) consultadas pelo Prévias Broadcast, a empresa teria lucro líquido de R$ 1,645 bilhão neste período do terceiro trimestre, porém o prejuízo líquido foi de R$ 88 mil. Erraram feio.

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