Como uma pandemia está apontando para uma quarta revolução industrial

Do Maker ao cientista de dados, da programadora ao piloto de drones. A crise causada pela Covid-19 que assola o mundo inteiro também pode ser vista como uma  oportunidade para quem atua em diferentes áreas da tecnologia. Inúmeras iniciativas, maratonas, hackatons, editais, projetos e mobilizações estão acontecendo pelo Brasil e pelo mundo com um único objetivo: salvar vidas.

Até dia 12 de abril de 2020 a Associação Médica Brasileira (AMB) já recebeu mais de 3.000 denúncias sobre falta de Equipamentos de Proteção Individuais (EPIs) em estabelecimentos de saúde. Como máscaras descartáveis ou ainda capotes impermeáveis, os EPIs são fundamentais para evitar a contaminação pela COVID-19 daqueles que estão tratando os doentes.

Ainda segundo a AMB, em mais de 75% dos estabelecimentos denunciados há relatos da falta de pelo menos três dos EPIs. Já em mais de 30% dos casos, todos os EPIs estão em falta. Vale lembrar que, além da segurança para médicos, esses equipamentos garantem a segurança dos pacientes, evitando a disseminação do vírus, já que os profissionais podem carregar a doença de forma assintomática.

E para solucionar este problema a tecnologia 3D passa a ser conhecida pela impressão de máscaras de proteção usadas em hospitais e consultórios. Diversos modelos foram criados, prototipados, testados e impressos em larga escala em países como China e Itália. Estes projetos foram documentados e seu passo a passo compartilhado nas redes. E mostram resultados. 

No Brasil protótipos de protetores faciais foram desenvolvidos na UFRJ em parceria com o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho. Ainda, outras universidades passam a inserir no setor como UFF, PUC-Rio, Unirio, UFPR e UFOB. 

O movimento Maker, ou seja,  o “faça você mesmo” – uma cultura composta pela crença de que qualquer pessoa é capaz de criar, alterar, consertar e fabricar diferentes tipos de objetos com as próprias mãos – criam plataformas de mobilização como o Makers Contra Covid (https://makerscontracovid.net.br/). 

Além disso chats e grupos em aplicativos de mensagem (whatsapp ou telegram) nascem em questão de instantes e comunidades startupeiras se ativam na busca de soluções inovadoras, acessíveis e de baixo custo, procurando desenvolver um modelo de negócio escalável. Participo de alguns grupos no telegram, vinculados ao tema da construção de respiradores, e é incrível a potência da troca entre os membros e a construção coletiva sendo realizada além das fronteiras. A cada projeto que passa a funcionar é uma vitória e motivo de comemoração. 

Em Porto Alegre, o drone Pelicano 2020, da SkyDrones, é uma das iniciativas pensadas para ajudar a cidade na luta contra o contágio pulverizando os ambientes com desinfetante à base de cloro. Este projeto parte da experiência feita pelos chineses, que pulverizavam desinfetante pelos bairros e dispersavam aglomerações públicas além de alertarem as pessoas que caminhavam pelas ruas sem máscaras.

Todos estes são projetos e iniciativas estão sendo desenvolvidas na lógica de código aberto que se refere a um modelo de desenvolvimento criado em 1998, o qual promove o licenciamento livre com a possibilidade de consulta, examinação ou modificação do produto, sem a necessidade de pagar uma licença comercial, promovendo um modelo colaborativo de produção intelectual.

E o mercado aquece em diferentes formas e ações, ao contraponto dos retrocessos de incentivos vinculados ao governo federal. Grandes fundações e organizações públicas ou privadas lançam editais emergenciais desburocratizados para fomento da criação de soluções à Covid – 19. E dentro de seus requisitos está a criação de soluções em tecnologias de código aberto na nuvem.

Esta lógica possibilita diminuir o tempo de desenvolvimento para salvar vidas. Tudo que você fez e deu certo, eu posso copiar e melhorar e devolver para você. E assim sucessivamente e em rede. São os princípios da colaboração, compartilhamento e comunidade que se tornam vitais, literalmente.

E ainda, passamos por três grandes Revoluções Industriais e chegamos na quarta. A primeira, que aconteceu entre 1760 e 1840, movida por tecnologias mecânicas como máquinas a vapor e as ferrovias. A segunda no século 19 e início do século 20, tendo a eletricidade como principal inovação. A terceira em 1960, com o surgimento da informática e da tecnologia da informação, o uso de computadores pessoais e, mais tarde, nos anos 1990, a internet e as plataformas digitais. As revoluções se caracterizam por uma mudança abrupta e radical no ecossistema que motiva a incorporação de tecnologias, tendo desdobramentos econômicos, sociais e políticos. 

Em 2020, chegamos à quarta revolução. E os projetos que citei anteriormente são a comprovação de que realmente estamos vivendo ela. Já está no nosso léxico, imaginário e cotidiano a tecnologia 3D, a robótica, a inteligência artificial, a realidade aumentada, a biologia sintética, entre outras que formam um conjunto de tecnologias disruptivas. A quarta revolução industrial não se define por cada uma destas tecnologias isoladamente, mas pela convergência e sinergia entre elas. Está ocorrendo uma conexão entre o mundo digital, o mundo físico, que são as “coisas”, e o mundo biológico, que somos nós. 

Tudo que estamos passando transformará a forma como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos. Em sua escala, alcance e complexidade, a transformação será diferente de qualquer coisa que o ser humano tenha experimentado antes. E o open source, pode ser uma forma de retornarmos ao que éramos, a nossa ancestralidade, ao espírito colaborativo e em comunidade.

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