Raiara é jovem ativista que preferiu a luta dentro do território

 

Por Raiara Barros, bolsista do Guardiões da Amazônia*

Muita gente sai do território, em direção à cidade. Eu também fiz esse movimento, mas preferi o inverso. Conto minha história, debaixo dessa árvore. Queria que você pudesse sentir a brisa e a sensação maravilhosa que eu estou tendo no momento. Estou em um paraíso particular.

Sou moradora da Reserva Extrativista Chico Mendes, no município de Xapuri, no Acre. E permanecer aqui foi a melhor escolha que eu fiz, passei por um grande dilema. Vou contar tudo. Deixa só eu me ajeitar aqui. É que o sol está querendo pegar no meu rosto. Pronto!

Depois de escutar tantos relatos de que morar na cidade era a melhor coisa que podia me acontecer, eu quis experimentar e viver esse trem! No início de 2019, consegui uma vaga na Instituição Federal do Acre, para estudar no ensino médio, passei apenas três meses. Foram três meses de pura agonia.

Era tudo muito diferente de onde eu morava, os sons dos pássaros já não ouvia mais. A brisa da manhã, os cheiros diversos vindo da floresta já não os sentia também. Sentia falta também daquele cafezinho da manhã todo dia junto com a família. Toda minha força eu encontro na minha família. Isso me afetou muito e fez com que eu repensasse os rumos que muitos diziam ser os melhores. Que este seria o único jeito de eu ter uma vida promissora. Mas foi justamente ao tentar viver dessa maneira, que eu reconheci o valor de viver na floresta. De certo modo foi bom para eu valorizar a vida no território. Diante do desconhecido e de eu ser uma adolescente que não tinha a dimensão do quão grande é a floresta, achei que seria melhor viver na cidade. É aquela história que muitos conhecem.

Mas, depois de passar por essa experiência, tive a necessidade de parar um pouco no tempo e repensar no que eu estaria possivelmente construindo para minha vida, para o meu futuro e até, para as gerações futuras. Nesse momento, passou pela minha cabeça, todas as histórias de luta que meu pai, Raimundo Mendes, me contava. São milhares e diversas histórias, incluindo muitas lutas, que custaram vidas, inclusive, como a do nosso herói Chico Mendes. Ele foi covardemente morto. Assassinado porque queria salvar a floresta, o mundo e a vida de todos os seres humanos que dela dependem!

Com tudo isso, peguei a ruma de coisa que tinha levado e, voltei pra casa.

Me reconheço como parte desse ecossistema. É o meu lugar, de onde nunca deveria ter saído. O que deveria haver estímulo para quem permanece aqui, não de a gente precisar buscar fora. A partir do momento em que voltei pra Resex, me senti contagiada pelas histórias de luta dos meus antepassados, como se fosse a primeira vez que as estivesse escutando. E me entreguei de corpo e alma às causas do nosso território e da Amazônia.

Hoje sou uma jovem ativista ambiental, criadora da conta Poronga do Acre, no qual conto um pouco da nossa vivência na floresta. E vale ressaltar, conto com muito orgulho.

E parafraseando meu pai, o Raimundão, que diz muito isso, “eu só saio daqui da Resex, se for cortado aos pedaços e posto em um saco plástico”. Esta frase é muito forte pra mim, pois é a tradução da resistência. Vou resistir também pela vida na floresta. Pela floresta e para honrar todos os esforços, lutas e perdas. Se é por meio da luta que se vence, quero muitas conquistas.

 

* O Guardiões da Amazônia é um programa de formação de comunicadores da Casa Ninja Amazônia em parceria com o Comitê Chico Mendes e financiado pela Purpose Brasil e WWF Brasil