Associação Mata Ciliar acolhe animais vítimas das queimadas no interior paulista
Neste mês que manteve alto os focos de incêndio pelo país e interior de São Paulo, a instituição recebeu quatro animais de grande porte debilitados
Por Mauro Utida
Em agosto deste ano o Brasil registrou 5,65 milhões de hectares queimados, o que responde por quase metade (49%) da área queimada no país desde janeiro. Os dados são do MapBiomas, instituição que monitora as transformações na cobertura e no uso da terra no Brasil, divulgados no último dia 12. O estado de São Paulo foi um dos destaques do período: 86% da área queimada no estado entre janeiro e agosto deste ano ocorreu no mês passado, afetando principalmente os municípios de Ribeirão Preto, Sertãozinho e Pitangueiras. Como resultado, o fogo deixou rastros de devastação e um número assustador de animais silvestres em situação de extrema vulnerabilidade.
Em meio a esse cenário de destruição, a Associação Mata Ciliar, instalada em Jundiaí, cidade há 60 km da Capital, se tornou um refúgio para diversas espécies de animais silvestres vítimas das queimadas criminosas como ouriço, gambá e diversas espécies de pássaros. Neste mês que manteve alto os focos de incêndio pelo país e interior de São Paulo, a instituição recebeu quatro animais de grande porte debilitados. O número pode parecer baixo, mas segundo Samuel Oliveira Nunes, coordenador de Comunicação da Associação, a maioria dos animais não é resgatada porque não sobrevivem às queimadas. “A Associação Mata Ciliar só recebe aqueles que, por sorte, conseguem escapar do fogo e sobreviver o suficiente para serem encontrados. E, os que são resgatados, eles chegam nas piores situações”, lamenta.
Um exemplo desta triste realidade é uma anta adulta, encontrada em um canavial incendiado em Andradina, que chegou ao centro de reabilitação da instituição em estado grave. O animal que é um símbolo da rica biodiversidade brasileira estava prenha e amamentando um filhote, conforme exame de necropsia realizado por profissionais da instituição. “Ela estava no começo de uma gestação. Então, na verdade morreram três animais aí, né? A mãe, o filhote, que provavelmente ficou sozinho no meio da queimada, e esse feto que estava com ela”, informa Nunes.
No começo desta semana a instituição recebeu outra anta, mas desta vez um filhote, com pouco mais de um mês de vida, após ser resgatado pela Polícia Ambiental em Martinópolis. O filhote, que recebeu o nome de Martina, apresentava ferimentos no dorso e cabeça, provavelmente sofridos durante a fuga pela mata em chamas. “É difícil dizer se ela vai voltar para a natureza”, diz Michaely Watanabe da Cruz, cuidadora da tratadora da maternidade da Associação. “Como ela é filhote e perdeu os primeiros dias de vida com a mãe, que a ensinaria a caçar e aprimorar seus instintos selvagens, a chance dela sobreviver na natureza é muito pequena”, lamenta.
Além das antas, a Mata Ciliar também acolheu neste mês um filhote de veado catingueiro resgatado pelo Corpo de Bombeiros em Jundiaí em estado grave. Ele estava em uma vegetação de mata capoeira rasteira que pegou fogo e provavelmente fugiu e se perdeu da mãe. O número alto de filhotes resgatados acontece devido à época de reprodução de parte das espécies.
Outra vítima das chamas foi um tamanduá bandeira em Araçatuba resgatado com ferimentos leves, mas com problemas respiratórios por causa da inalação das fumaças. A inalação de fumaça como no caso do tamanduá pode causar sérios problemas respiratórios e levar à morte. Outras consequências diretas do fogo são o aumento no número de atropelamentos. Durante o fogo, os animais fogem das chamas e acabam cruzando rodovias e estradas, aumentando a chance de serem atropelados. O medo do fogo também leva os animais a fugirem para áreas urbanizadas, onde acabam entrando em contato com os humanos e podem ser vítimas de acidentes ou ataques de cães.
O coordenador de Comunicação da Associação Mata Ciliar destaca a importância da prevenção. “O ideal é que os animais não chegassem até nós. Por isso é fundamental o trabalho de educação ambiental promovido pela Mata para promover ações de conscientização”, enfatiza.
Sob pressão
O trabalho da Associação Mata Ciliar é de extrema importância para proteção da biodiversidade, educação ambiental e conservação do meio ambiente, porém a situação da Mata é crítica: a demanda por atendimento é muito maior do que sua capacidade. A instituição já abriga cerca de 1.200 animais silvestres, mas se encontra em um momento de escassez de recursos e espaço físico. “Para nós, todo o ano aumenta o número de animais resgatados, independente da queimada ou não”, alerta Nunes.
Atualmente a entidade atende uma média de 25 animais por dia, um número que tem crescido consideravelmente nos últimos anos, principalmente devido ao aumento da especulação imobiliária na região de Jundiaí com grandes condomínios e parques industriais e áreas agrícolas na região de Araçatuba, onde predomina a monocultura da cana-de-açúcar por grandes lavouras. O que acaba ampliando o drama é que cerca de 40% dos animais resgatados acabam permanecendo na instituição, pois esses animais, geralmente filhotes ou com algum tipo de deficiência física, como perda de membros ou cegueira, não podem retornar à natureza.
A instituição, que possui convênio com 18 prefeituras, acaba atendendo mais de 60 municípios do interior de São Paulo. O trabalho também se estende além da fronteira paulista, recebendo animais de Minas Gerais e Mato Grosso, incluindo casos de onças que já foram resgatadas no Pantanal e levadas para tratamento em Jundiaí. A Associação Mata Ciliar é referência na área de proteção, reabilitação e reprodução de animais silvestres com o Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (CRAS) e o Centro Brasileiro para Conservação de Felinos Neotropicais.
O coordenador de Comunicação da Associação, Samuel Oliveira Nunes, destaca a necessidade de ampliação constante da estrutura para atender à crescente demanda. A sede em Jundiaí abriga a maior parte dos animais, mas a Mata também possui unidade em Araçatuba e possui projetos para ampliação de unidades do CRAS em Mogi-Mirim e Jaboticabal. “A gente precisa de mais espaço, mais recursos para cuidar desses animais que chegam em situação crítica”, afirma Samuel. Ele destaca a importância de buscar parceiros para viabilizar a construção de novos recintos, como um centro de reabilitação para felinos pequenos.
A busca por financiamento, doações e parcerias é crucial para garantir o futuro da instituição e a proteção da fauna silvestre. A instituição oferece abrigo, cuidados veterinários, alimentação e reabilitação, preparando os animais para um possível retorno à natureza. Para garantir que a Mata Ciliar tenha condições de continuar a desempenhar esse papel vital na proteção da fauna brasileira é possível colaborar através do site da instituição: http://mataciliar.org.br/site/doar/