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Precisamos conversar sobre a gravidade do que rolou nessa madrugada!

Já faz um tempo que eu não saio de casa na cidade onde eu atualmente moro (por acaso, minha cidade natal: Botucatu/SP). Preguiça social, ambientes com pessoas repleta de papos que não me interessam nem um pouco e a necessidade de recorrer ao álcool para me manter nesses lugares têm me feito escolher minha casa durante os finais de semana. Mas após ter uma semana pesada (intelectualmente falando) e envolvida em vários debates sobre política nos últimos dias, ontem (sábadão) resolvo ir pra night extravasar um pouco. Com preguiça de interagir socialmente, escolho uma festa private onde eu seria anônima. E assim foi! Lá, me diverti muito.

Como é costume no interior, eu e minha amiga terminamos a noite em um tradicional posto de combustível da cidade. Logo que chegamos, nos unimos a um cara na margem dos 40 anos muito bom de prosa e extremamente gentil. Lá, também, estava um conhecido mala, que diversas vezes já foi advertido sobre suas mensagens inconvenientes no meu inbox me xavecando após chegar das nights alteradíssimo. Vale lembrar que o mesmo só não tinha levado um block ainda pela insistência porque deletou seu Facebook.

Enfim, esse mala e sua trupe formada por mais uns outros seis homens resolveram se juntar a nós três naquele posto mesmo sem serem convidados. No decorrer de um papo estranho, começou uma discussão sobre o Bolsa Família. Me posiciono contra o que é dito na roda e afirmo que o Bolsa Família não é nenhuma esmola, não! Explico a necessidade do programa e tenho como resposta um “Mas foi criado pelo Lula ladrão”. Daí em diante, o papo transforma-se numa queda-livre angustiante. Falam mal do Lula e do Haddad daquele jeito alienado, mas mesmo assim eu mostro meu posicionamento e lhes revelo meu voto. Eles falam sobre o seu candidato (Jair Messias Bolsonaro), questiono o porquê da escolha, não ouço nada de coerente do lado de lá, entramos nas questões absurdas que o tal ser defende e ouço sarcasmo misturado com altas doses de ironia e deboche quando entramos no posicionamento do inominável em relação às mulheres.

Os caras tiram a gravidade do discurso do Bosta, então me imponho. E olhando diretamente para o meu único conhecido daquela trupe (o tal mala), afirmo que aquele assunto não é nenhuma brincadeira. Que coisas sérias e gravíssimas foram faladas pelo candidato queridinho dos “machos alfa de plantão” e que agora tá santificado em um hospital.

E que aqueles caras, como homens, nunca poderiam menosprezar quando nós, mulheres, nos mostramos diretamente afetadas e agredidas com aqueles discursos inconsequentes.

Minha amiga, vendo que eu estava concentrada em uma só pessoa e percebendo o rumo que aquele papo tomava (ela descreveu que todos os caras começaram a me olhar com ódio. Afinal, uma mulher, peitando um clube do bolinha e cheia de argumentos? Que ofensa à dignidade masculina! Quem eu achei que eu era pra enfrentá-los assim, publicamente??), me adverte para irmos embora segundos depois de um dos seres me confrontar fisicamente impondo sua altura e seu porte mais avantajado sobre o meu corpo.

Enfim, vazamos, cada uma no seu carro. No trajeto, resolvo desviar o caminho para passar no Drive Thru do Mc Donalds. Logo no começo da Avenida Vital Brasil, percebo um carro atrás muitíssimo próximo ao meu e dou sinal para ele me ultrapassar. Nada! Em uma nova tentativa de liberar a passagem, o carro se aproxima ainda mais e me enche de luz alta. Na terceira e última tentativa, confirmo o que estava acontecendo:

Havia sido seguida por um dos caras (obviamente, não o meu conhecido, pois eu conheço o carro dele) e, imediatamente, entro em desespero.

Tentando raciocinar logicamente, entro em pânico quando vejo que o tal Drive já havia fechado, o único lugar onde eu imaginava que seria possível despistá-lo ou pedir ajuda. Então, numa decisão extremamente rápida, acelero o carro como se eu fosse continuar pela avenida (o que faz o ser aumentar a velocidade também), desvio o veículo abruptamente para a esquerda até as correntes do Drive, dou uma ré desesperada e tento fugir do maluco que havia passado reto e já estava retornando para me alcançar. Daí em diante, entro na contramão em várias ruas, aumento a velocidade num cenário claro de fuga e, finalmente, consigo chegar em casa tendo seguido caminhos improváveis, onde eu desmorono.

Não tive coragem de acordar minha mãe naquele estado, mas mandei mensagem para alguns amigos ainda em choque desabafando. Hoje, conversando com xs mesmxs, percebo que aqueles caras estavam sob o efeito de cocaína e meu sentimento de impotência só aumenta quando me dou conta do que provavelmente teria acontecido comigo (uma agressão física brutal ou um estupro. Gente assim não costuma matar, eles querem mesmo é deixar a gente marcada pra sempre para “aprendermos a lição”). Contando para minha mãe, não temos dúvida de que por muito pouco eu me livrei de entrar para uma triste estatística em uma das cidades mais seguras para se viver no interior paulista. Por fim, tenho a certeza de que sair da minha bolha (repleta de pessoas da esquerda e/ou da galera universitária) se tornou extremamente perigoso.

Como disse um querido amigo, esse meu perfil de não abaixar a cabeça e de enfrentar as pessoas me coloca em situações perigosas, então me posicionar assim aqui pelas redes sociais acabou se tornando a opção mais segura.

Por tudo isso descrito, registro aqui o meu alerta para termos MUITO cuidado nas ruas nesse período de eleições onde um candidato que defende o porte de armas aparece em primeiro lugar nas pesquisas.

O Brasil se tornou um lugar completamente hostil. E os discursos de ódio com atos de violência estão muito mais perto do que a gente imagina.

Que Deus nos ilumine!

*Esse relato éde uma jornalista que não quis se identificar sobre perseguições e ameças que sofreu de eleitor de Bolsonaro.