Vila Viva: aula pública e atrações culturais envolve a comunidade do bairro Sarandi, em Porto Alegre
Roda de conversa sobre a violência e o genocídio da juventude negra aconteceu em bairro de Porto Alegre, envolvendo a comunidade e trazendo a pauta para perto das pessoas que vivem essa realidade.
Neste domingo, 1º de julho, aconteceu o evento Vila Viva, uma tarde de atividades no espaço Conceito Arte no bairro Sarandi, zona norte de Porto Alegre. O evento, focado no debate sobre a violência e genocídio da juventude nas periferias brasileiras convidou Juliana Borges, pesquisadora e autora do livro “O que é encarceramento em massa?”; Marcos Rolim, escritor, sociólogo e militante dos Direitos Humanos; Mariana Gonçalves, ativista do Movimento Negro de Porto Alegre, Socióloga e Mestranda em Ciências Sociais na PUCRS, para participarem de uma roda de conversa aberta junto à comunidade.
O evento iniciou com mediação de leitura com a declamação de Viviane Peixoto do poema Quilombo do Morro Alto, de Carlos Omar Villela Gomes, livro “Os Dez Mil Poemas”:
Eu sonho através das eras,
Pra mais de um século já…
Um futuro de igualdade
Muito mais que liberdade…
Futuro de identidade…
Esse futuro virá?
Na abertura da roda de conversa, Natashe Inhaquite, do coletivo Conceito Arte lembrou a importância de espaços de arte e cultura nas periferias. “Há alguns dias fui ver um filme no centro que falava sobre a vida na periferia, mas quando que a periferia vê esses filmes? Tem que ir até o centro”.
Juliana Borges fala de seu novo livro, e em uma aula de desenvolvimento social e histórico do Brasil, lembrou que a lei criminal durante a colonização era aplicada de forma distinta entre negros e brancos. Citou que de quarenta pessoas condenadas a morte durante a vigência do Código Criminal do Império Brasileiro, quatro brancos foram liberados, 11 eram negros escravizados e nenhum deles teve sua pena perdoada”, mostrando o tratamento diferenciado nas penas entre brancos e negros. “A violência racial é estrutural de nossa sociedade, reflexo de uma mentalidade colonizada (…). O Brasil foi fundado sob violência com o genocídio da população indígena.” Ela ainda critica os rescaldos desta mentalidade colonial entranhada nos critérios de seletividade da própria justiça brasileira: “A Justiça no Brasil não garante direitos, é uma engrenagem para garantir controle social e racial de uma determinada população do Brasil”.
Marcos Rolim mostrou em sua fala o pensamento macro a partir das relações individuais. “A gente sempre pensa as violências que praticam com a gente, mas a gente reflete as violências que fazemos com os outros?” Apresentou também dados e descreveu a situação de violência cotidiana a qual os moradores das periferias estão acostumados a conviver: “Moro há mais de 20 anos em Porto Alegre e nunca fui assaltado, vejo meus alunos sendo assaltados várias vezes num ano, sempre trocando de celular, mas faz parte dos meus privilégios de ser um homem branco, de classe média, ando de carro, não me exponho a noite”, lembrou.
E a mestranda Mariana Gonçalves definiu: “a pós-abolição vem junto com a industrialização e o capitalismo no Brasil. Criando os mitos de um país democraticamente racial”. Ela colocou que o racismo se estrutura em todas as esferas da sociedade, e sendo assim, não se resolve apenas na estrutura econômica. “É preciso ser interligado às outras esferas”, apontou. Questionou ainda “Pra quem a lei e a ordem servem?”, e responsabilizou ainda o Estado pela perda de vidas. “O genocídio ele mata aos poucos, desde o momento que deixa de dar assistência na saúde, na educação.
(…) O genocídio pressupõe a morte de um coletivo”.
A vereadora Sofia Cavedon lembrou a importância da educação na transformação deste quadro. “A escola necessita ser democrática, constituir sujeitos democráticos”.
Após a roda de conversa se apresentaram os artistas Negra Jaque, FQV MC’s e Meiaumtres, acompanhados do Leco DJ.