O absurdo da tributação do conhecimento
Precisamos ampliar o acesso da população aos livros e periódicos e isentá-los de impostos é um dos caminhos possíveis para isso.
A postura de mero despachante dos interesses da elite desempenhada por Jair Bolsonaro ficou mais uma vez evidente em sua proposta de Reforma Tributária enviada ao Congresso Nacional. Pelo texto, os dividendos gerados pelo mercado financeiro, os lucros das empresas e as grandes fortunas, seguirão sem nenhum tipo de tributação, numa inequívoca demonstração de que as graves distorções do sistema tributário brasileiro seguirão inalteradas.
O caráter anti-povo da proposta pode ser verificado em outros pontos, mas um em especial chama atenção: a tributação de livros, jornais e periódicos, impressos ou em formato digital, além do papel destinado à impressão deles. Não seria absurdo afirmar que Bolsonaro quer tributar a cultura e o saber, com vistas a cercear o pensamento crítico e o acesso ao conhecimento, em consonância com a ode à ignorância e ao atraso perseguida por seu governo.
A justificativa oficial apresentada pela equipe econômica é a de que livros são produtos consumidos pela elite e por isso devem ser tributados. Entretanto, tal tributação menospreza a função social do livro na sociedade, sua contribuição para a difusão e aquisição de conhecimento, sem falar no aspecto cultural e artístico dos livros. Não podemos esquecer, ainda, a documentação dos costumes e demais manifestações sociais de uma época.
O argumento também cai por terra quando lembramos que a proposta de Bolsonaro segue isentando de tributação as embarcações navais e aéreas destinadas ao lazer – lanchas, jet-skis e jatinhos – estes sim produtos consumidos pela elite.
Frente a tamanha irracionalidade, apresentamos uma Proposta de Emenda à Constituição para impedir que livros e periódicos sejam tributados. Atualmente, o mercado editorial brasileiro é isento de impostos pelo artigo 150 da Constituição Federal. A Lei 10865/2004 garante a isenção para as contribuições de Cofins e PIS/PASEP. Mas acreditamos que isso não basta.
A apresentação da PEC procura conferir segurança jurídica para o tema, afastando a possibilidade de incidência de tributos de qualquer natureza sobre livros e periódicos.
Em face de sua importância para o desenvolvimento civilizatório e social, vemos como fundamental constitucionalizar a ideia de zerar a carga tributária incidente sobre os livros. Precisamos ampliar o acesso da população aos livros e periódicos e isentá-los de impostos é um dos caminhos possíveis para isso. Não podemos permitir que o acesso ao saber, à cultura e ao conhecimento, já difíceis no Brasil, sejam ainda mais prejudicados com a Reforma Tributária.
A intenção do governo Bolsonaro pela tributação de livros e periódicos não é apenas uma aberração do ponto de vista da necessária atualização do nosso sistema tributário, mas revela-se perversa na medida em que procura limitar a produção, acesso e difusão do saber. Constitui-se, cumulativamente, em um ataque tangente à educação em uma país com sérios problemas para a criação, manutenção e estímulo ao uso de bibliotecas públicas.
Livros são responsáveis por assegurar a pluralidade de ideias com o registro das diferentes tendências de pensamento e liberdade de expressão, funcionando como uma espécie de argamassa dos pilares das sociedades democráticas e livres. Assegurar sua isenção tributária é resguardar a conexão direta entre livros e democracia, reconhecendo-os como repositórios de conhecimento e uma das fontes de debates da arena pública e social.