Reproduzido de Marie Claire

Leia a carta completa:

Marcelle, minha irmã era linda, cheia de vida, inteligentíssima, adorava moda, viagens, amava os cães, cuidar da beleza, correr, sair com os amigos, se divertir e amava trabalhar. Aliás, ela trabalhava muito! Recentemente, ela virou vegetariana em solidariedade aos bichos, que ela tanto amava. Ela era solteira e vivia para o seu trabalho.

A última vez que eu a vi foi em agosto de 2018, quando eu estive em Belo Horizonte de férias por um mês, onde minha irmã morava com a nossa família. Eu moro em Madison, Wisconsin, nos Estados Unidos, há quatro anos.

Ela nunca comentou sentir medo ou insegura por trabalhar na Vale, onde era médica do trabalho. Nossa família só temia que ela pegasse a estrada para ir até lá, pois eram 25 minutos de lá até Belo Horizonte, ela fazia esse trajeto todos os dias de carro.

Um dia antes do desastre, na última quinta-feira, dia 24, minha irmã completou 35 anos e comemorou, neste dia, com a família. Nessa sexta à noite ela iria comemorar com sua turma de amigos, já estava planejando isso. Mas, infelizmente, foi o dia do seu falecimento. O sepultamento será em Belo Horizonte, nossa cidade natal, e será restrito aos amigos mais próximos e a família. Provavelmente, eu irei depois, para ficar com a minha família, mas não tenho data ainda. Para o sepultamento eu não irei, estou sem condições e moro longe, em outro país. Aqui, estamos em pleno inverno e está vindo uma enorme tempestade de neve. Estou resolvendo isso ainda.

Estou péssima, arrasada, inconsolável! Acho que estou sofrendo mais ainda por estar longe. Me sentindo impotente. Mas, estou em paz, porque sei que o corpinho dela foi encontrado e rapidamente identificado. Isso já dá um conforto.

Provavelmente, na hora que tudo aconteceu, ela estava sentada na sua sala, em frente ao seu computador. Não sabemos, ao certo, se ela tentou sair ou teve tempo de sair do prédio da Vale, onde ela estava trabalhando. Ela atendia no ambulatório da empresa. Ela trabalhava lá há três anos como contratada, mas já fazia mais tempo que trabalhava lá antes prestando serviço por uma outra empresa.

Minha mãe e toda família estão desolados, sem chão. Ninguém esperava por isso. Temos mais uma irmã mais nova, de sete anos. A Marcelle era madrinha dela.

Eu soube da tragédia ontem, conversando com a minha família pelo Whats App. E antes, quando eu ouvi a notícia sobre a barragem, eu ainda não tinha associado ao nome da região da Vale, onde minha irmã trabalhava. Só depois falando com a minha família que eu liguei uma coisa à outra. Depois que eu li, me preocupei e logo perguntei a minha mãe se a Marcelle estava em segurança. Foi aí que eu tive a notícia de que não havia sinal de celular lá, mas, até então, nós estávamos ainda esperançosos, aguardando notícias. Passou um tempo e, ao ver as imagens pela internet, fui perdendo um pouco a esperança.

Logo, imaginei que, por ela ser médica, talvez pudesse estar socorrendo as vítimas no local, tendo um momento ‘Grey’s Anatomy’, uma série que ela amava, por sinal. Mas, infelizmente, ela não tinha resistido e foi a primeira a ser reconhecida pelo resgate através das suas digitais.

Ela amava viajar! Sempre tinha muitos planos de viagem. Queria conhecer o mundo! Ela pretendia vir prá cá me visitar, para a minha formatura do Mestrado, que será em abril. Mas, nada ainda estava confirmado. Ela sempre estava planejando um próximo destino. Sua última grande viagem foi para a África do Sul, em setembro do ano passado. Ela sempre estava muito animada, tinha um ótimo astral! Essas são as maiores lembranças que eu terei da minha irmã!