Um grupo de manifestantes realizou uma carreata pelas avenidas de Brasília para pedir um golpe militar, com o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Congresso Nacional. Os manifestantes se concentraram diante do edifício sede do Comando Militar do Planalto, onde foram recebidos pelo presidente da República, que endossou, aos gritos, as exigências totalitárias dos manifestantes, assumindo que se recusa a conversar com os demais poderes e que o que lhe interessa é a “ação em favor do Brasil”, o que não parece querer dizer “ação a favor da democracia”.

Os manifestantes cometeram um múltiplo crime: afrontaram a Constituição, constrangeram o Exército e aglomeraram-se, sem a devida proteção, em plena expansão de uma epidemia. Mas a atitude do presidente foi pior. Conspirou contra a democracia, os demais poderes e a saúde pública. Cambaleante, inchado e tossindo, Bolsonaro ultrapassou todos os limites e instigou uma crise institucional, em situação de emergência sanitária e social.

A afronta presidencial foi contestada por várias pessoas e instituições, pois se sabe que quem se omite na defesa da democracia em momentos decisivos, acaba sendo a próxima vítima da violência. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) divulgou uma nota indignada, 20 governadores, de diversos partidos, manifestaram-se juntos pela democracia, o presidente da Câmara e alguns ministros do STF também o fizeram. Mas até 24 horas após a ocorrência, o presidente da corte, Dias Tóffoli, permanecia em silêncio.

Não se espera, nem de longe, que o presidente da mais alta corte de justiça se preste ao ativismo político e fique dando declarações desnecessárias, mas cabe a ele, em primeira instância, a defesa do poder que preside quando é atacado. Pessoas pediam e o presidente apoiava, explicitamente, o fechamento do STF. Nada trivial, foi um ataque excepcional! Tóffoli reagiu tarde, sem mencionar Bolsonaro, com uma defesa genérica da democracia, no mesmo tom do ministério da Defesa.

Já tinha sido estranha a atitude de Tóffoli, após a manifestação de 15/3, também contrária à democracia e que também teve apoio do presidente, ao atender a convite dele para uma coletiva de imprensa montada para aparentar unidade institucional. Na ocasião, os presidentes do Legislativo preferiram ausentar-se. Agora, a afronta de Bolsonaro ao STF e ao Congresso foi ainda mais agressiva, mas Tóffoli se limitou à declaração tardia.

Mais estranha ainda tinha sido decisão anterior sua para paralisar as investigações sobre o desvio de dinheiro pelo então deputado estadual e agora senador Flávio Bolsonaro. O dano causado pela decisão foi mais abrangente, paralisando várias outras investigações. Porque haveria o presidente do STF de se colocar em posição tão leniente e subalterna?

O ministro Tóffoli é jurista bem formado em ótima escola, foi advogado do PT e Advogado-Geral da União durante o governo Lula, antes de ser indicado ao STF. Sua trajetória não justificaria, por si, atitude agressiva em relação ao presidente, mas, muito menos, de temor ou subordinação.

O centro da questão não está na biografia, mas na responsabilidade de presidir um dos pilares da democracia sob ataque. A questão é: o que o Tóffoli deve fazer pela democracia? Dela, inevitavelmente, vai derivar a sua biografia.