BH precisa se preparar para efeitos da crise climática
O fato é: caminhos para lidar com os efeitos da crise climática existem, mas é preciso coragem e vontade política para colocar em prática.
O Brasil e o mundo vivem os efeitos da crise climática, com chuvas intensas na região Sul, calor sufocante em diversas regiões e seca histórica no Amazonas. Nesse contexto, é urgente que medidas sejam adotadas para preparar as cidades para lidar com eventos climáticos extremos e planejar a preservação de recursos naturais evitando o agravamento da situação no futuro próximo.
Em Belo Horizonte, registramos recorde histórico de temperatura em setembro, batendo os 38,6 °C , e em novembro vivemos uma onda de calor extremo prolongado. As chuvas fortes também são uma preocupação para a capital e região metropolitana que, em janeiro de 2022, teve o maior volume de chuvas registrado nos últimos 30 anos.
Diante desse cenário, a cidade teve a oportunidade de ter uma lei propondo a política municipal de mudanças climáticas e a melhoria da qualidade do ar. No entanto, as brigas entre a Câmara Municipal e a Prefeitura mais uma vez prejudicaram a população. Os vereadores rejeitaram o projeto de Lei, de autoria do prefeito, alegando falta de diálogo. Recentemente, também perdemos recursos para obras para conter enchentes na Vilarinho quando um Projeto de Lei da prefeitura não foi votado a tempo pela Câmara. Não é possível que a briga entre poderes, visando às eleições do próximo ano, impeçam projetos tão importantes para BH. A nossa cidade precisa avançar e isso só será possível se a prioridade for o cuidado com as pessoas e a harmonia.
Além da elaboração de políticas municipais específicas para o assunto, o poder público deve atuar em diferentes frentes que garantam uma cidade preparada para encarar eventos climáticos extremos que, infelizmente, devem se tornar cada vez mais comuns.
Uma ação importante é pensar soluções que considerem a segurança hídrica, já que diversos bairros, especialmente nas periferias, sofreram com a falta de água nos dias de intenso calor, ficando até 15 dias sem água. Nesta semana, fui pela Comissão de Direitos Humanos à Copasa em uma visita tensionada, na qual até tentaram impedir nossa entrada. Por fim, conseguimos fazer a reunião com representantes da Copasa e lideranças de comunidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte e constatamos que há um plano de contingenciamento hídrico para casos de aumento de demanda por água, mas esse plano foi negligenciado. A situação é grave, porque a Copasa sabia que faltaria água, mas não fez nada para impedir a situação. Mais grave ainda é que, enquanto a população fazia vaquinha para ter água, eram divididos lucros de R$ 372 milhões entre os acionistas.
Se hoje já enfrentamos essas situações, a privatização da Copasa, como deseja o governador Zema, apenas aumentaria as violações do direito humano básico de acesso à água.
A garantia e ampliação do fornecimento de água para as periferias e o combate à privatização da Copasa se tornam essenciais. Zema tenta precarizar o serviço público mineiro e vender estatais a preço de banana. A Copasa distribui e trata água de 75% dos municípios mineiros, percentual que também pode reduzir drasticamente caso seja privatizada e atue apenas em locais lucrativos.
Outra realidade que se impõe é a mineração predatória que deixa BH e centenas de municípios na iminência da falta de água. A mineração na região do Quadrilátero Ferrífero-Aquífero precisa de limites e de acompanhamento sério do poder público. Há pelo menos 63 barragens à montante da captação de água de Bela Fama que fornece 70% da água consumida por Belo Horizonte. Em relação à Serra do Curral, vários pesquisadores e ambientalistas apontam que nascentes e cursos de água que abastecem o Rio das Velhas, responsável por abastecer BH, podem secar com o rebaixamento do aquífero causado pela atividade minerária, portanto, a mineração nessa região precisa ser completamente proibida.
Enquanto vereadora, participei da CPI das Águas e Barragens na qual conquistamos a obrigação da Vale construir uma nova captação de água no rio Paraopeba como uma das compensações pelo crime do rompimento da barragem em Brumadinho. No entanto, as obras até hoje não foram entregues por vários problemas operacionais graves. É urgente que o poder público pressione para que a mineradora cumpra sua obrigação e faça a nova captação funcionar efetivamente.
O Plano Diretor também precisa ser revisto. O prefeito o alterou beneficiando o capital imobiliário em detrimento do meio ambiente. O que a cidade precisa é de um plano que contemple a proteção de áreas verdes, garanta a ampliação da arborização e a recuperação das áreas degradadas e nascentes. O Plano deve impedir a verticalização dos corredores de ventilação e a ampliação da impermeabilização do solo, o que acarreta consequências seríssimas especialmente no período chuvoso.
Uma cidade que olha para o futuro, precisa discutir os sistemas de transporte. As ruas não comportam mais carros e motos, mas sabemos que todo trabalhador que consegue juntar um dinheirinho tenta escapar do ônibus. Isso porque os ônibus são de péssima qualidade, a passagem custa caro e a lotação fica insustentável, especialmente nos horários de pico, com a sensação térmica no ônibus chegando a 50º C, como mediu um passageiro da linha na RMBH. Para enfrentar esse problema grave que impacta diretamente no meio ambiente, é preciso rever e revogar os contratos com as empresas e reformular estruturalmente o transporte em BH e na região metropolitana, garantindo a Tarifa Zero, ônibus de qualidade, controle de horários, integração modal e tarifária.
Em tempos de eventos climáticos extremos, como ondas de calor e chuvas intensas, a população mais vulnerável é a mais afetada, em especial as pessoas em situação de rua e as periferias. Protocolamos um Projeto de Lei na Assembleia Legislativa para garantir água nas periferias e para a população em situação de rua, mas o poder municipal tem o dever de garantir o acesso à água e banheiros públicos para essas pessoas. É necessário também viabilizar o acesso à moradia e às demais políticas públicas que, a médio prazo, possam reduzir o número de pessoas nessa condição.
Essas são algumas propostas que defendo, mas há diversas outras que podem e devem ser debatidas de forma ampla e coletiva com a sociedade. Devemos adotar medidas urgentes para uma cidade antirracista, porque o que vemos nesses casos citados é de racismo ambiental, já que enquanto ricos brancos nadam em suas piscinas, as populações negras das periferias ficam sem água. O fato é: caminhos para lidar com os efeitos da crise climática existem, mas é preciso coragem e vontade política para colocar em prática.