Ao especular, em vida, sobre possíveis reações à sua morte, Rita Lee disse, entre outras coisas, que, eventualmente, poderiam dar o seu nome a uma rua sem saída. Eu entrei nessa rua, no tempo dos Mutantes, e nunca mais saí.

Rita Lee, em 2010 | Alexandre Cardoso

Em 1968, eu fiz 13 anos e ela era uns oito anos mais velha. Uma diferença significativa para aquela idade. Eram tempos de erupção ideológica, de amor livre e de novas linguagens musicais, no Brasil e no mundo. O movimento estudantil tomava as ruas, anunciando revoluções. Os Beatles sacudiam plateias planetárias e o rock and roll produzia diversos sincretismos pelo mundo afora.

O golpe militar de 1964 atropelou o direito à liberdade da minha geração, espalhando tortura, miséria, ignorância e censura por onde deveria haver aprendizagem e civilização. Apesar disso, o movimento “Tropicália” embalava corações e mentes. “Panis et Circenses” era o nosso grito de guerra, a metáfora contraposta ao regime de opressão.

Capa do disco ‘Tropicália’, de 1968. Em pé (E-D): Arnaldo Batista, Caetano Veloso, Rita Lee, Sérgio Dias e Tom Zé. Sentados (E-D): Rogério Duprat, Gal Costa e Torquato Neto. Sentado em primeiro plano: Gilberto Gil. Na foto superior, segurada por Caetano Veloso: Nara Leão. Na foto inferior, segurada por Gilberto Gil: Capinam.

Porém, 1968 terminou com a edição do Ato Institucional (AI)-5, fechamento do Congresso, violência contra a população. A ditadura censurou e perseguiu a Rita e os artistas nacionais. Mas a MPB de então era o nosso veículo de formação e informação. Paulista como eu, Rita foi, então, a mais exuberante tradução metropolitana da diversidade cultural brasileira.

Há muitíssimo o que escrever e dizer sobre a sua passagem pelas nossas vidas. Mas, agora, não vale a pena diluir o sentimento essencial. Ela cunhou, para si mesma, o seguinte epitáfio: “NUNCA FOI UM BOM EXEMPLO, MAS ERA GENTE FINA”. Com todo respeito, ela foi, para mim, um maravilhoso exemplo. Gente finíssima! Imensa gratidão!!!