Retomar as experiências anticoloniais africanas: pan-africanismo, socialismo e a construção do futuro
Dia 25 de maio comemora-se mundialmente o dia da África, data para celebrarmos a cultura e herança africana e afro-brasileira.
Por Renata Souza e Derê Gomes*
Dia 25 de maio comemora-se mundialmente o dia da África, ou do continente africano. No Rio de Janeiro, a data está no calendário oficial do estado por força de Lei apresentada e aprovada pela Mandata Renata Souza na Assembleia Legislativa.
Essa data, no Brasil, é uma data para celebrarmos a cultura e herança africana e afro-brasileira e também de rememorar um passado de luto e de luta pelos nossos ancestrais que vieram em diáspora forçada a partir do brutal processo colonial e de escravização.
Na Pequena África, região central do Rio de Janeiro, desembarcaram cerca de 2 milhões de africanos escravizados para serem explorados nas fazendas da região. Foram séculos de exploração e violência que ainda hoje reverberam na vida dos afrodescendentes brasileiros e nos imigrantes africanos que escolhem o Brasil para viver. A Lei 8.615, que institui o Dia da África, também vem para contribuir com a Lei 10.639/03 que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana em todas as escolas. Ainda assim, a luta por um processo pedagógico antirracista é fundamental e urgente para superarmos o histórico racismo que ainda hoje mata o nosso povo negro. Parafraseando o camaronês Achille Mbembe, quando conceitua a necropolítica, que se o Estado não mata negros na ponta do fuzil com seu braço armado, deixa morrer sem saneamento básico e/ou enterra em vida nas masmorras das prisões.
Neste ano gostaríamos de aproveitar essa data emblemática para retomar um exemplo que por muitas vezes fica esquecido pela história oficial: as lutas anticoloniais e de libertação no continente africano. O século XX foi marcado pela luta dos povos africanos por libertação e pela expulsão dos colonizadores e muitas revoluções surgiram na esteira desse processo histórico e do pensamento pan-africano e socialista.
Thomas Sankara e sua luta por reforma agrária, justiça climática e igualdade de gênero em Burkina Fasso que se conecta com a nossa luta atual pela preservação do clima e do Planeta frente as tragédias ambientais que nos assolam e ao patriarcado, Agostinho Neto e sua luta por uma educação pública universal e emancipadora em Angola que nos ensina como enfrentar projetos despolitizantes como o “escola sem partido” e o “novo ensino médio”, Samora Machel e Patrice Lumumba e a luta por unidade nacional em Moçambique, e com o Movimento Nacional Congolês, respectivamente, que trazem a experiência de se construir uma política de massas para as maiorias sociais e enfrentar a fragmentação da sociedade, no Brasil estimulada pela ascensão da extrema-direita.
Com os estadistas pós-coloniais como Kwane Nkrumah e Julius Nyerere aprendemos a reivindicar uma alteração na política econômica mundial e a redistribuição de poder, em favor do sul global.
Em 2024 celebramos também 30 anos que Nelson Mandela chega a presidência da África do Sul. Uma das maiores referências políticas da história da humanidade, Mandela deixou um legado de luta anticolonial contra o apartheid sul-africano, brutal regime de segregação racial imposto pelo colonialismo inglês. Este exemplo nos ensina a enfrentar um dos maiores desafios dos povos racializados da atualidade que é se engajar no enfrentamento, denúncia e luta pelo fim do apartheid contemporâneo imposto ao povo palestino pelo regime político sionista de Israel. Aliás, os equipamentos de guerra, os métodos atrozes e outras características marcantes do exército de Israel são utilizados no Rio de Janeiro para massacrar as nossas favelas. Os caveirões que aterrorizam nossas crianças vem de Israel e massacram crianças palestinas em Gaza.
Na quadra atual da História, com os desafios estabelecidos pela crise climática, o aumento da fome e a desigualdade social e a ascensão da extrema-direita, o socialismo pan-africano é um farol para superação dos principais desafios da humanidade e da construção de um futuro justo e igualitário, especialmente para os povos da periferia do capitalismo. São essas referências que precisamos mobilizar para construção do futuro não só do Brasil, mas da humanidade.
—
*Derê Gomes é cria do Complexo da Penha, historiador pela UERJ, com mestrado em Planejamento Urbano e Regional pela UFRJ; Também é fundador da Ação Negra – Articulação Nacional do Movimento Negro Brasileiro e compõe a direção da Federação de Favelas do Estado do Rio de Janeiro, a FAFERJ.