“Posto Ipiranga” da Esplanada deve falir
O “Posto Ipiranga” do Bolsonaro anda com estoque baixo de conveniências e muita dificuldade de combustão. Seus sonhos e planos fracassaram, multiplicam-se as derrotas e os ataques especulativos sobre o seu ministério. O horizonte que lhe sobrou é a gestão tumultuosa da crise que se aprofunda, até o dia do (seu) juízo final.
Marcelo Araújo preside a Ipiranga e informa: “temos 7.200 postos em todos os Estados e 2.300 lojas de conveniência. Pegamos os principais compromissos que eles tinham conosco, como financiamento, locação e royalties, e parcelamos isso para depois de junho e julho. Essa foi uma primeira ajuda para dar fôlego a eles. E vamos ajudar na coordenação para que eles possam mais rapidamente usufruir das medidas que o governo anunciou, acessando o crédito financeiro”. Com isso, ele espera segurar a onda da sua rede durante a crise: “na semana passada, as vendas de gasolina e álcool caíram 63% em relação à venda média esperada. O diesel caiu menos, cerca de 33%”.
Mas a unidade da rede que não pode se segurar só com isso é o ministro da Economia, Paulo Guedes, o “Posto Ipiranga” do Bolsonaro, que anda com estoque baixo de conveniências e muita dificuldade de combustão. Seus sonhos e planos fracassaram, multiplicam-se as derrotas e os ataques especulativos sobre o seu ministério. O horizonte que lhe sobrou é a gestão tumultuosa da crise que se aprofunda, até o dia do (seu) juízo final.
Guedes vive de crises diárias. Falou demais, prometeu mundos e fundos e, 16 meses depois, não apenas não entregou, como sabemos todos, inclusive ele e o Bolsonaro, que nem haverá como entregar. É outro, agora, o mundo, é outra a realidade, são outras as prioridades e os princípios de seu programa de governo, que eram um mantra mercadológico, entraram em parafuso no mundo inteiro diante da emergência sanitária e do seu impacto sobre todos os povos.
Guedes assumiu como superministro, pilotando um megaministério e ungido à condição de “Posto Ipiranga” por um presidente assumidamente ignaro. O poder subiu à cabeça e povoou a alma, inspirando discursos vazios e redundantes, mas eloquentes, e chegando a picos fascistóides, ao aventar a edição de um “novo AI-5”, um velho instrumento ditatorial que cassou mandatos, impôs censura e matou pessoas. Cara de pau!
Agora, mais parece um espectro do que já foi. Suas previsões milagrosas não se sustentam nem por 24 horas, comprometendo a credibilidade sua e do governo. Balança para todo lado em mar revolto: há poucos dias, posava de anjo nas coletivas de imprensa do ex-ministro Mandetta, mas ontem já estava todo afoito com lobistas e Bolsonaro, pressionando o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, para atropelar o isolamento social, indispensável para reduzir o número de vítimas da epidemia.
Fragilizado, Guedes odeia o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e tenta driblá-lo, armando no paralelo com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, mas sofre derrotas quase diárias no Congresso. Na última delas, foi ferrado pelo próprio presidente, que mandou seu líder aprovar uma emenda rechaçada por Guedes. O ministro da Economia fez o maior bico, deve ter dito que vai embora e Bolsonaro, desgastado com sucessivas trocas desatinadas de ministros, preferiu recuar e se comprometeu a vetar a alteração aprovada para permitir reajustes salariais de funcionários dos Estados beneficiários de ajuda emergencial federal. Bolsonaro dança e balança Guedes, que virou seu cúmplice e refém.
Digamos que os empresários que ainda apoiam Bolsonaro não se importam muito com as inclinações políticas fascistóides mais íntimas do Paulo Guedes. Nem acham que a falta de convicção dele em relação ao isolamento social e a necessidade de priorizar a proteção da vida fará muita diferença para os seus negócios. Deveriam preocupar-se, pelo menos, com a cacofonia economicista com que Guedes comprova que o Brasil está sem rumo.
Em 5/4, quando a cotação do dólar rompia a barreira dos R$ 4, Guedes dizia que “se fizer muita besteira, o dólar pode chegar a R$ 5”, até o final do ano. Um mês depois, o dólar arranha os R$ 6.
Em 20/4, Guedes declarou que a recuperação econômica, após a crise do novo coronavírus, será em “V”, com retomada tão rápida quanto foi a queda.: “Vamos surpreender o mundo”. Quinze dias depois, Guedes nos informa que, embora o governo tenha lançado programas de crédito, talvez não seja possível preservar os sinais vitais da economia. “A economia pode se desintegrar.”
O Titanic Brasil balança forte nas ondas revoltas da pandemia, das mortes em massa e da depressão econômica. Guedes escorrega de um lado para outro do convés e se agarra a Bolsonaro, num magistral abraço de náufragos. Salve-se quem puder.
Já está na hora de Paulo Guedes voltar aos estudos. Sugiro-lhe, como tema para um pós-doutorado: “Economia para as pessoas: lições de humanidade em um país destruído pela miséria, agravada por uma pandemia”.