Por que janeiro vermelho? Reação indígena aos primeiros atos de Bolsonaro
Em resposta a mais um retrocesso nos direitos indígenas, que o atual governo demonstra que só vão aumentar, APIB emcampa campanha contra mais derrubada de sangue indígena – Janeiro Vermelho
Desde o início da colonização, os povos indígenas têm sido vítimas do genocídio levado a cabo no território brasileiro. São 519 anos de resistência para manter viva a riqueza que se traduz atualmente em mais de 300 povos com mais de 270 línguas diferentes. Povos que, com seu modo de vida, protegem os territórios tradicionais onde vivem, garantindo, assim, o seu bem-viver e o bem-estar de toda a humanidade.
Desde a campanha eleitoral, observamos com preocupação as promessas ventiladas pelo presidente Jair Bolsonaro, que à época já declarava abertamente ser contrário aos direitos dos povos indígenas e demais povos tradicionais. Já no primeiro dia de governo, ele assinou a Medida Provisória (MP) nº 870, que fere de morte os direitos dos povos indígenas.
Esta nefasta MP transferiu para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) a atribuição de identificar, demarcar e registrar as terras indígenas (TIs), promovendo o esvaziamento da Fundação Nacional do Índio (Funai), o órgão indigenista oficial do Estado brasileiro. Além de retirar da Funai sua principal função, colocou sob as asas do agronegócio o poder de decidir sobre a demarcação dos territórios tradicionalmente ocupados pelos povos indígenas. O governo, portanto, deu carta branca aos ruralistas para ditar as regras sobre demarcação das TIs. Como se não bastasse, a titular da pasta de Agricultura, Tereza Cristina, representa os interesses do agronegócio no país. A ministra, que deveria dar bons exemplos, tem um histórico de envolvimentos em conflitos em territórios indígenas. Sua família possui propriedades rurais em TIs, no Mato Grosso do Sul, onde é fato público e notório seus confrontos com os Terena da TI Taunay-Ipegue.
A MP 870 retirou também a Funai do Ministério da Justiça e realocou-a no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, pasta comandada por Damares Alves, uma pastora de linha conservadora. Não é a primeira vez que a agência indigenista estatal fica subordinada a interesses escusos. Em 1910, quando foi criado o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), o órgão indigenista ficou vinculado ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio (MAIC), e ao longo dos anos passou pelos ministérios da Guerra, do Interior, retornando à pasta da Agricultura. Foi somente na década de 1960, após a apuração de inúmeras violações perpetradas contra os povos indígenas, com a conivência do Estado brasileiro, que o órgão indigenista passou a ser associado ao Ministério da Justiça.
As denúncias de violações cometidas contra povos indígenas e de corrupção no órgão indigenista provocaram quatro Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) – no Senado, a CPI de 1955; e, na Câmara, as de 1963, 1968 e 1977. Em 1967, houve uma CPI na Assembleia Legislativa do estado do Rio Grande do Sul e, no mesmo ano, uma comissão de investigação do Ministério do Interior produziu o Relatório Figueiredo, motivo da extinção do SPI e criação da Funai. Só então a demarcação das TIs passou a ser aprovada pelo Ministério da Justiça.
A demarcação de Terras Indígenas representa uma garantia de proteção à floresta e aos povos que dela dependem para viver. A terra é a base do habitat de um povo e da sustentabilidade das riquezas naturais ali presentes. Ela dá suporte à reprodução física e cultural das populações indígenas.
A fragilização dessa base já tem consequências extremamente graves, na medida em que os órgãos responsáveis pela execução da política indigenista foram ainda mais sucateados. A irresponsabilidade do poder público com a questão indígena já está sendo sentida nos territórios: várias comunidades estão sofrendo com invasões e ataques concretos perpetrados por agentes ligados aos interesses dos ruralistas, garimpeiros e madeireiros.
Diante da crescente ameaça e dos retrocessos impostos pelo Estado aos povos originários do país, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) lançou a campanha “Sangue Indígena: nenhuma gota a mais”, com o objetivo de mobilizar a sociedade pelos direitos indígenas.
Junte-se a nós parentes, aliados e aliadas!
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