O que esperar de um próximo mandato presidencial
As eleições municipais de novembro indicaram mudanças nas correlações de forças políticas rumo às eleições presidenciais de 2022.
As eleições municipais de novembro indicaram mudanças nas correlações de forças políticas rumo às eleições presidenciais de 2022. Os resultados fortaleceram partidos ditos do “Centrão”, na verdade um “Direitão”, como PSD e PP, teoricamente da base parlamentar do governo, além de DEM, PSDB e MDB, supostamente fora dessa mesma base. Porém, candidatos apoiados por Bolsonaro foram derrotados e a rejeição ao presidente atingiu recordes, sobretudo nas grandes cidades.
À esquerda, a aliança entre o PDT e o PSB venceu em cinco capitais, com força renovada em especial no Nordeste. O PSOL foi, pela primeira vez, ao segundo turno em São Paulo, com 2,2 milhões de votos para Guilherme Boulos, o triplo da votação que ele teve para presidente, em 2018, no país todo. O PSOL venceu em Belém, com Edmilson Rodrigues, que já foi prefeito por dois mandatos quando era do PT, mas, para o PSOL, será a primeira experiência de governar uma capital. O PT não elegeu prefeitos de capitais e foi quebrada a sua hegemonia na esquerda.
Bolsonaro precisa de algum partido para ser candidato à reeleição. O PSL já era e não venceu em nenhuma cidade com mais de 200 mil eleitores. A Aliança pelo Brasil nunca foi e, com a popularidade presidencial em queda, não será. A melhor oferta é a do PP, a que Bolsonaro já pertenceu e que saiu fortalecido das urnas. Se perder mais tempo no limbo partidário, Bolsonaro se arrisca ao improviso, que se provou desastroso nas eleições municipais. Com um partido estruturado e o governo na mão, é de se supor que Bolsonaro (ou Mourão) chegue aos 20% dos votos e dispute uma das vagas para o segundo turno em 2022.
Os partidos de direita não bolsonarianos, bem sucedidos nas eleições municipais, terão de ver, agora, se conseguem se unir numa chapa presidencial. O DEM se inclina pela candidatura de Luciano Huck, o PSDB tem João Dória e o MDB, que venceu em cinco capitais, não tem um nome próprio, mas tem vocação para ocupar a vice. Se esse trio se unir, atrairá outros partidos e seu candidato terá palanques fortes em todos os estados. Se não se unir, corre o risco de repetir 2018 e ficar de fora da suposta disputa final.
A receita é a mesma para a esquerda. Se Bolsonaro se segurar e o bloco de centro e direita se unir numa chapa, a esquerda estará diante da ameaça de, pela primeira vez desde 1989, ficar fora do segundo turno, ou do segundo lugar. Não será fácil juntar os cacos do PT e, ainda, o PDT com o PSOL, mas será muito mais difícil recuperar-se, depois, de uma eventual derrota histórica nas eleições presidenciais, com impacto sobre as bancadas progressistas no Congresso Nacional e as eleições nos estados. Unida, a esquerda terá mais chance de chegar ao segundo turno e à vitória em 2022.
País em frangalhos
Com dois anos de Bolsonaro, o país está em frangalhos, dezenas de milhões de miseráveis e de desempregados, crise econômica e fiscal, desestruturação administrativa, devastação ambiental e isolamento internacional. Se é crível que, mesmo assim, Bolsonaro dispute a reeleição podendo chegar ao segundo turno, é quase incrível que ele possa vencer com os níveis de rejeição que acumula. Se vencesse, o desastre se multiplicaria.
Qualquer outro presidente que substitua Bolsonaro a partir de 2023 terá que dedicar o mandato à recuperação do país. Apesar da inclinação mais liberal ou progressista do seu sucessor, ele terá de buscar apoio na sociedade, nos estados, no Congresso e em outras forças políticas para poder tirar o Brasil do buraco. Se, por um lado, sectarismo, personalismo, hegemonismo e corporativismo partidário dificultam as alianças, por outro, a discussão programática objetiva, diante da situação crítica do país, pode facilitá-las. Um bom caminho pode começar com:
(1) Dar um fim ao instituto da reeleição para cargos executivos ajudaria muito a unir partidos e pretendentes, além de dinamizar o processo político. Enquanto ainda houver reeleição, os candidatos a presidente que abrirem mão dela, terão mais espaço para coalisão.
(2) Restabelecer a normalidade democrática, o respeito à Constituição, às competências dos demais poderes e dos estados e municípios, aos direitos da sociedade civil.
(3) Recuperar instituições do Estado e políticas públicas subvertidas pelo atual governo e profissionalizar as funções públicas civis que foram militarizadas.
(4) Respeitar e promover a diversidade cultural, étnica, regional, biológica, de gênero e de orientação sexual.
(5) Promover os direitos humanos, o desarmamento e a redução da violência criminal, policial e no trânsito.
(6) Conter a criminalidade ambiental e promover saídas sustentáveis para a crise.
(7) Executar programa emergencial de obras públicas em saneamento básico, habitação popular e reforma de escolas e unidades de saúde.
(8) Retomar objetivos e metas do Acordo de Paris e promover reunião das partes no Brasil.
(9) Retomar as negociações para o acordo comercial entre a União Européia e o Mercosul.
(10) Superar o isolamento político internacional do país e restabelecer relações respeitosas e desprovidas de criminalização ideológica com os demais países e organismos multilaterais.
Uma lista de providências desse tipo poderia dar substância a conversas sobre alianças e a um mandato presidencial de quatro anos, para resgatar o Brasil da sangria bolsonarista. Se for o caso, faça a sua própria lista!