O que a Globo não falou do Panamá Papers
Escândalo seria uma oportunidade única para que o grande público tomasse conhecimento daquilo que a Operação Zelotes ocultou: o suposto envolvimento da Globo com a corrupção.
A matéria da TV Record, veiculada no programa “Domingo Espetacular”, de 16 de julho de 2017, trouxe nova luz a fatos gravíssimos, de há muito conhecidos, denunciados pelo escândalo denominado “Panamá Papers”. Pouco explorados, à época, pelos veículos de mass media, tais fatos denunciam as supostas manobras realizadas pelas Organizações Globo, sua principal concorrente, para driblar o fisco nacional.
Quando vieram à tona os Panamá Papers, aquilo que se divulgou, no caso do Brasil, era matéria requentada. Informações sobre as contas no exterior de Eduardo Cunha, fatos que já haviam sido levados ao conhecimento público pela Operação Lava-jato; e sobre a compra de um apartamento em Miami por Joaquim Barbosa, ex-Ministro do STF, de quem as explicações, ao menos ao meu ver, são até bastante convincentes.
Contudo, passado mais de um ano do início da divulgação dos documentos, diversos fatos permanecem ocultos ou desconhecidos do grande público, dentre eles algumas curiosidades: durante todo o dia de domingo, 3 de abril de 2016, dia de início da divulgação dos documentos, a Rede Globo não deu nenhuma linha sequer em nenhum de seus telejornais ou veículos de suas subsidiárias. No mínimo estranho, em se tratando do maior escândalo do gênero de que se tem notícia em toda a história. Sigamos o raciocínio, para compreendermos os prováveis motivos desse silêncio:
O Panamá Papers seria uma oportunidade única para que o grande público tomasse conhecimento daquilo que a Operação Zelotes ocultou (ou, propositalmente “não vazou”): o suposto envolvimento de empresas da grande imprensa (de propriedade dos tais barões da mídia familiar, tradicional, conservadora e sonegadora de impostos do país) com empresas offshores.
Seria uma oportunidade única, por exemplo para que as Organizações Globo e a Família Marinho esclarecessem, de uma vez por todas, se são ou não os verdadeiros donos da Paraty House, a famosa Mansão ou Triplex de Paraty.
O imóvel multimilionário foi construído, irregularmente, em uma unidade de conservação, na praia pública de Santa Rita-RJ. Segundo o site Viomundo, o ex-genro de João Roberto Marinho, Alexandre Chiappetta de Azevedo, casado, a época, com Paula Marinho de Azevedo, foi testemunha na formação de um consórcio de outras empresas brasileiras, composto pela Agropecuária Veine Patrimonial (que é a “dona oficial” da Paraty House) e por Santa Amália Administração e Participações Ltda.
Segundo o jornalista Luiz Carlos Azenha, o endereço de entrega da correspondência (Avenida Borges de Medeiros, 1424, na Lagoa Rodrigo de Freitas) e que aparece na formação do consórcio da Agropecuária Veine Patrimonial, a dona da mansão de Paraty, com Santa Amália Administração e Participações Ltda é onde funciona a empresa do ex-genro de João Roberto Marinho, que os cariocas conhecem como Lagoon.
A empresa Santa Amália, por sua vez, tem como endereço a rua Margarida Assis Fonseca, 171, na capital mineira. É a mesma sede da Brasif (sim, aquela mesma do escândalo da ex-amante do ex-Presidente FHC, Mirian Dutra).
Segundo o site do Sindicato dos Advogados de São Paulo, Agropecuária Veine Patrimonial tem como endereço um apartamento residencial no Rio de Janeiro, em Copacabana, e tem no quadro de sócios outra empresa: a Vaincre LLC, domiciliada no exterior, cujo representante legal por procuração é Lucia Cortes Rosemburge – ou Lúcia Cortes Pinto (ex-funcionária do INSS, aposentada em 2008, salvo homônimo, uma simples moradora do bairro do Grajaú).
Vaincre LLC é uma offshore aberta pelo escritório panamenho Mossak Fonseca, de onde teriam vazado os documentos do Panamá Papers… Entenderam?
As offshores existem, dentre outras finalidades legais, para esse tipo de motivo nada nobre: para ocultar a verdadeira propriedade ou a cadeia dominial de um determinado bem (imóveis, contas bancárias etc), levando ao cometimento de sonegação de tributos, elisão fiscal, evasão de divisas e ocultação de patrimônio.
Exatamente aquilo que a citada matéria da TV Record divulgou em se tratando da negociação envolvendo a FIFA e as Organizações Globo sobre compra e venda de direito de transmissão de jogos da Copa do Mundo.
Os participantes brasileiros do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês), que analisou os mais de 11 milhões de documentos vazados do escritório panamenho Mossak Fonseca para o jornal alemão Süddeutsche Zeitung, são os jornalistas Fernando Rodrigues, André Shalders, Mateus Netzel e Douglas Pereira (do UOL), Diego Vega e Mauro Tagliaferri (da RedeTV!) e José Roberto de Toledo, Daniel Bramatti, Rodrigo Burgarelli, Guilherme Jardim Duarte e Isabela Bonfim (de O Estado de S. Paulo). Não questiono a idoneidade destes profissionais, mas sim dos veículos para os quais trabalham. Ninguém de nenhum veículo de esquerda ou do movimento de mídia livre participa…
Sendo assim, no melhor estilo cara de jacarandá lubrificada com óleo de peroba, tais empresas de mass media, simplesmente ignoraram os fatos mais relevantes e mais “cabeludos”, por assim dizer. Devassaram questões envolvendo políticos, empreiteiras, mas não chegaram naqueles que estão do outro lado da trincheira, que trabalham com a manipulação da informação, que permitem o pré-julgamento, a execração pública e o linchamento moral de quem bem eles entendem, bem ao modo “além do cidadão Kane”.