O carnaval chegou: vamos falar sobre drogas?
As pessoas estão consumindo drogas. Muitas drogas. Como vamos narrar essa história, falando de purpurina, samba, bloco, escola de samba e… drogas? Essa é a grande questão.
E mais: como vamos falar sobre drogas?
Nas faculdades de jornalismo, aprendemos logo o que é uma barriga, aquela matéria com informações erradas. A partir de então, fugir dela é um objetivo. Apuração é a chave. Um erro pode dar muita dor de cabeça no futuro. Mas, aparentemente, há um tema em que se atentar aos fatos não é regra. Aliás, nesse tema, barriga é regra.
E este tema são as drogas.
Vamos falar sobre drogas na TV? Chamem um sargento da Polícia Militar, um especialista em segurança pública, um caso de dependência química e uma mãe arrasada com a situação do seu filho.
Do pior para o horrível, a situação torna-se uma grande repetição de como as drogas destroem a vida das pessoas, fazendo-as deixar seus lares, trabalhos e amigos, e você estará na mira da lei se infringir essas regras. Esse discurso, prático e recorrente na grande mídia, forma a opinião da maior parte da população.
Apesar disso, o debate consciente sobre o tema, pautado em políticas e práticas de redução de danos, ancorada na literatura científica e, principalmente, na experiência e luta de diversos coletivos, movimentos sociais e entidades, está ganhando espaço, e precisa impactar o discurso jornalístico sobre drogas.
Um grande aliado nessa missão é o recém lançado Guia Sobre Drogas para Jornalistas, material que reúne um vasto conhecimento sobre diversos tipos de drogas, além de um glossário de termos sobre o tema.
Criado pela Plataforma Brasileira de Política de Drogas (PBPD) em parceria com o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), o material tem texto e edição de Tarso Araujo.
Já na introdução do documento, chama-se atenção para o caso da droga óxi, que no ano de 2011 protagonizou uma chamada de primeira página como “Uma ameaça devastadora que se espalha pelo país”. Tida como mais viciante que o crack, em questão de semanas tornou-se um caso de saúde pública com destaque nacional.
Em pouco tempo, no entanto, pesquisas indicaram que não tratava-se de uma droga nova, e que a maior parte das amostras eram constituídas de crack. A “grande ameaça” nunca existiu.
“A história do óxi é um bom exemplo de como a imprensa influencia de forma decisiva e urgente a opinião pública e a política nacionais, neste caso sobre o tema específico das drogas. Infelizmente, ela também é emblemática do despreparo, da negligência e mesmo do preconceito com que o jornalismo brasileiro frequentemente aborda o assunto”, pontua trecho da introdução.
É nesse sentido que precisamos mudar as narrativas sobre drogas, entender a complexidade do tema e trabalhar em diversos ângulos das histórias. Não dá para o sensacionalismo continuar pautando o que será debatido.
E o carnaval é um momento rico para essa conversa. As pessoas estão consumindo drogas. Muitas drogas. Como vamos narrar essa história, falando de purpurina, samba, bloco, escola de samba e… drogas? Essa é a grande questão.
Que tal redução de danos?
A campanha na internet#RoleSemVacilo criou um material rápido e didático sobre propriedades e redução de danos de diversas drogas, como álcool, tabaco, maconha, cocaína e crack. Organizado pela PBPD, produtora Pipoca, ONG É de Lei, coletivo Respire, e iniciativa Drogas: Reduzir Danos, divulgaram em forma de memes as dicas de redução de danos.
Essa iniciativa contribui para o debate transparente e dá autonomia de decisão para o usuário. Com isso, rompemos o tabu, encaramos de frente a questão das drogas, e criamos meios de falar com uma parcela enorme da população que consome drogas.