Mourão, Moro, Mandetta e Guedes
Quando os quatro jogadores mais importantes de uma equipe – que já não está muito bem das pernas – começam a dar sinais públicos de que estão se rebelando é porque a coisa não está muito boa para o capitão do time.
Coluna escrita com a colaboração de Francisco Afonso Nepomuceno, Leonardo de Brito, Valdemir Neto, Gilvandro Soares de Assis, André Kamai e Ermício Sena.
Quando os quatro jogadores mais importantes de uma equipe – que já não está muito bem das pernas – começam a dar sinais públicos de que estão se rebelando é porque a coisa não está muito boa para o capitão do time. Bolsonaro pagou para ver e está aí o resultado: uma queda significativa em sua popularidade, conforme demonstrou a pesquisa Datafolha divulgada nesta sexta-feira, 03/04.
Parece que o esporte favorito do presidente com histórico de “atleta” é brincar de roleta russa. Insistiu com o ministro Guedes (Economia) para conceder R$ 200,00 (duzentos reais) de ajuda emergencial para desempregados e trabalhadores informais impactados pela pandemia do novo coronavírus. O Congresso Nacional aprovou R$ 600,00 (seiscentos reais) e acabou levando, junto com Guedes, os louros da medida.
Insistiu em minimizar o pedido do ministro Mandetta (Saúde) para que as pessoas mantivessem o isolamento social e foi às ruas comer “churrasquinho de gato”. Mandetta afirmou duas coisas que, para Bolsonaro, constituem uma “sinuca de bico”: 1) que não pede demissão. “O senhor que me demita, Presidente”, teria dito um empoderado ministro, em tensa ligação telefônica com o chefe; e 2) que continua defendendo o isolamento social. A população, os governadores dos Estados e a ampla maioria dos prefeitos municipais têm seguido as orientações de Mandetta, do ministério da Saúde e da OMS, refutando as extravagâncias de Bolsonaro.
Por último, o presidente “deixou vazar” à imprensa suas queixas ao comportamento do ministro Moro (Justiça e Segurança Pública), a quem chamou de “egoísta” e “covarde”. Mais uma vez, Bolsonaro levou a pior: Moro tem mais popularidade que ele e, como sempre foi político, está pulando fora, ficando dentro.
Ainda é precipitado falar em impeachment ou mesmo em renúncia. Mas, se juntarmos as insubordinações de Moro, Mandetta e Guedes à carta das esquerdas, tornada pública na segunda-feira, 30/03 (assinada, dentre outros, pelos presidenciáveis Fernando Haddad, Ciro Gomes, Guilherme Boulos, Flávio Dino e Manuela D’Ávila); ao desastre na Economia; e à queda na popularidade de Bolsonaro, podemos crer que a batata do presidente está assando.
Isso se torna ainda mais crível a partir do momento em que Bolsonaro deixa de ser uma ameaça somente para a disputa política com a esquerda e se torna uma ameaça à vida de toda a população e também à Economia, o que ocorre, por sua vez, quando se isola do mundo inteiro em suas posições negacionistas em relação à pandemia de Covid-19; e quando os seus estímulos ao mercado não surtem os efeitos desejados.
Podemos afirmar que, atualmente, Bolsonaro só conta com o apoio de seu clã e de parte das FFAA (por conta dos milhares de cargos que ocupam); na sociedade, o apoio vem dos evangélicos, da matilha de milicianos, dos seguidores fanáticos e da parcela protofascista das classes média e baixa.
Quem é o fiel da balança no jogo político atual? Os militares. Qual é a peça que, se bem mexida, vai dar o xeque-mate? Mourão. Se o vice-presidente resolver descer para disputar o apoio das FFAA, outros setores da sociedade poderão se encorajar: Poder Judiciário, veículos de mass mídia, elite financeira, Congresso Nacional.
Prova disso é que quando Michel Temer começou a se mexer em 2016 – e o fez porque observou um vácuo e uma janela de oportunidade – sentiu-se o que foi o céu se abater sobre a cabeça de quem ainda apoiava Dilma Roussef. Vice com chances de derrubar presidente é o pior pesadelo que o eleito pode ter. Mourão já se deu conta disso e pode vir a fazer o mesmo.
No tabuleiro disputam, portanto, dois jogadores ligados às FFAA: Bolsonaro e Mourão. A diferença é que o primeiro é capitão; o segundo, general full. Ambos estão atrás das bênçãos de uma terceira figura, de influência determinante: o General Villas Bôas. Essa semana Bolsonaro visitou Villas Bôas, a quem pediu apoio – que foi imediatamente manifestado por intermédio da conta no Twitter do moribundo oficial. Mourão, por sua vez, tem buscado agradar os militares, enaltecendo o Golpe Militar de 1964; busca agradar os descontentes e a oposição, se pronunciando contrário às loucuras de seu chefe; e busca ter o apoio dos influentes do governo.
Se Mourão quiser fazer a disputa pra valer, deve ter como aliados preferenciais os oficiais da ativa. Mas, mesmo estando na reserva, se Villas Bôas desembarcar do governo e aderir a Mourão, os demais virão juntos: o prestígio do velho general levaria consigo muitos da ativa que estão por lá.
Percebendo o isolamento, Bolsonaro mudou radicalmente o tom adotado até a véspera, em pronunciamento realizado, em cadeia nacional, na noite da terça-feira, 31/03. A fala foi digna de um Chefe de Estado. Um equilibrado e ponderado Bolsonaro tomou o lugar do fanfarrão, fazendo jus ao que se espera de um presidente da República. Mas, o suposto “surto de sensatez” não durou mais do que 12 horas: no manhã do dia seguinte, o primeiro ato de Bolsonaro foi postar fake news em suas redes sociais, sobre um falso desabastecimento da CEASA de Belo Horizonte.
O capitão só sabe atuar na arena política dando canelada. Em uma crise como essa, onde todos precisam se unir para salvar vidas, ele fica sem chão. E, para que a sua inutilidade não fique ainda mais evidente, cuida de distribuir fake news, bordoadas, xingamentos, ameaças, represálias. Além de inútil, o homem é incorrigível. Um prato cheio para os oportunistas e ávidos pelo poder.
Por fim, há quem diga que a interdição branca de Bolsonaro já teria sido dada. O Presidente “operacional” do Brasil já seria o ministro de estado-chefe da Casa Civil, Gal. Braga Neto. É uma mera conjectura, uma ilação. Caso esta hipótese seja verdadeira, não teria sido o Exército Brasileiro a “tomar” o poder, e sim a parte do EB que ainda apoia Bolsonaro. Se não o fizessem, a “parte” do Mourão ganharia a briga.
A ver os próximos capítulos…