Moda contemporânea e seus múltiplos caminhos
É urgente revolucionarmos modelos impostos, que nos aprisionam, principalmente em moldes definidos por quem, desde sempre, nunca teve o interesse em compartilhar sucesso.
Numa parceria muito preciosa e inédita na imprensa nacional, estamos na terceira série da Campanha pró-criadores de moda autoral brasileira. Divulgamos moda pensante, de dezenas de talentos de diversos cantos desse nosso país que, com pluralidade de conceitos e estéticas legítimas, nos ensinam que se há limites pra ter, não há limites pra ser.
A vida é uma experiência única, e os acontecimentos do mundo ora nos inspiram, ora nos limitam.
Ideias de moda podem – e devem – ser concretizadas pelo uso de infinitas possibilidades, porque a autonomia criativa de um artista é o seu bem maior, justamente por proporcionar a ele o grande prazer de ter a certeza de realizar um trabalho digno e verdadeiro, e por isso útil, capaz de acrescentar à vida das pessoas.
É urgente revolucionarmos modelos impostos, que nos aprisionam, principalmente em moldes definidos por quem, desde sempre, nunca teve o interesse em compartilhar sucesso.
Revolução é reformular o sentido das coisas, e o simples ato de nos vestirmos no dia a dia parece banal, mas reflete justamente a forma como vemos o mundo. E escolher comprar de um criador autoral é um ato revolucionário.
Deixo uma dica: além de saber quem criou sua peça, na hora da compra só pense se você gosta, porque se VOCÊ gosta, deve ter muito a ver com a sua personalidade. E isso é o que importa. Abuse do vale-tudo da moda, beba na fonte de culturas diversas, na sua própria história, em looks retrô, em misturas inusitadas de cores e materiais, e principalmente na natureza. Invista na estética da sua inspiração. Mostre ao mundo o seu universo interior sem receio: garanto que você vai se surpreender, ganhar força e conquistar ainda mais facilmente seus objetivos.
Confira os próximos 10 criadores desse nosso movimento dos bons, que praticam a grandeza da coragem de ser o que se é, “pra que o amanhã não seja só um item com o mesmo nome”, [como Emicida já cantou].
Naná Oliveira
A estilista e costureira Naná Oliveira sonhou com a Dandara, compartilhou esse sonho e a marca nasceu. Quem desenvolve as peças são moradores, em sua maioria mulheres, da periferia de Aracaju, Sergipe, mais precisamente da ocupação Beatriz Nascimento do MTST – Movimento dos Trabalhadores Sem Teto.
Através de técnicas de upcycling, eles transformam calças jeans usadas, [recebidas como doação em um bazar existente dentro da ocupação], em saias, coletes, bombers e bolsas com modelagem agênera, com o apoio do curso de design de moda da Universidade Tiradentes, produzindo de maneira que as experiências acadêmicas e as vivências das pessoas da ocupação se fundem. Essa proposta não poderia ser mais moderna, mais raíz.
Adelmo Lins
Adelmo Lins, estilista, atuou em várias frentes do mundo da moda pernambucano, até descobrir, em suas experiências prediletas da infância e memória afetiva, o que atualmente tem direcionado o seu peculiar trabalho de desenvolvimento de kaftans com estampas exclusivas, elaboradas a partir do uso da técnica da colagem analógica, técnica essa que amava quando criança, da qual se apropriou pra produzir colagens com temáticas de moda, ressignificando o seu grande acervo de revistas, de onde extrai as imagens que depois de impressas em tecido, se transformam em arte vestível.
Produto Dugueto
A Dugueto já tem dois anos, e muita história pra contar.
Em Salvador, terra em que é produzida, é referência sobre afroempreendedorismo. “Cria” do complexo de bairros do Nordeste de Amaralina, a marca se define como “que trabalha com a representatividade do povo preto da favela em suas coleções, trazendo vivências da vida na quebrada”.
Adriano Soares, seu criador, com essa experiência de transpor limites, é a simbologia máxima da cultura contemporânea. Quem é vivo sabe que só o autoconhecimento gera autonomia. O melhor do futuro está entre nós.
Airon Martin
Airon Martin “utiliza como base a análise do corpo e da mente humana e como eles são percebidos pela sociedade”, para desenvolver conceitos e ideias e depois materializa-las, podendo ser em mobiliário, peças de vestuário, instalações e intervenções urbanas.
Em 2016, depois de anos trabalhando em projetos de arquitetura, o designer criou sua primeira peça autoral, a cadeira Un. Em seguida veio sua marca Misci, que interage com outras culturas, sempre sob a perspectiva da diversidade brasileira.
DeLaurentis
“Feito à mão pra quem faz à mão”. Esse é o slogan da DeLaurentis, marca de aventais produzidos com tecidos sustentáveis, que têm os resíduos da produção doados a marcas parceiras. Com design certeiro, cada modelo seu é aprovado por profissionais atuantes na área específica para a qual ele foi criado.
Gabriela De Laurentis afirma que seus aventais “têm o poder de fomentar o resgate dos ofícios artesanais, culturas, histórias, significâncias, e são produzidos pra um consumidor mais conectado e participativo, responsável com a sociedade e o meio ambiente”. [Bela] coisa do novo mundo.
Malujoom
Malujoom é uma marca de acessórios alternativos criada pelo designer Lucke Coul, a partir da sua observação das sobras de materiais descartados pelo pai, que realizava pequenos concertos em uma sapataria improvisada no fundo de casa.
Seu processo criativo é fundamentado em encontros, e o resultado estético é uma organização coletiva, bastante original, como um piquenique de ideias. A inspiração do seu trabalho vem também da singularidade de cada ser, e suas buscas íntimas por autoconhecimento e autenticidade.
TΔ
Não é somente roupa, é slow living. A TΔ une o agênero, a alfaiataria e a sustentabilidade, e nasceu quando Gi Caldas, sua estilista, percebeu que sustentabilidade apenas como processo e sem educação de consumo é utopia. Por isso ela vai muito além da mesmice instalada, e propõe também novas práticas de consumo: após a compra, cada peça vendida recebe orientações de manutenção por e-mail, ao longo de um ano. Passado esse prazo, o cliente pode fazer a troca de peças usadas da marca por descontos na compra de novas peças.
Além disso, pergunta ao consumidor: você precisa mesmo deste produto? É pura inovação. O tempo da TA é outro, onde o futuro já é.
Todos os Poemas
Atemporal, a Todos os Poemas trabalha o design aliado ao artesanato para criar peças exclusivas, feitas à mão, pensadas e desenvolvidas juntamente com artesãos e artistas cearenses.
A gente sabe que a moda do novo mundo tem que carregar consigo uma história. Suas três sócias contam tudo e fazem muito. Provam que o redor importa tanto quanto o próprio produto, que nessa marca tem tag de semente, e é embalado em sacola de tecido, “com desejo de aprender junto, de encorajar, de mudar vidas. Acreditando, perseverando, compartilhando e repartindo”.
Viva Celina
Cecéu Pessoa é a designer da Viva Celina, uma marca paraibana, com sede em João Pessoa/PB, cuidadosa, que usa matéria prima reciclada, natural e/ou certificada, [inclusive botões de cânhamo], e que prega moda sem padrões ou obrigações, fomenta o design autoral, e promove tradições locais e a cultura popular.
Além disso, compensa o lixo gerado através das embalagens usadas nas suas vendas online junto ao selo Eu Reciclo. Sua proposta é uma experiência criativa completa.
Ser’tão Encantado
Nunca a cultura foi tão importante, e cultura é processo, não é conclusão.
Ser’tão Encantado é Júlia Nogueira, artista visual, designer, diretora de arte, muralista, performer, que se inspira em sua terra, Alagoas, para criar, mais precisamente na atmosfera da Ilha do Ferro, e em tudo que circunda o universo do cangaço.
Suas peças têm cores, traços, e “chêro” do Nordeste. Seu trabalho é pura emoção estética.