Estelionato eleitoral movido a petróleo
Supõe-se que a nova presidência da Petrobrás vai fazer o que os anteriores não fizeram: segurar o preço dos combustíveis até as eleições
Caio Paes de Andrade assume a presidência da Petrobrás nesta semana. É o quinto a ocupar o cargo no governo Bolsonaro. Supõe-se que ele chega para fazer o que os anteriores não fizeram: segurar o preço dos combustíveis até as eleições. Sua tarefa será facilitada com a proximidade do pleito e, ainda mais, se a escolha do presidente da República para o próximo mandato for resolvida logo no primeiro turno. Em qualquer hipótese, a alta no preço dos combustíveis ficaria para os dias seguintes à definição do resultado.
Com o amparo de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara e gestor do orçamento secreto, Bolsonaro conseguiu aprovar um limite para a alíquota de ICMS, que é um imposto estadual, incidente sobre o preço do petróleo. Ao aprovar a medida, o Congresso definiu compensações pela perda de receita pelos estados, mas elas foram vetadas por Bolsonaro. E é improvável que a redução do ICMS se reflita no preço da gasolina e do diesel nos postos de combustíveis.
Bolsonaro está desesperado com a persistência dos números das pesquisas eleitorais que indicam a vitória de Lula, às vezes no primeiro turno. Auxílio emergencial, isenções fiscais, distribuição de tratores, benesses para pastores: quase tudo já foi tentado. Mas a vantagem de Lula persiste, enquanto Bolsonaro, com alta rejeição, perde para qualquer concorrente num eventual segundo turno. Conter a inflação é o seu objetivo imediato e vital, para o que precisa segurar os preços dos combustíveis, custe o que custar.
Bolsonaro insiste no papel de Papai Noel eleitoral. Tira dinheiro de programas sociais e detona os orçamentos de órgãos vitais para atender a nichos específicos, como o “auxílio caminhoneiro”, e tentar conter a perda de apoio eleitoral nesse setor. Tira de todos para beneficiar os que considera seus.
Dependência fóssil
Evidentemente, as pressões sobre o mercado do petróleo não atendem às emergências do processo eleitoral brasileiro e, conjunturalmente, derivam da guerra na Ucrânia e das sanções comerciais adotadas pelos países da Otan contra a Rússia. A redução das exportações de petróleo da Rússia para o Ocidente pressiona o preço internacional e produz inflação em vários países, conforme o grau de dependência que têm do produto.
E como pano de fundo, há a questão não menos urgente das mudanças climáticas, exigindo reduções drásticas nas emissões de gases do efeito estufa, do que o carvão e o petróleo são campeões. A política adotada pelos países que procuram reduzir emissões é de aumentar, e não de reduzir os preços dos combustíveis fósseis. Com isso, estimulam a geração de energias limpas para substituí-los.
Os preços da gasolina e do diesel não estão menores no Brasil do que na maioria dos demais países. O que agrava a situação é o alto grau de dependência do transporte rodoviário para pessoas e cargas, associada ao baixo nível de renda e ao elevado grau de miséria e de injustiça social. Todo mundo sabe que a inflação afeta muito mais duramente aos mais pobres.
Os candidatos a presidente descem o malho na alta dos combustíveis, que atribuem ao desgoverno Bolsonaro, enquanto ele malha a própria Petrobrás, da qual a União é acionista majoritária e é quem nomeia a sua direção. Lula e Ciro Gomes propõem que a política de preços tenha relação com os custos de produção e distribuição, e não com os preços internacionais do petróleo.
Imediatismo
Os principais candidatos sugerem destinar parte dos lucros da Petrobrás para subsidiar os preços internos dos derivados do petróleo. O recurso ao subsídio até faz sentido para proteger o mercado interno de flutuações transitórias excessivas nos preços internacionais, mas não é solução sustentável para suportar uma tendência contínua de alta.
Nenhum dos candidatos sugeriu ampliar os investimentos da Petrobrás na geração de energias limpas e, assim, na própria transição da empresa para uma economia de baixo carbono. A urgência da carestia, a três meses das eleições, não combina muito com transições e objetivos que não sejam imediatos.
Não há previsão de milagre para os próximos três meses, mas é de se esperar a manipulação da crise pelos candidatos e um debate de pouca profundidade, orientado mais para impressões e emoções dos eleitores do que para soluções estruturais.
Bolsonaro e Caio Paes de Andrade devem orar para que alguma força superior à Petrobrás tome providências para baixar os preços dos combustíveis a tempo de produzir o esperado efeito eleitoral. Será difícil. As pesquisas espontâneas de intenção de voto mostram que cerca de 75% dos eleitores estão decididos e que o radicalismo verbal, ao mesmo tempo que atrela um terço dos eleitores, acirra a sua rejeição no restante do eleitorado.
O alongamento do desgaste de Bolsonaro interessa eleitoralmente a Lula, mas a bomba dos preços dos combustíveis vai explodir bem antes da eventual posse dele na Presidência. Por ironia do destino, ele assumiria com a mesma assombração (Petrobrás) com que se despediu do segundo mandato.