Faz alguns anos desde que me entendi uma mulher negra e favelada. Foi na luta com os movimentos de favela pela moradia, pela sobrevivência e pela dignidade que vi as favelas e seus moradores reivindicarem papel protagonista na construção de seus territórios e também de suas vidas. Há muito tempo também a favela tem sido espaço da construção de diálogos interessantes e de propostas para a transformação das cidades. Na cidade do Rio de Janeiro, as favelas figuram como agentes imprescindíveis na constituição e na construção de seu cotidiano.

Se na luta pela permanência em seus territórios, as histórias do povo favelado do Rio são centenárias, para o poder público a favela só chegou depois, mais especificamente em 1992, quando passou a fazer parte da dinâmica oficial do Plano Diretor da cidade, movimento que antecedeu o “Favela Bairro”, uma das maiores intervenções urbanísticas desde o “bota abaixo” de Pereira Passos, no início do século 20. Ou seja, mesmo com um Plano Diretor, que tinha como premissa colocar a favela literalmente no mapa, a provisoriedade e as remoções ainda eram palavras que significavam muita luta e muita disputa pela cidade, significando para os favelados e faveladas nada mais do que a possibilidade de existir com acesso ao mínimo de cidadania possível.

No último domingo de agosto participei do curso Favelizando, no Morro da Providência, compondo a mesa “A favela e as Políticas Públicas”. É desse ponto que parto para dizer que a favela deve ser alvo e território de experiências de aceleração de potencialidades pelo Estado, o que vai muito além do que vivemos até aqui. Não é mais apenas para “dar dignidade e promover cidadania”. Parafraseando um filme famoso, “o assunto agora é outro” e está sendo pautado há muito tempo pela favela.

São as evoluções dos mutirões, da cobrança dos resultados de pesquisas que foram realizadas tendo como objeto a favela e seus moradores/as, das reuniões participativas, mas com franco viés civilizatório. Acelerar potencialidades é garantir acesso qualificado aos meios ampliados, refinados e efetivos de avanço e emancipação daqueles e daquelas que habitam esses territórios.

No século 21, a favela quer ocupar lugar de destaque na efetivação da possibilidade concreta de morar com tranquilidade como em qualquer outro espaço da cidade. Atravessada por seus modos próprios de constituir-se, que vão desde a autoconstrução até a produção de linguagens diversas nas artes e nas culturas, a favela tem alto potencial para influenciar toda a sociedade. É hora de acelerar esta potencialidade!

Há um enorme contingente na população favelada que já acessou a universidade, já passou por várias etapas de aumento e progressão de escolaridade chegando às graduações mais elevadas, a favela está nas instituições de pesquisa produzindo epistemologias e conhecimento científico nas mais variadas áreas e também está na luta para ocupar espaços diversos na sociedade como um todo. Acelerar potencialidades é olhar com seriedade e responsabilidade a partir do chão que se pisa e do impacto das experiências concretas no corpo daqueles que vivem todos os dias neste território-potência.

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