Os próximos dias serão de intensas discussões, em Belém, sobre a importância da Amazônia diante da crise climática. Já está em curso o evento “Diálogos Amazônicos”, que consiste em cinco plenárias, organizadas pelo governo federal, com a presença de representantes dos estados, cientistas, empresários, ONGs e movimentos sociais, para formular propostas para a “Cúpula da Amazônia”, que reunirá, na próxima semana, no âmbito da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), os dirigentes do Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Guiana, Suriname e Venezuela.

A Guiana Francesa não integra a OTCA, mas a França foi convidada para a Cúpula, assim  como os governos da Indonésia e do Congo, além de outros países detentores de florestas tropicais. Essa articulação entre países tropicais tem no horizonte a realização, em novembro de 2025, também em Belém, da COP-30, a trigésima conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a questão climática. A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas foi assinada pelos chefes de Estado, em 1992, no Rio de Janeiro, mas a COP-30 será a primeira reunião realizada na Amazônia.

A Amazônia, a sua biodiversidade e os serviços ambientais que o ecossistema promove têm influência cientificamente comprovada nas condições climáticas continentais e globais. A região também sofre os impactos do efeito estufa. Há previsão de forte estiagem para esse ano, por conta do fenômeno (natural) El Niño, que decorre do aquecimento das águas na zona equatorial do Oceano Pacífico, agravado pelo aumento da temperatura provocado pela excessiva queima (antrópica) de combustíveis fósseis e pelo desmatamento.

As consequências das estiagens agudas para a população amazônica são devastadoras. Impactam a navegação e impedem o trânsito de pessoas e de mercadorias, afetam a assistência à saúde, o abastecimento e a segurança alimentar, além da biodiversidade, das roças e plantações. As informações já disponíveis sobre o atual El Niño recomendam que as autoridades públicas estejam preparadas para a provável emergência.

Soberania compartilhada

O fortalecimento da OTCA, como instância privilegiada para tratar da correlação entre Amazônia e clima, já é um indicador de rumo da diplomacia presidencial de Lula. Abre espaço para uma agenda compartilhada, que vai do combate ao narcotráfico e aos ilícitos ambientais até a construção de uma pauta comum para a interlocução com os demais países, órgãos multilaterais ou fundos internacionais.

O governo federal intensificou operações de fiscalização e de desintrusão de áreas invadidas, articuladas entre o Exército, a Polícia Federal, as polícias militares e outros órgãos de controle federais e estaduais. Com essas e outras providências, os alertas de desmatamento na Amazônia emitidos pelo INPE caíram 33% no primeiro semestre deste ano. A experiência acumulada ensejou a formulação do “Plano AMAS” – Amazônia: Segurança e Soberania – para instalar dezenas de bases de fiscalização, estrategicamente dispostas pela região, para barrar as rotas do narcotráfico e dispor da mobilidade necessária para assegurar a presença do Estado.

A experiência também mostrou que grande parte dos ilícitos ocorre em áreas de fronteira e envolvem o crime organizado que também opera nos países vizinhos. Assim ocorre na invasão garimpeira ao território Yanomami, ou nos assassinatos no Vale do Javari, como os de Bruno Pereira e Dom Phillips. Por essas e outras, Lula vai propor, na Cúpula, uma estratégia pan-amazônica de combate ao narcotráfico e aos crimes ambientais.

Protagonismo do Sul

A redução do desmatamento na Amazônia também fortalece a posição de Lula e do governo brasileiro nas negociações internacionais, inclusive para cobrar dos países desenvolvidos os aportes financeiros, prometidos mas insuficientemente efetivados, para que os países mais pobres possam mitigar os impactos e se adaptar às mudanças climáticas globais. A presença, na Cúpula, de dirigentes de outras potências florestais, também sinaliza uma agenda comum sobre a questão florestal, para pautar a COP-30.

Foto: Cláudio Kbene/PR

O Brasil está ofertando, aos vizinhos e parceiros florestais que desejarem, cooperação técnica para o monitoramento do desmatamento, incidência de fogo e outras formas de degradação florestal, para subsidiar ações e projetos dos governos, e o acesso de todos ao mercado regulado de carbono e de pagamento por serviços ambientais, inclusive aos fundos públicos e privados que financiam projetos “jurisdicionais”, federais ou estaduais. O Fundo Amazônia, gerido pelo BNDES, está apto para financiar esse tipo de cooperação técnica regional.

É mais do que previsível que os debates sobre uma agenda climática amazônica vão se intensificar nesses dois anos e três meses que nos separam da COP-30. É tempo suficiente para que ela se desdobre e incorpore as demandas das populações regionais entre as prioridades da comunidade internacional.

A COP-30 será o maior evento diplomático da história da Amazônia. São esperadas as presenças, em Belém, de 50 mil pessoas e dezenas de chefes de estado. Mas os resultados mais perenes dependerão do empenho e da competência com os que os atores políticos, econômicos e sociais se articularem até lá.