Há oito anos, em novembro de 2013, eu escrevi sobre o projeto de Lei nº 223/2012, do vereador Walter Cavalcante (PMDB), que aprovava a inclusão do dia da Marcha pela Vida contra o Aborto no calendário oficial de Fortaleza.

Talvez por ironia do destino, e aqui afirmo que escrevo com ironia, novamente, os nossos corpos são colocados em pauta. É um desgaste constante para nós mulheres termos que afirmar, reafirmar e esbravejar o óbvio: tirem as mãos dos nossos corpos, nos deixem livres.

Afinal, qual o papel do estado quando se trata de corpos de mulheres? Proteger? Prezar pela liberdade? Ou simplesmente corroborar, incentivar e financiar a cultura machista e misógina construída e alimentada pelos setores mais conservadores da nossa sociedade?

A Lei nº 11.159/2021, de autoria do vereador Jorge Pinheiro (PSDB), foi sancionada pelo prefeito Sarto (PDT), institui a “Semana pela vida”. Esta  promove o ensino da “conscientização” do papel das mulheres para a manutenção da ordem masculina, heterossexual, rica e branca dentro desse modelo de sociedade que faz do estupro um espetáculo ao vivo na tevê.

Quero perguntar de forma bem sincera, e quero aqui dialogar com as mulheres que me leem: quantas mulheres vocês conhecem que já tiveram que recorrer ao aborto? Seja ele de forma legal. Ou clandestina. Quantas mulheres vocês conhecem que tiveram que levar adiante uma gestação fruto de um estupro, por falta de acesso a métodos contraceptivos ou com receio do julgamento das pessoas da sua religião? Quantas já estiveram grávidas sem querer, ou querendo, e foram privadas de pensar, DE PENSAR, se queriam levar à frente a gestação?

Pensar, repito pela quarta vez, PENSAR, virou um ato clandestino para nós mulheres. Mas como proibir o pensamento livre e o direito ao nosso corpo virou tema da “Semana pela vida”.

Que vida é essa que não nos permite pensar sobre nossos próprios corpos. Sobre maternidade. Sobre o destino que queremos construir para nossas vidas.

A tal “Semana pela vida” é um evento que promove a desinformação e reafirma que nós, mulheres, não temos o direito de construir um destino fora da maternidade para nós.

É a violência contra a mulher legalizada e incentivada pelo estado vestida de moral e de “bons costumes”.  É a violência, principalmente, contra as mulheres negras e pobres, que são as que mais sofrem com a criminalização do aborto, por estarem submetidas à falta de acesso à saúde, educação, moradia, alimentação e ao aborto seguro. Isso, sim, deveria ser tema de política pública e de uma semana organizada e incentivada pelo poder público.

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