Vou começar este texto com uma frase que me chamou bastante atenção no livro e penso/creio que resume bem a história contada: “Quantas perdas cabem na vida de uma mulher?”.

“O Peso do Pássaro Morto” é um romance-poesia (posso chamar assim?!), publicado em 2017, pela editora NÓS e escrito por Aline Bei, ganhador do prêmio São Paulo de Literatura em 2018. É de fácil leitura. Tem 165 páginas em que uma mulher, que não tem nome, conta sua história em capítulos que são divididos por anos de vida.

O livro é forte. Confesso que não consegui lê-lo de uma tacada só, nem aconselho a fazer isso, pois ele tem muita densidade e que narra cenas que podem ser gatilhos para muitas.

Eu grifei o livro quase todo, confesso. A autora foi muito cirúrgica e conseguiu escrever frases impactantes e de muito efeito.

Bom, há um capítulo para cada idade da personagem e isso se percebe, além da numeração, pela escrita da autora. Aline conseguiu demarcar bem a  evolução da personagem com o passar do tempo, o amadurecimento da personagem ao longo dos anos. E também nos mostra que as perdas podem acontecer em qualquer fase das nossas vidas. E não há perda maior ou menor, cada perda tem/traz seus pesos e suas cicatrizes.

É um livro muito imagético. Você desenha as cenas a cada leitura. A forma como Aline conduz a escrita também te coloca em um ritmo que faz com que a obra fique mais viva.

Retomando a frase do primeiro parágrafo,  “Quantas perdas cabem na vida de uma mulher?”, a personagem que não tem nome, e talvez não tenha para não causar uma identificação da leitora com ela, vivencia diversas perdas durante a vida, desde sua infância. Cada um desses momentos expõe cicatrizes que pareciam estar curadas, mas logo aparece com um novo fato. É como se o peso delas ainda estivesse ali, fazendo com que a personagem sempre se questione sobre o caminho e sentido da vida.

Ela vive o machismo nas suas diversas formas: estupro, o abandono e o peso que a maternidade pode ser são exemplos. Mas a principal delas, tratada de forma indireta, é o entendimento de que o abandono, a solidão e a violência não é individual, mas uma construção estruturante,  parte da vida de qualquer mulher. Por isso, é tão forte para nós mulheres.

A gente se reconhece na personagem a cada perda. O livro é um convite à reflexão sobre como um modelo de sociedade patriarcal adoece as mulheres, ou melhor, mata as mulheres.

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