Governo de SP ameaça fechar último equipamento público em funcionamento na Cracolândia
Com a iminência do fechamento da Unidade de Atendimento Diário Emergencia, ações do governo vão na contramão das orientações da sociedade civil e deixam a população em situação de rua desassistida.
Neste momento de pandemia do coronavírus, as condições de quem mora na rua estão ainda mais precárias e a população que vive na região conhecida como Cracolândia, no centro da cidade de São Paulo, tem tido direitos básicos ainda mais violados, desde acesso à água até informação sobre prevenção.
A Unidade de Atendimento Diário Emergencial (ATENDE 2) faz parte do Programa Redenção da prefeitura de São Paulo, “para atendimento multidisciplinar destinado ao acolhimento de pessoas em situação de rua e em uso de substâncias psicoativas”. Este é um dos últimos equipamentos na região que continua funcionando e, agora, é alvo de mais uma política de desmonte. Ele tem sido um dos únicos locais do território onde é possível ter acesso a pias com água corrente, por exemplo, além de alimentação, pernoite e chuveiros.
Um espaço da cidade que, historicamente apresenta uma rede de atenção e cuidado insuficiente, agrava-se com as recentes tomadas de decisões dos governos municipal e estadual. Desde 2017, a gestão municipal vem tentando deslocar a Cracolândia para fora do centro de São Paulo.
Recentemente, tem circulado nas redes sociais diversos áudios, já verificados pela Agência Lupa como falsos, relatando arrastões na região. Tais relatos com frequência embasam ações truculentas da polícia contra as pessoas moradoras da região.
Para além da estratégia coercitiva marcada pela constante violência policial, a prefeitura flerta com a intenção de fragilizar, ainda mais, a rede de cuidado existente.
Sociedade Civil
No dia 31 de março, Maria Angélica Comis, do Centro de Convivência É de Lei, e Nathália Oliveira, da Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas, apresentaram reivindicações construídas com o Fórum Mundaréu da Luz para a Secretaria Geral do Governo Municipal, 17 solicitações para reduzir os danos sociais e à saúde causados pela pandemia na população em situação de vulnerabilidade.
Decisões que produzam condições ainda mais vulneráveis são no mínimo irresponsáveis. O atual momento requer acolhimento e abertura para o próximo. As ações do governo vão na contramão das orientações da sociedade civil que atua no território: o fechamento de um dos poucos canais de acesso a direitos básicos da população local revela a perversidade da política de deixar morrer que governos impõem à população em situação de rua na cidade de São Paulo.
Confira abaixo as solicitações apresentadas:
1. Equipes de Saúde/SMADS preparadas para identificar sintomas e orientar as pessoas nos locais de distribuição de comida;
2. Garantir leitos de isolamento nos SIATs Porto Seguro, Glicério e Armênia (se ainda houver contêiner);
3. Garantir que o Atende 2 ofereça possibilidade de banho e distribuição de kits de higiene;
4. Aumentar a quantidade de pias instaladas na região central e nas cenas de uso da cidade, garantindo sabão;
5. Focar as abordagens nas cenas de uso para a orientação em relação à prevenção de transmissão e ofertar encaminhamentos para evitar aglomeração;
6. Verificar se no serviço da região da Vila Mariana só estão casos confirmados, pois tivemos a informação de que os encaminhamentos estavam desordenados;
7. Avançar na ampliação dos Consultórios na Rua;
8. Garantir que os Consultórios na Rua consigam conversar e fazer abordagens e encaminhamentos com a SMADS (sabemos o quanto isso é difícil);
9. Pensar em estratégias de divulgação de informações usando colagem de dicas nos muros da cidade, além de possíveis projeções;
10. Garantir que profissionais de ponta tenham acesso aos EPIs;
11. Garantir que as equipes estejam com as informações alinhadas e tenham conhecimento de todas as novas possibilidades de encaminhamentos;
12. Ter equipes que façam triagem das pessoas nos novos Centros de Convivência PopRua;
13. Possibilidade de uso de hoteis sociais emergenciais para os grupos em maior vulnerabilidade (pessoas idosas, comorbidades);
14. Garantir a interlocução com os Médicos sem Fronteiras
15. Fortalecer as equipes dos CAPS, tendo em vista que possivelmente terão que lidar com mais pessoas com síndrome de abstinência nesse período;
16. Utilizar redutores e redutoras de danos dos CAPS AD para fazerem busca ativa em seus territórios de atuação;
17. As equipes de PRD (depto de IST/HIV) da cidade também poderiam contribuir para o fortalecimento das abordagens de Consultório na Rua, pois já fazem esse trabalho em regiões que tem muitas profissionais do sexo e pessoas que usam substâncias.