Por Jardel Felipe para os Estudantes NINJA

“Racismo? No Brasil? Quem foi que disse? Isso é coisa de americano. Aqui não tem diferença porque todo mundo é brasileiro acima de tudo, graças a Deus”, Lélia Gonzalez, 1979.

No imaginário tecido social brasileiro vivemos em uma democracia racial. Independente de cor, todos somos bem tratados e dispomos das mesmas oportunidades. Não obstante, diariamente somos bombardeados com noticias tristes e estarrecedoras destinados única e exclusivamente a população negra. Cito no título dessa matéria, uma de várias intelectuais brasileiras apagadas pelo Epistemicídio. Gonzalez não foi citada aqui em vão, em seu artigo “Racismo e Sexismo na Cultura Brasileira”, um clássico para os que estudam as questões de gênero e raça, a autora valida-se da psicanálise para caracterizar o racismo enquanto uma neurose cultural brasileira.

Recentemente, os filhos de Bruno Galiasso e Giovanna Ewbank sofreram ataques racistas num restaurante em Portugal. A mídia brasileira, especificamente no programa Mais Você de Ana Maria Braga, televisionado pela Rede Globo, exibiu um vídeo de macacos ao comentar o caso de racismo. Trazendo novamente Gonzalez à tona, para explicar os motivos pelos quais o discurso de ódio e ideológico se faz presente, precisamos compreender o que é consciência e memória. Como consciência podemos entender como “aquele lugar do desconhecimento, da alienação, do esquecimento e até do saber” e como memória “como o não-saber que conhece… consciência exclui o que a memória inclui”.

O que se tenta reencarnar aqui, é que vivemos em uma democracia racial. O exemplo crucial para percebermos essa ideologia, não importa em que nível, é que a nossa consciência cobra de nós onde devemos descartar a crioulice e se “comportar como gente”. E podemos citar sem reservas que a sociedade brasileira é a gente que embarca nessa viagem.

Como dizia Gonzalez: “Tem um branco importante chamado Caio Prado Junior”, em seu livro Formação do Brasil Contemporâneo: “Realmente a escravidão, nas duas funções que exercerá na sociedade colonial, fator trabalho e fator sexual, não determinará senão relações elementares a muito simples.”

O neurótico constrói diversos tipos de ocultamento como sintoma pois isso traz certos benefícios. O sujeito branco nega o estatuto de sujeito humanos aos negros. “Infelizmente, a gente sabe o que ele está afirmando esquecidamente: o amor da senzala só realizou o milagre da neurose brasileira, graças a essa coisa simplérrima que é o desejo. Tão simples que Freud passou a vida toda escrevendo sobre ela (talvez porque não tivesse o que fazer, né Lacan?). Definitivamente, Caio Prado Júnior “detesta” nossa gente.”

É inútil explicar a teoria de Sigmund Freud e Jacques Lacan nessas poucas linhas, mas o que proponho aqui não é finalizar a discussão, mas fomentar o desejo de compreender melhor o racismo a brasileira trazendo como base, autores “clássicos” da psicanalise e uma autora do sul global que foi feliz em compreender e teorizar, ou como se diz por aí, “sambou na cara” dos neuróticos brasileiros.

Jardel Felipe é estudante do Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades – UNILAB/CE; Bolsista do Programa de Educação Tutorial de Humanidades e Letras – UNILAB/CE; Membro Filiado do Movimento Negro Unificado – MNU/CE