A agressividade da política externa de Donald Trump tem sido o grande destaque da conjuntura mundial neste início de ano. Sua postura imperial abusada – “América em primeiro lugar” – gera apreensão e acumula tensões nas relações externas, principalmente com alguns dos seus aliados tradicionais.

Trump não se importa em expressar, sem audiência aos países afetados, intenções expansionistas, como a de anexar o Canadá, comprar a Groenlândia, ocupar o Canal do Panamá e mudar o nome do Golfo do México para Golfo da América. Para proteger a indústria dos e nos EUA, Trump está deflagrando uma guerra comercial sem precedentes ao sobretaxar produtos oriundos dos seus principais parceiros comerciais. Se efetivada, a enxurrada de taxações vai inflacionar a economia mundial, inclusive nos EUA.

Donaldo Triump e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, batem boca em conversa que deveria servir para negociar fim da guerra com a Rússia | Reprodução Redes Sociais

Mais surpreendente é a atitude diante das guerras na Ucrânia e em Gaza. Trump praticamente adotou a posição da Rússia, que acusa a Ucrânia de provocar a guerra, ao admitir a presença de forças e armamentos da Otan nas suas fronteiras. O presidente dos EUA ameaça negociar um acordo de paz diretamente com os russos, excluindo a própria Ucrânia, além dos seus aliados europeus. Trump considera que o eventual corte da ajuda militar para a Ucrânia seria suficiente para levá-la à rendição.

A proposta para Gaza é bizarra. Consiste em promover uma limpeza étnica, transferindo a população palestina para a Jordânia ou Egito e convertendo o território de Gaza numa empreendimento imobiliário. Trump publicou um vídeo, construído com inteligência artificial, que transforma os escombros de Gaza num imenso resort, onde não faltaram uma estátua de ouro dele próprio, além de imagens tomando sol na praia com o primeiro-ministro de Israel, Natanyahu, Benjamin Netanyahu.

AMEAÇAS AO BRASIL

No Brasil, setores mais à direita comemoraram o retorno de Trump à Presidência dos EUA. Bolsonaro, por exemplo, espera que ele resolva a sua situação de inelegibilidade. Há quem entregue o próprio destino no altar de Trump, fazendo vista grossa aos impactos das suas políticas sobre o Brasil, do comércio à migração.

Presidenciáveis, governadores e parlamentares da extrema direita não comentaram as condições degradantes com que foram deportados alguns dos brasileiros que estavam ilegalmente nos EUA. A condição de ilegais não justifica transportá-los em avião impróprio, algemados e acorrentados, sujeitos a agressões, sem alimentação e obrigados a usar os banheiros com portas abertas.

Brasileiros deportados dos EUA chegam ao aeroporto de Manaus | Antônio Lima / Governo do Amazonas

Eles também não comentaram a sobretaxa de 25% imposta à importação de aço e de alumínio do Brasil, um importante exportador. É previsível que essa taxação reduza o espaço da produção brasileira no mercado dos EUA, impondo a busca de outros mercados ou a redução da produção, afetando empresas e empregos no país.

O PIOR

Em vez de superar divergências políticas e se unir às demais forças em defesa do Brasil, a extrema direita usa os seus acessos a autoridades dos EUA para induzi-las a ameaçar adversários internos e a interferir em questões internas, afetando a soberania nacional. Por exemplo, tentando retaliar o ministro do STF Alexandre de Moraes, tanto pessoalmente, para impedir o seu ingresso nos EUA, quanto fragilizando as suas decisões, como no caso das redes sociais.

Michelle Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro não puderam participar da cerimônia de posse de Donald Trump | Reprodução Redes Sociais

Para tentar justificar a sua pusilanimidade, bolsonaristas construíram a fake news de que recursos destinados a projetos no Brasil pela USAID, agência oficial de cooperação dos EUA, no mandato de Joe Biden, teriam sido decisivos para a derrota de Bolsonaro nas eleições de 2022. Esses projetos, que foram suspensos com a decisão de Trump de fechar a agência, não tinham foco no processo eleitoral e não influenciaram os seus resultados, mas deputados bolsonaristas querem instalar uma CPI para apurar a falsa acusação.

É difícil dizer o que é pior: a atuação abusiva de Trump ou o oportunismo político da direita brasileira. Da posição em que está, Trump tem o poder de prejudicar muito mais países e povos. Mas, digamos, que os abusos, ainda que equivocados, relacionam-se aos interesses econômicos dos EUA, enquanto a covardia política da direita brasileira se reduz à mesquinharia e, no limite, à primeira pessoa do singular.