Deputados de MT aprovam mineração em área de Reserva Legal
Lei é de autoria do Governo de MT e está prestes a ser sancionada; Ambientalistas apontam inconstitucionalidade da matéria
Lei é de autoria do Governo de MT e está prestes a ser sancionada; Ambientalistas apontam inconstitucionalidade da matéria
A Assembleia Legislativa de Mato Grosso promove mais um retrocesso. Ao todo 19 deputados votaram a favor do projeto de lei complementar que libera a mineração em área de Reserva Legal. Em miúdos, os donos das propriedades que resolverem se dedicar ao garimpo podem então, criar uma nova área de Reserva Legal, com a mesma vegetação, em outro local, mas que seja no mesmo bioma.
Mas o analista de Políticas Climáticas do Instituto Socioambiental (ISA) em Mato Grosso, Rafael Nunes, diz que deve ser alvo de ainda mais preocupação, o fato de que o Estado não tem um controle preciso sobre o quantitativo de Reservas Legais disponíveis para fazer a compensação proposta.
“Ou seja, MT pode não ter Reservas Legais disponíveis para realocar caso o proprietário decida por executar alguma atividade minerária. Como as análises dos Cadastros Ambientais Rurais ainda avançaram pouco, não existe levantamento consistente que possa prever o impacto real da nova legislação neste contexto”.
Já do ponto de vista jurídico, a consultora jurídica do Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT), Edilene Fernandes, alerta sobre a inconstitucionalidade da proposta. A rede formada por organizações socioambientais de Mato Grosso chegou a entregar aos deputados uma nota técnica apontando todos os problemas do projeto, cujo teor foi repercutido pela Mídia Ninja em reportagem recente.
Ela criticou que mais uma vez os deputados ignoraram alertas e a falta de estudos de impacto, votando incondicionalmente com o governo, que é autor da proposta. A segunda votação sobre o PLC 64/2023 ocorreu na segunda-feira (8), com pressa habitual – quando se trata de uma mensagem do Executivo. Vale ressaltar, apenas os deputados Ludio Cabral (PT), Valdir Barranco (PT) e Wilson Santos (PSD) votaram contra o PLC. O projeto agora segue para sanção do governo.
O Observatório alertou os deputados para os riscos de contaminação de nascentes e solo, dado o uso de componentes químicos, desmatamento e inclusive, conflitos fundiários já que muitas das áreas de Reserva Legal estão próximas a terras indígenas e unidades de conservação.
Segundo Edilene, além dos impactos ambientais, “o projeto nunca poderia ter tramitado porque ele é inconstitucional. Vai contra o princípio do não-retrocesso e contra a autorização do estado de legislar sobre matéria ambiental. O Estado precisa respeitar normas gerais e o Código Florestal não permite a retirada de vegetação de área de Reserva Legal, muito menos deslocá-la para novas áreas. E pesa ainda o fato de que conflita com a Constituição sob o ponto de vista da mineração, cuja liberação é da alçada da União”, explica.
Por fim, diz ela, fere ainda a questão constitucional que versa sobre a função social da propriedade, o artigo 170. “O Código Florestal só autoriza compensar em área fora da propriedade se for para desmatamento antes de 2008 e veda que isso seja justificativa para novos desmatamentos”. A advogada destaca que a essência do projeto apresentado pelo Executivo tem a mesma essência e falhas legais que projeto apresentado anteriormente pelo deputado Carlos Avallone (PSDB), que virou lei, mas foi derrubada.
O nome do governador Mauro Mendes vem constantemente sendo vinculado à mineração, dados os negócios de família. Recentemente, o filho dele, Luis Antônio Taveira Mendes foi um dos investigados pela Operação Hermes II, que apura comércio ilegal de mercúrio para extração de ouro na Amazônia.
Áreas protegidas
O analista de Políticas Climáticas do Instituto Socioambiental (ISA) em Mato Grosso, Rafael Nunes, explica que são imensuráveis os impactos que a atividade de mineração pode gerar ao estado, e por consequência à população em tempos de crise climática.
Segundo ele, no Código Florestal as reservas legais são áreas da propriedade destinadas à conservação da biodiversidade e preservação dos recursos hídricos e por isso costumam ser as áreas mais sensíveis das propriedades. “E geralmente, se encontram posicionadas perto das Áreas de Preservação Permanente (APP). A lei passa a permitir uma atividade com impactos socioambientais conhecidos justamente nas áreas mais sensíveis dessas propriedades”.
Nunes diz que as Reservas Legais, justamente por terem caráter de conservação e uso sustentável, costumam ser posicionadas próximas às zonas de amortecimento de Unidades de Conservação e Terras Indígenas. A possibilidade de realocar a Reserva Legal aumenta a chance de que as atividades minerárias possam ser executadas perto desses espaços protegidos e de uso especial.