por Bella Gonçalves

Os vínculos de Romeu Zema com o crime organizado ficam cada vez mais claros. Os desdobramentos das operações Rejeito, Carbono Oculto e Compliance Zero têm tirado o sono de muita gente da elite — no Brasil e, agora, aqui em Minas Gerais.

E, por falar em crime organizado, na quinta-feira (04/12), o governador de Minas foi convocado para comparecer à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Zema é sócio e detém 16,41% das ações da Zema Crédito, Financiamento e Investimento S.A., empresa investigada por possíveis irregularidades na oferta de crédito consignado a aposentados e pensionistas. A financeira de Zema foi uma das 11 empresas autorizadas pelo governo Bolsonaro a operar crédito consignado para beneficiários do BPC e do Auxílio Brasil durante a pandemia.

A CPMI também aprovou a quebra dos sigilos telemático, bancário e fiscal do dono do Banco Master, Daniel Bueno Vorcaro. Ele é acusado de causar um rombo de R$ 41 bilhões em um esquema de emissão de títulos de crédito falsos, que afetou 1,6 milhão de credores. Vorcaro responde por crimes como gestão fraudulenta, gestão temerária e organização criminosa. Além do Master, ele também é dono de 20,2% da Sociedade Anônima do Futebol (SAF) do Atlético-MG por meio do Galo Forte Fundo de Investimento em Participações Multiestratégia (FIP). A Operação Carbono Oculto investiga a origem desse dinheiro — cerca de R$ 300 milhões — suspeito de conexão com o PCC.

Infelizmente, o banqueiro Vorcaro, que foi preso no dia 17 de novembro, no âmbito da Operação Compliance Zero, foi solto no dia 30 do mês passado. O habeas corpus foi concedido pela desembargadora Solange Salgado, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). Por coincidência, a desembargadora já foi defendida pelo mesmo escritório que atualmente representa o banqueiro mineiro. Ela foi acusada em 2010 de gestão fraudulenta, mas o Conselho Nacional de Justiça anulou o processo por falta de quórum qualificado.

O Ministério Público Federal (MPF) pediu que a desembargadora Solange Salgado reconsidere a decisão. Já o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que a competência sobre as investigações do Banco Master ficará a cargo da Suprema Corte e impôs sigilo ao caso. Será que isso tem a ver com o fato de a esposa do ministro, Roberta Maria Rangel, ter sido sócia do escritório Warde Advogados, de Walfrido Warde, em 2021? Atualmente, Warde é um dos defensores de Daniel Vorcaro. Ou teria a ver com os jantares que Vorcaro patrocinou nos EUA para ministros do STF?

Não podemos deixar que a Justiça siga se rendendo ao dinheiro. Precisamos seguir pressionando para que as investigações avancem, pois as revelações dessas três operações da PF desencadearam o que estamos chamando de “Operação Abafa” em Minas. Vemos um governo empenhado em esconder seus vínculos com crimes financeiros e crimes da mineração. Mas isso já não é mais possível: esses crimes viraram rotina no estado. Desde que Zema assumiu o governo, licenciamentos ambientais voltados à proteção socioambiental passaram a ser tratados como entraves para que empresários lucrem ao máximo. E o governador deu carta branca para mineradoras, como se vê no caso do desastre de Brumadinho, que matou 272 pessoas. A dúvida é: quem se beneficiou — e segue se beneficiando — dessas práticas irregulares e tão nocivas para Minas Gerais e para sua população?

Mais que amigos, empresários

E, por falar em mineração, esse é um dos ramos em que atua o megaempresário Daniel Vorcaro. Ele era dono da Itaminas e vendeu sua participação — 50% da companhia — por quase R$ 700 milhões, há cerca de 15 dias, pouco antes de ser detido. Ele comprou essas ações em 2024 e inaugurou uma planta em Sarzedo com a presença de Zema. Também compareceu ao evento o ex-secretário de Desenvolvimento do governo Zema, Fernando Passalio, que hoje é presidente da Copasa.

É importante lembrar que a Itaminas deu origem, inclusive, ao museu Inhotim, construído por Bernardo de Mello Paz com recursos provenientes de crimes ambientais, lavagem de dinheiro, evasão fiscal, trabalho infantil, grilagem e trabalho análogo à escravidão. Paz foi fundador da Itaminas e sócio, diretor ou representante de dezenas de empresas nas áreas de mineração, siderurgia e energia.

O empresário foi condenado em 2017 a nove anos e três meses de prisão por lavagem de dinheiro. Em 2018, fez um acordo com o estado de Minas Gerais para pagar uma dívida que foi reduzida de quase R$ 500 milhões para R$ 111 milhões, com obras no Inhotim — obras que permanecem nas galerias do museu até hoje.

Para retornar às atividades, em 2020, a Itaminas fechou acordo com a Vale para explorar a mina de Jangada, que fica ao lado da área onde ocorreu o rompimento da barragem de Brumadinho. A Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam), que deu aval para o acordo, é investigada pela Operação Rejeito. Fernando Baliani, diretor da Feam à época, foi quem assinou o ato — e acabou exonerado pela Justiça.

Por coincidência, o novo presidente da Feam, Edson Resende — ex-promotor do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e nomeado por Romeu Zema — prestou serviços para a Itaminas. Além disso, Cristiano Pinto Caetano da Cruz, um dos diretores da mineradora, é filiado ao Partido Novo, o partido que elegeu Zema.

Mais coincidências

Além da Itaminas, Vorcaro também controla a Tamisa (Taquaril Mineração). Ele é presidente do Banco Master, que administra a Victoria Falls, principal fundo de investimento que possui mais de 90% do capital social da Taquaril S/A, juntamente com a WJ Consultoria, empresa de propriedade de seu cunhado, Fabiano Campos Zettel. O fundo e o Banco Master funcionam no mesmo endereço.

Zettel também é pastor da Igreja Bola de Neve Church. Nas últimas eleições, ele foi o principal doador das campanhas de Bolsonaro (R$ 3 milhões) e Tarcísio de Freitas (R$ 2 milhões). Já Henrique Moura Vorcaro, pai de Daniel, doou R$ 1 milhão para a campanha de Zema.

Henrique Vorcaro também fez doações que viabilizaram a Rede Super, TV da Igreja da Lagoinha, onde Daniel Vorcaro atuou como apresentador de um programa gospel em 2008. Natália Zettel, irmã de Daniel, é pastora na Lagoinha Belvedere, bairro rico de Belo Horizonte. A família mantém amizade antiga com o pastor André Valadão. No dia 25 de novembro deste ano, foi solicitada a quebra de sigilo fiscal e bancário dele por suspeitas de irregularidades na fintech cristã que ele preside, a “Clava Forte Bank”.

Um dos serviços oferecidos pela fintech era o empréstimo consignado, descontado diretamente do banco que pagava a aposentadoria dos usuários. A empresa é investigada por suspeita de relação com o esquema de desvios de dinheiro de aposentados do INSS.

A CPMI solicitou que seja apurado se o Clava Forte Bank mantinha atuação conjunta com o Banco Master, servindo como canal de circulação dos valores desviados do INSS.

E, por falar no Banco Master, ele também administrava ações das gigantes Méliuz e Light, empresas de energia privatizadas e submetidas ao banco. Elas foram compradas e vendidas em operações envolvendo o BTG Pactual, próximo de Daniel Vorcaro — e já velho conhecido em Minas pelo lobby escancarado envolvendo parlamentares mineiros para privatizar a Copasa.

Um dos membros do Conselho Diretor da Copasa, indicado por Zema, é Guilherme Barbosa, ex-secretário de Fazenda de MG. Ele foi condenado pelo TCE do RJ por operações irregulares na Rioprevidência quando era secretário de Fazenda do RJ. É importante investigar as relações entre essa operação, o rombo da RioPrevid e a compra de ações do Banco Master.

No centro dessa rede empresarial, vale lembrar que o empresário-governador Romeu Zema tenta aprovar, a qualquer custo, a privatização da Copasa na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O objetivo? Vendê-la a preço de banana para seus aliados do mercado financeiro. Será que eles serão também seus financiadores numa campanha presidencial frágil?

Trocas de favores

São vários os casos que exemplificam essa “amizade” que faz com que Zema favoreça interesses empresariais. Um deles é o caso do tombamento da Serra do Curral, segurado ao máximo pelo governo de Minas para não prejudicar a atuação da Tamisa. Enquanto atrasava o tombamento, Zema acelerava o licenciamento da Tamisa. Por ação do meu mandato, neste ano, a operação da mineradora foi suspensa por não ter realizado a Consulta Prévia, Livre e Informada ao Quilombo Manzo.

Precisamos que avancem as investigações das operações Rejeito, Carbono Oculto e Compliance Zero — e que esses megaescândalos ganhem o destaque na imprensa que merecem, pelo enorme potencial que têm para desmontar esquemas e destituir cargos de alto escalão.

Também é nossa responsabilidade proteger as empresas públicas desses empresários envolvidos em corrupção. Foi o que fiz ao propor emenda ao projeto de lei que tenta privatizar a Copasa sem consulta popular: impedir que pessoas ou empresas investigadas por corrupção possam comprar empresas públicas.

Enquanto trabalhamos por isso, o Congresso inimigo do povo tenta atropelar tudo, blindando políticos e empresários e retirando a autonomia da Polícia Federal — justamente para que ela não consiga investigar os engravatados da Faria Lima. Sigamos atentas e firmes. Não podemos permitir que Zema entregue nosso patrimônio para beneficiar quem só pensa em lucro próprio, enquanto o povo enfrenta dificuldades.