por Pati Lima Felix

Hoje Belém amanheceu com o calor de um feitiço mal quebrado.
Trinta e poucos graus no termômetro, mas uns cinquenta na pele de quem atravessa a Blue Zone. A sensação é que alguma coisa — além do clima — está queimando por dentro.

E quem conhece a Amazônia sabe: quando o calor passa do ponto, não é só meteorologia. É aviso. É espírito inquieto. É o mundo dizendo:
“Vocês mexeram no que não deviam.”

Dentro da Blue Zone, onde supostamente circula o ar-condicionado das decisões globais, os corredores pareciam o miolo incandescente da cabeça da Curupira — aquele espírito que esquenta quando alguém tenta enganar a floresta.
E convenhamos: tem muita gente tentando. Lideranças indígenas comentam baixinho que esse calor não é normal.
Que é “outro tipo de calor.”
Como se um espírito rondasse o perímetro, irritado com tanta contradição, tanto acordo morno, tanta promessa que não refresca.

Se a floresta fala pelos sinais, hoje ela falou com a força de um sol torto.
Se a Amazônia é um ser vivo, ela está febril.
E se a Blue Zone é o lugar onde o planeta diz querer salvar o clima, então hoje ela deu um aviso claro:
não dá pra negociar com a casa em chamas; não dá pra colocar preço em um continente vivo; não dá pra ignorar o espírito que protege esse lugar.

No calor que derreteu certezas, ficou uma verdade simples: a temperatura do planeta está maior.

E hoje, em Belém, com o sol no alto, o ar pesado e a Curupira cochichando no ouvido de quem presta atenção:

“Arrumem isso.
Do contrário, a próxima cabeça a ferver será a de vocês.”