Combater a exploração dos de cima, promover justiça climática pelas mãos dos de baixo
Justiça climática virá de baixo: ruptura com o capitalismo e coragem para transformar o futuro.
por Amanda Paschoal
A COP 30 chega ao Brasil em um cenário limite das nossas possibilidades de construção de um futuro para o planeta e para as próximas gerações. Com o avanço das mudanças climáticas, combinado com um modelo de exploração predatória e o negacionismo político, nossas vidas estão em risco.
Enfrentaremos inúmeros desafios nos próximos dias, dada a urgência de uma atuação efetiva e da construção conjunta do poder público e sociedade civil. Esbarramos em incoerências como a falta de ampliação do debate de gênero dentro dos espaços da conferência, a necessidade de financiamento climático que não prejudique ou aumente as dívidas de países subdesenvolvidos e a inaceitável autorização para exploração de petróleo na foz do Amazonas, dentre tantos outros problemas que precisam ser encarados com responsabilidade.
Ações concretas de mitigação, adaptação, resiliência e perdas e danos têm sido enfraquecidas com o aumento do negacionismo climático, berço de outras ramificações de negacionismo, colocando no poder figuras da extrema direita que são os piores inimigos do conhecimento científico. Isso nos levou a um cenário catastrófico e, se não agirmos imediatamente, irreversível.
Do local ao global, as contradições se repetem. A prefeitura de São Paulo, meu campo de batalha pessoal enquanto parlamentar de esquerda, é um grande exemplo disso. Quem vive na cidade, sabe muito bem que as tragédias climáticas são marcas da gestão Nunes. É a elite que diz salvar o planeta, mas que é inimiga da vida!
Aqui, pessoas perdem bens de uma vida inteira, ou até a própria vida, por conta de enchentes e deslizamentos todos os anos, fato que provocou até uma decisão recente da Justiça paulista reconhecendo a omissão da Prefeitura no enfrentamento dessa realidade.
Também aqui, há dezenas de casos de pessoas em situação de rua que morreram desamparadas e abandonadas por conta de ondas de calor e de frio, sem que Nunes tivesse conseguido sequer apresentar um monitoramento desses óbitos, tão cobrado pela sociedade civil. A verdade é que São Paulo está à beira do colapso.
Agora, durante a COP, Nunes tenta vender a cidade como um paraíso verde. O Prefeito se presta a bater boca com ativistas que protestavam em seu evento de “cidade vitrine da arborização”, enquanto sua gestão autorizava a derrubada de um bosque inteiro no bairro da Lapa. Típico ensaio do negacionismo da extrema direita: vender uma vitrine de árvores em áreas privilegiadas, enquanto as periferias e bairros centrais populares são verdadeiras ilhas de calor e canteiros para construtoras.
É essa armadilha que as lideranças reunidas na COP vão precisar enfrentar. Precisam decidir se querem de fato transformação, ou se esse espaço seguirá sendo um espetáculo armado para limpar a ficha dos grandes destruidores do meio ambiente. Se irão ceder ao negacionismo da extrema-direita e à captura da “sustentabilidade” pelos mais ricos que não tem nenhum compromisso real com o planeta.
A urgência de um novo mundo!
Só é possível salvar o planeta com o fim da exploração. Não existe nenhuma alternativa que não passe pela ruptura com o capitalismo, esse sistema cujo princípio é destruir. Mais do que nunca, precisamos construir novas formas de nos relacionarmos com o meio ambiente, nos entendendo como parte deste meio.
E essa ruptura exige políticas públicas reais, conectadas com a realidade do povo. Envolve a reparação do meio ambiente e para as comunidades tradicionais, para as populações atingidas por enchentes e deslizamentos, para os agricultores familiares que enfrentam a seca, a valorização de catadoras e catadores e cooperativas de reciclagem.
Também envolve a garantia de justiça para as periferias, para a população negra, para as mulheres, grupos atingidos diretamente pelos efeitos das mudanças climáticas.
Aqui em São Paulo tenho feito a minha parte. Além de cobrar sistematicamente Tarcísio e Nunes, apresentei projetos como a Política Municipal de Combate ao Racismo Climático, a Política Municipal de Adaptação Climática nas Escolas e uma agenda transversal no orçamento do município voltada à adaptação e mitigação climáticas.
Junto da deputada federal Erika Hilton, também ajudei a construir projetos como o auxílio econômico para refugiados climáticos e a adaptação climática para criação de cidades resilientes.
O projeto político que defendo é a expressão de uma trajetória de vida marcada pela transfobia, pelo ódio, pela exclusão. Eu conheço e vivi a realidade de quem é deixada à própria sorte pelo Estado. Mas também conheço e vivo a construção política que nós, os de baixo, fazemos dia após dia. Uma construção marcada pela convicção inabalável de que transformar é preciso. De que não há garantia de futuro se não ousarmos derrubar as estruturas que nos jogam às margens.
E transformar exige coragem. Exige que assumamos a responsabilidade de imaginarmos novos mundos, como nos convocou Ailton Krenak. Mundos possíveis. Mundos com justiça social e climática. Mundos que sejam construídos pelas mãos do próprio povo. Pelas mãos de nós travestis, mulheres, negras e negros, LGBTQIAPN+, movimentos sociais, indígenas e quilombolas.
Será que os governos, empresas e organizações reunidas na COP terão essa coragem? Se a COP será esse espaço transformador, não sei. O que sei é que o caminho passa por nós, aquelas e aqueles que vivem a necessidade de transformar o inescapável em outro futuro possível.