O funk e a falta de empatia com as minas
Tivemos uma brasileira no VMA, funkeira de Honório Gurgel, que há pelo menos uma década vem protagonizando as redes e as paradas de sucesso com seus hits
Ontem ocorreu o VMA da MTV, um dos maiores prêmios musicais depois do Grammy. Tivemos uma brasileira, funkeira de Honório Gurgel (periferia do Rio de Janeiro), que há pelo menos uma década vem protagonizando as redes e as paradas de sucesso com seus hits, se empenhando, estudando, construindo pontes e ecoando pelos quatro cantos do mundo e por onde passa para falar da importância do movimento que a tirou das margens da sociedade e a impulsionou para os palcos dos grandes festivais globais.
O ano é 2023, e o discurso interno do funk é que ainda somos criticados, criminalizados e perseguidos, como se ainda estivéssemos na década de 90 e começo dos anos 2000 (muitos aqui nem têm ideia do que foi esse período para o funk). Enquanto continuarmos reproduzindo esse discurso criado pela mídia hegemônica recalcada da década de 90 para nos apagar, não conseguiremos nos tornar a maior expressão cultural periférica do planeta. É óbvio que a branquitude ainda tenta nos exterminar e inviabilizar o protagonismo que estamos alcançando dentro e fora do Brasil, mas não podemos nos cancelar, caramba! O negócio é louco; hoje é a grande mídia que “tenta falar bem do funk”, enquanto as grandes páginas de conteúdo para funkeiros(as) se tornaram fábricas de likes, propaganda de dentistas, fofocas de relacionamentos, valores dos carros que cada artista compra e depois não consegue pagar, casas de apostas ou o valor dos correntões de ouro maciço de 1 quilo no pescoço, para fazer cosplay de rap americano.
Galera, fiquem atentos ao que está acontecendo: a Anitta ganhou um prêmio extremamente importante como o melhor videoclipe latino, e não vi nenhum post parabenizando a importância dela nesse evento que mais uma vez ajudou a promover o funk para o mundo. Sem contar que a cantora colombiana Karol G cantou um remix da música “Tá OK” de Kevin o Chris e Dennis DJ, que recentemente foi número 1 no Spotify, sem mencionar a batida da música “Bongos” da Cardi B e Megan Thee Stallion. Ao contrário do jazz, blues, rock e samba, que nasceram pretos, foram apropriados e apagados, eles não tinham a fábrica de likes que nós temos hoje e que tem um alcance incrível.
Podemos, sim, ser a maior plataforma cultural do planeta, começando pela união no funk, organizando-nos politicamente e culturalmente, criando mais oportunidades profissionais dentro da indústria musical, pensando em estratégias de mudança cultural e comportamental em nossos conteúdos, parando de expor negativamente nossas pessoas, e buscando dialogar com o poder público para criar políticas públicas eficazes para as periferias. Podemos seguir o modelo de negócios que o K-Pop vem adotando desde a década de 90, como estratégia de soft power global.
À Anitta, Gabriel do Borel e toda a equipe, meus parabéns! Vocês são incríveis, mulher, siga seu instinto feminino que tem dado muito certo. A Ricardo Souza, João Wainer e toda a equipe também, meus parabéns, eu não esperava menos de vocês. Vocês são incríveis, família! Viva o funk. Viva a cultura brasileira.