Por Randolfe Rodrigues

A incapacidade do governo Bolsonaro de reaquecer a economia ganhou novos capítulos nesta semana após as irresponsáveis declarações do ministro Paulo Guedes ameaçando a normalidade democrática com a reedição do AI-5. A exemplo de outros integrantes do governo, Guedes flerta com o autoritarismo quando confrontado com os péssimos resultados apresentados pela gestão Bolsonaro. A covardia não passou despercebida e foi repudiada pelo mercado.

Logo após a publicação das declarações o dólar começou a operar em forte alta, com cotação batendo recordes e fechando o dia em R$ 4,24. A tendência de alta segue e é acompanhada por outras moedas estrangeiras, como o Euro e a Libra. Ao que tudo indica, o flerte do governo Bolsonaro com o autoritarismo e as bravatas de seus integrantes são mal vistas pelo mercado e por investidores estrangeiros, receosos do futuro do Brasil enquanto nação.

O ministro Paulo Guedes ainda falou para a população brasileira se acostumar com o dólar alto, em gritante contraste com as promessas de campanha de Bolsonaro. Para completar, afirmou que o dólar a R$ 5 é bom para o Tesouro Nacional na venda das nossas reservas cambiais. Só esqueceu que uma economia dependente de insumos importados como a brasileira precisa dessas reservas para sua estabilidade e fluxo de investimentos.

Nossa indústria, por exemplo, utiliza muitos insumos, especialmente os tecnológicos, importados que são comprados em dólar no mercado internacional. A supervalorização da moeda impacta diretamente no endividamento dessas empresas visto que os contratos são negociados em dólar. Dólar mais caro significa mais gastos em Reais pela indústria, diminuindo sua capacidade de investimento e contratação. Isso ajuda a explicar o persistente desemprego no Brasil.

O governo se defende dizendo que os juros estão baixos e a inflação está dentro da meta. Isso é óbvio em um cenário de recessão econômica como o nosso. A inflação e juros estão contidos pois não existe demanda de consumo e contratação de crédito devido à perda do poder aquisitivo da classe da trabalhadora e estagnação da sua renda. O cenário fica mais preocupante quando pensamos na saída de moeda estrangeira do País.

A fuga de capitais acumulada no primeiro ano do governo Bolsonaro ultrapassa os US$ 20 bilhões. Este número já é maior do que o montante que saiu do Brasil em 2018. E deve aumentar em dezembro em face da remessa de lucros de empresas estrangeiras que operam no país e o reposicionamento global de multinacionais para o ano de 2020. Com isso, a tendência é que os juros e a inflação subam em um curto prazo, castigando ainda mais a classe trabalhadora.

A crise argentina começou assim. O governo não tinha reservas cambias quando o capital estrangeiro foi embora das bolsas do país. Com sua indústria e sociedade dependentes de insumos e bens de consumo importados não demorou para que o endividamento das empresas e famílias atingisse patamares impagáveis, iniciando um movimento de insolvência empresarial e declínio da qualidade de vida do povo argentino. Não queremos isso para o Brasil.

De qualquer forma, entendemos os delírios autoritários de Paulo Guedes. Ele trabalhou para o ditador Augusto Pinochet no Chile, sendo um dos responsáveis pelas políticas econômicas implementadas na mais sangrenta ditadura sul-americana. O resultado vemos hoje nas ruas do país, com a população manifestando há mais de um mês por reformas que tirem o povo chileno da miséria. Não permitiremos que repitam aqui a tragédia que assolam nossos irmãos.

Randolfe Rodrigues, 45, é senador da República (Rede/AP). É professor, graduado em história, bacharel em Direito e mestre em políticas públicas.