Neste final de semana, segundo denúncia repercutida por movimentos sociais, uma operação da polícia do Pará chamada “Fortis Status” no Acampamento/Associação Terra Prometida, localizado na fazenda Mutamba, nas proximidades de Marabá, no Pará, terminou com muita violência e morte de trabalhadores.

Conforme relatos obtidos, os trabalhadores declaram que os policiais chegaram de madrugada, no escuro e atirando, fazendo vítimas, inclusive fatais.

“Adão Rodrigues de Sousa, 53 anos, casado, pai de cinco filhos, e Edson Silva e Silva foram assassinados na madrugada da última sexta-feira, por policiais civis da Delegacia de Conflitos Agrários de Marabá, chefiado pelo delegado titular, Antônio Mororó”, diz a nota publicada nesta segunda feira (14) e assinada pelo MST, FETAGRI, FETRAF, CPT, IZM, SDDH e Coletivo Veredas.

Ainda segundo a denúncia, houve torturas, violações aos direitos humanos e abuso de poder.

A Polícia Civil, por meio da Delegacia Especializada em Conflitos Agrários de Marabá (Deca), disse, em nota, que duas pessoas morreram após “entrarem em confronto com a polícia”.

“No desespero e na escuridão, cada um tentou escapar como pôde dos tiros”, diz a nota dos movimentos sociais. E complementa: “não houve qualquer chance de se defenderem, mesmo que tivessem um arsenal de armas. Só deu tempo de correr para escapar da morte”.

A Defensoria

A Defensoria Pública do Estado do Pará colheu depoimentos dos envolvidos no conflito e, segundo os trabalhadores (as) rurais, o medo ainda reina no território.

Um dos denunciantes disse à Defensoria que se mantém escondido, “pois o que lhe foi dito é que a ordem policial seria para lhe encontrar e lhe executar imediatamente”.

Para a Defensoria, “as denúncias são demasiadamente graves para serem desconsideradas. Podemos estar diante de uma nova chacina”.

Motivações pessoais

A nota dos movimentos sociais, além de detalhar a trágica noite, também denuncia as possíveis motivações que levaram o delegado responsável, Antônio Mororó, a comandar tamanha violência.

“O discurso divulgado pelo delegado Mororó e incorporado pelo Secretário de Segurança Pública do Estado é que se tratava de uma organização criminosa fortemente armada, envolvida em venda ilegal de madeira, roubo de gado e outros crimes. O resultado da operação, que envolveu dezenas de policiais, várias viaturas, dois helicópteros, foi a apreensão apenas de 7 espingardas cartucheiras e algumas munições. Nenhuma arma pesada, nenhuma motosserra, nenhum caminhão de madeira, nenhum gado roubado, nada mais. Dos quatro trabalhadores presos, nenhum deles tinha mandado de prisão e só um tinha condenação pela justiça. Os dois mortos também não tinham prisões decretadas e nem passagem pela polícia. Ou seja, a operação, nessa perspectiva, foi uma farsa”, denunciam em nota.

Para além disso, os movimentos sociais expõem a forte ligação entre o delegado e os fazendeiros latifundiários, que, segundo as denúncias, priorizam pedidos pessoais vindos deste grupo do que denúncias de crimes contra trabalhadores.

Conforme dados da CPT, nos últimos 10 anos, 15 assassinatos ocorreram na área de atribuição da Deca de Marabá, sendo que a autoria das mortes não foi esclarecida.

Sobre a fazenda

“A fazenda Mutamba, de propriedade da família Mutran, atualmente é ocupada por três grupos de famílias sem-terra, com organização independente”, informou a nota dos movimentos sociais.

O imóvel rural é uma das áreas da família, que acumula histórico de conflitos contra posseiros e até casos de trabalho escravo. Em 2002, 25 pessoas foram libertadas da fazenda Mutamba. Em 2004, uma empresa pertencente à família foi autuada mais de uma vez na “lista suja” do trabalho escravo, tendo que pagar R$ 1,3 milhão por dano moral coletivo ao Fundo de Amparo ao Trabalhador – à época foi a maior indenização já paga no Brasil por caso de trabalho análogo à escravidão.

A propriedade se assenta sobre um antigo castanhal que foi desmatado para formação de pastagem. Há ainda suspeita de terra pública em parte do complexo.

As graves denúncias feitas pelos trabalhadores e colhidas pelos movimentos sociais foram encaminhadas ao Governador do Estado, ao Procurador Geral do Ministério Público, aos Ministros da Justiça e da Reforma Agrária, com uma pergunta final: “O assassinato dos dois trabalhadores, as tentativas de homicídios e as torturas serão investigadas ou vão ficar impunes?”.