Foram 14 anos para provar que era inocente de um pesadelo que começou em abril de 2008. Sidinei foi preso injustamente através de uma acusação que se baseava em um reconhecimento, sem nenhuma prova

Vigilante do TJ respondeu por 14 anos por um crime que não cometeu. Foto: Reprodução/TV Globo

Sidinei de Souza Santos Júnior é negro, pobre, trabalhador e mora na periferia. Assim como outros homens com essas características, ele foi preso injustamente através de uma acusação que se baseava em um reconhecimento, sem nenhuma outra prova.

Ele foi condenado, no fim de 2021, a 6 anos e meio de prisão por assalto à mão armada. Sidnei chegou a ficar seis meses no Complexo de Bangu (RJ), antes de ser liberado em junho por uma revisão criminal que constatou sua inocência. O vigilante que trabalhava no Tribunal de Justiça respondeu durante 13 anos pelo caso devido ao reconhecimento fotográfico realizado por um casal. A mulher indicou o vigilante como suspeito quatro meses depois do crime em que o carro deles havia sido roubado.

Sidinei agora está livre, mas vai carregar por toda a vida o trauma de ficar preso no Complexo de Bangu por seis meses. Ele pretende pedir uma indenização ao estado pelo tempo perdido e quer transformar a dor em luta.

“Meu nome ainda tá sujo, eu tenho medo de sair na rua, pedir emprego e as pessoas verem que eu já fui preso, ex-presidiário, até provar que eu sou inocente, é difícil”, disse em entrevista ao g1.

Injustiça

Os recursos da defesa foram negados, até que a Defensoria Pública entrou com um pedido de revisão criminal. No relatório da revisão, o desembargador Marcelo Castro Anátocles da Silva Ferreira considerou que uma condenação tem que ser “lastreada de certeza sobre autoria e a materialidade do crime.” E que as provas apresentadas no processo demonstram que não existem condições seguras para a condenação.

Segundo o relator, o Ministério Público não cumpriu o dever de comprovar a autoria do crime. O desembargador citou ainda elementos que comprovam o álibi de Sidinei. Ele cita na decisão que o crime ocorreu no dia 11 de abril de 2008, uma sexta-feira, às 7h45, em São Gonçalo. E que a folha de ponto de Sidinei comprova que ele chegou no trabalho, no TJ, no Centro do Rio, às 9h.

Há ainda a confirmação da Fetranspor de que Sidinei embarcou no trem da Supervia na estação de Queimados, onde morava, às 6h59, o que ressalta o relator, “torna impraticável” que ele estivesse em São Gonçalo às 7h45. A distância entre as duas cidades é de aproximadamente 70 km.

Por unanimidade, o Terceiro Grupo de Câmaras Criminais anulou a pena e Sidinei foi solto.

“Cara, foi uma emoção assim. Eu me senti… eu era um passarinho na gaiola. Era um passarinho que tava ali preso e não conseguia sair. E quando saiu, não sabia pra onde ir. ‘O que ele faria?’ Eu não sabia que dia que era, se tava chovendo, se tava sol, não sei, eu só queria ver meus filhos, minha família.”

“Não bastasse toda a situação que ele teve que enfrentar perante a sociedade, a família, as dificuldades, durante esses quase 6 meses em que ele ficou recluso, ao voltar para o local de trabalho ele foi demitido por abandono de emprego”, contou o advogado de Sidinei, Pedro Gonçalves Júnior.

“O caso do Sidinei é mais uma hipótese de erro em reconhecimento, mais uma hipótese de condenação injusta, mais uma hipótese que merece a reflexão sobre o prisma da seletividade penal. Ou seja, sobre o viés racial”, fala Lúcia Helena Oliveira, coordenadora de Defesa Criminal da Defensoria do Rio.

Com informações do g1