Vereador de fala racista pode ser condenado a pagar R$ 1,5 milhão para a sociedade brasileira
Ministério Público Federal, do RS, e também ONGs pedem condenação de Sandro Fantinel (sem partido) por danos morais coletivos
Ministério Público Federal, do Rio Grande do Sul e também ONGs pedem condenação de Sandro Fantinel (sem partido) por danos morais coletivos
Por Cley Medeiros
Sandro Fantinel (agora sem partido depois de ser expulso do Patriota) pode ser condenado pela Justiça a indenizar a sociedade brasileira em R$ 1,5 milhão. O Ministério Público Federal e o Ministério Público do Rio Grande do Sul ofereceram duas denúncias para a Justiça com pedido de danos morais coletivos que, somados, chegam a R$ 550 mil. Já uma ação da Educafro Brasil (Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes) e o Centro Santo Dias de Direitos Humanos, de São Paulo; a Iara (Instituto de Advocacia Racial e Ambiental), do Rio de Janeiro; e a Associação Cultural Sawabona Shikoba, de Porto Alegre, pedem que o vereador seja condenado a pagar R$ 1 milhão.
Fantinel foi responsável por ofensas racistas e xenófobas contra trabalhadores encontrados em condições semelhantes à escravidão em vinícolas da Salton e Aurora, em Bento Gonçalves, Rio Grande do Sul.
Ao discursar sobre o resgate dos trabalhadores – na sua maioria baianos – ocorrido no último dia 22 de fevereiro, Fantinel disse que empresas e produtores rurais deveriam “contratar funcionários limpos” e não “aquela gente lá de cima”.
A ação do MPF é para que o vereador seja condenado a pagar indenização de, no mínimo, R$ 250 mil e que esse valor seja destinado a projetos e campanhas contra o trabalho escravo e a xenofobia ou a iniciativas em Caxias do Sul que promovam a cultura baiana. Para o Ministério Público do Rio Grande do Sul a indenização é de R$ 300 mil.
O advogado Leandro da Cruz Soares, que representa a Educafro e é autor da ação que pede R$ 1 milhão contra Fantinel, reforça os argumentos apontados na ação civil e afirma que a declaração contra os trabalhadores resgatados em situação análoga à escravidão em Bento Gonçalves é “desumana”, além de “absurdamente ofensiva”, em entrevista para a Gaúcha Zero Hora.
— Não há como não se comover com essa situação (dos trabalhadores resgatados), e não há como esse vereador sair ileso desse discurso. É necessário que o Poder Judiciário dê um viés direcionado a uma condenação. Infelizmente, falas como essas são corriqueiras. São falas diárias, não são um caso isolado. Isso demonstra a postura racista diante dos trabalhadores nordestinos e o total descaso às pessoas que estavam trabalhando aqui no RS, que deixaram suas famílias para tentar a vida em outro Estado. É necessária uma aplicação ao vereador, é direito da sociedade brasileira de não ser afrontada por nenhum tipo de aporofobia (aversão aos pobres), nem mesmo às questões raciais — declara Leandro.
Agressões em série
O discurso de Fantinel foi classificado pelo MPF como odioso, preconceituoso e de caráter xenofóbico e discriminatório em relação à origem geográfica, em especial a população que nasceu ou vive no estado da Bahia.
O procurador da República Fabiano de Moraes destaca, na ação civil pública, que o vereador colocou as vítimas como culpadas da situação em que se encontravam.
Além de agredir os escravizados, o réu menosprezou e discriminou o povo e a cultura da Bahia ao dar a entender que os baianos não são trabalhadores corretos, limpos ou organizados, frisa o MPF, relatando outros trechos xenofóbicos do discurso.
Ataques também à União
Para o MPF, o vereador também atacou os órgãos de fiscalização da União ao insinuar que as condições em que os trabalhadores foram encontrados são “normais” na Serra Gaúcha e que eles queriam trabalhar 15 dias e ganhar por 60.
O MPF aponta que essa insinuação induz ao entendimento de que o trabalho de fiscalização foi ilegal e ignora o fato de que todas as informações trazidas a público relatam que as pessoas eram mantidas no local contra a vontade, submetidas a jornadas exaustivas, com alimentação inadequada para consumo e que inclusive há relatos de tortura com armas de choque e spray de pimenta.