Vale do Jequitinhonha é região que mais ‘ferveu’ em 2023, reflexo das mudanças climáticas
A situação se agrava ainda mais para aqueles que trabalham ao ar livre, como os agricultores locais
Um levantamento inédito do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) revelou a situação alarmante enfrentada pelos moradores do Vale do Jequitinhonha, entre os estados de Minas Gerais e Bahia. Com 18 das 20 cidades do país que mais aqueceram em 2023, a região tem sido castigada por temperaturas extremas, conforme apontado pelo estudo obtido com exclusividade pelo O Globo.
Para os moradores, o aumento das temperaturas tem sido um desafio constante. O calor intenso tem levado um número crescente de pacientes a procurarem atendimento médico, especialmente idosos, que sofrem com a desidratação e desconfortos generalizados. “O termômetro sobe e já sabemos que o povo virá”, lamenta a enfermeira Soraya, em entrevista ao O Globo.
A falta de infraestrutura para lidar com as altas temperaturas é um problema compartilhado por muitos na região que possui um dos menores índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil.
Apenas uma pequena parcela dos domicílios possui ar-condicionado, e espaços públicos refrigerados são escassos. Essa realidade afeta não apenas o conforto diário dos moradores, mas também atividades essenciais, como sessões no fórum local, onde a falta de refrigeração torna-se particularmente desafiadora para profissionais.
A situação se agrava ainda mais para aqueles que trabalham ao ar livre, como os agricultores locais. O calor extremo tem causado danos significativos às plantações e exigido adaptações drásticas, como a mudança de horários de trabalho para evitar as horas mais quentes do dia.
Na Bahia…
No cenário já árido das terras baianas, o município de Urandi, localizado no sudoeste do estado, foi alçado ao epicentro de uma preocupante onda de calor. Com pouco mais de 15 mil habitantes, segundo o último censo do IBGE, a comunidade urandiense enfrentou, ao longo do ano passado, um acentuado aumento de temperatura que desafiou as condições já desafiadoras do clima regional.
Para compreender a magnitude desse fenômeno e identificar os locais do Brasil mais afetados pelo calor, a cientista Ana Paula Cunha e sua equipe do Cemaden conduziram uma análise minuciosa dos dados meteorológicos. Eles examinaram registros de estações oficiais e de satélite de todos os 5.570 municípios brasileiros ao longo dos 12 meses de 2023, comparando cada mês com a climatologia histórica correspondente.
Os resultados revelaram que novembro e dezembro foram os meses mais quentes em geral. No entanto, menos da metade dos municípios brasileiros possui estações meteorológicas, o que exigiu uma análise combinada para identificar os locais mais impactados pelo calor.
O calor extremo registrado na região do Jequitinhonha não surpreendeu os pesquisadores, conforme afirmado por Ana Paula Cunha e outros cientistas do Cemaden. Trabalhos anteriores já haviam apontado essa área como uma das mais impactadas pelo aumento de temperatura nas últimas seis décadas no país, refletindo um processo de savanização nesta região.