Por Lucas Sette e Anna Luiza Gonçalves, para Cobertura Colaborativa Paris 2024

Marcar uma geração não é um feito fácil de se atingir. Agora ser lembrada por três diferentes ciclos de jogadoras? É algo que só atletas extraordinárias conseguem, e uma delas é Thaísa, bicampeã olímpica pela seleção brasileira de vôlei em 2008 e 2012, e bronze em 2024, além de títulos de Grand Prix e um Pan-Americano. Não tem como falar da geração de Jaqueline, Fofão, Fabi e Sheilla sem citar uma Thaísa; também ao falar de, Natália e Fernanda Garay, temos que lembrar da importância da nossa central; e como pensar em Gabi, Macris e Carol sem relacionar com a liderança da “Mami”? É, realmente, nossa central Thaísa deu muitas alegrias aos torcedores brasileiros em vários momentos diferentes.

Foram 18 anos servindo a Seleção Principal do Brasil no vôlei feminino, que tiveram fim nessa Olimpíada de Paris 2024. Subir ao pódio foi a maneira mais extraordinária de finalizar seu legado pela seleção brasileira, marcando o nome de Thaísa Daher de Menezes em um patamar da história do vôlei mundial que poucas pessoas atingiram e vão atingir.

“Acabou. Quando eu abracei meu marido, eu falei isso. Eu falei ‘acabou’. É o ‘acabou’ de encerrou o ciclo. Foi uma vida dentro da seleção, tanto de base quanto adulta. Só a gente que está aqui sabe tudo que a gente passa, tudo que a gente tem que superar e aguentar de estar aqui. Não é fácil. Mas é muito amor pelo que a gente faz. E acabou”, disse Thaísa, emocionada, em entrevista aos canais Globo.

O início de uma vitoriosa jornada

Após ganhar títulos mundiais em 2003 e 2005 pelas categorias de base, Thaísa ganhou a atenção de Zé Roberto Guimarães, técnico da seleção principal do Brasil. Com 19 anos foi integrada ao time adulto e no mesmo ano fez parte do título da Copa Pan-Americana, em Porto Rico. 

Em 2007, com o time em meio a uma transição de gerações, já foi ganhando mais espaço nas rotações do treinador e na briga pela posição, que contava com nomes como Walewska e Fabiana, e como titular, já foi ajudando a conduzir o time até as medalhas de prata na Copa do Mundo e do Pan-Americano do Rio de Janeiro.

2008-12 o bicampeonato olímpico

Foto: Divulgação/FIVB

Foi no ano olímpico de Pequim que a carreira da central fez uma curva ascendente que acontece com poucos atletas. Estreando na China em Olimpíadas, Thaísa pouco participou dos jogos, já que ainda era uma promessa para o futuro. Mesmo entrando em poucos momentos de alguns jogos, foi importante taticamente e terminou os jogos com 15 pontos totais. Um pouco discreta nas partidas, porém sua presença já era sentida e ali ela ganhou sua primeira e tão sonhada medalha de Ouro, e em cima das eternas rivais, as americanas.

Quatro anos depois, Thaísa voltou a brilhar em quadra, nos Jogos Olímpicos de Londres. A campanha do Brasil foi mais desafiadora, especialmente nas quartas de final contra a Rússia, mas a seleção venceu um jogo épico por 3 a 2, com Thaísa desempenhando um papel crucial nos momentos decisivos. Na final, o Brasil enfrentou novamente os Estados Unidos e venceu por 3 a 1, sendo novamente destaque como uma das maiores pontuadoras do jogo, sendo a sétima maior pontuadora do torneio com 110 pontos e consolidando-se como uma das melhores centrais do mundo.

Nesse período, a jogadora brasileira ainda colecionou duas medalhas de ouro em Grand Prix (2008 e 2009) e três pratas (2010, 11 e 12); além de prata no Campeonato Mundial de 2010 e na Copa dos Campeões em 2009; e um Ouro no Pan-Americano de Guadalajara em 2011. E colecionou prêmios individuais: Melhor Bloqueadora da segunda fase nos Grand Prix de 2008 e 2010, além do mesmo prêmio no torneio inteiro de 2012; e de Melhor Sacadora no Grand Prix de 2011.

Auge, decepção em 2016 e lesão preocupante

Durante o ciclo da Olimpíada de 2016, realizada no Rio de Janeiro, Thaísa só evoluía e chegava ao ápice da carreira. Os Jogos Olímpicos foram especiais para a atleta e para a Seleção Brasileira, pois representavam a chance de conquistar o terceiro ouro consecutivo, e ainda mais, em casa, diante de sua torcida. A seleção chegou aos Jogos do Rio como uma das favoritas ao ouro, e a central já consolidada como uma das líderes da equipe, desempenhou um papel crucial na preparação do time. Ela era uma das referências tanto no ataque quanto no bloqueio, e com toda sua experiência era vista como fundamental para guiar a equipe a mais um título. 

O Brasil teve um desempenho excelente na fase de grupos, vencendo todas as partidas sem perder um único set. E Thaísa mais uma vez seria uma das jogadoras mais regulares da equipe. A dupla de centrais formada por Thaísa e Fabiana Claudino era considerada uma das mais fortes do mundo, e elas dominaram as redes com bloqueios e ataques precisos. No entanto, nas quartas de final, o Brasil enfrentou a seleção da China, que estava em ascensão sob o comando da técnica Lang Ping. Em uma partida extremamente disputada, a nossa seleção acabou sendo derrotada por 3 a 2, ficando em 8º lugar.

Mesmo com a decepção por não conseguir conquistar o terceiro ouro, foi amplamente respeitada. 

Ela continuou sendo vista como uma das melhores centrais do mundo, e sua capacidade de liderança e resiliência foram elogiadas. Usando essa experiência como uma lição para vencer adversidades, o que a ajudou nos anos seguintes em sua carreira, tanto nas competições de clubes quanto em seu retorno à seleção brasileira.

Ainda conquistou bronze no Campeonato Mundial de 2014 e Ouro nos Grand Prix de 2013, 2014 e 2016. Foi MVP e Melhor Central do GP 2013; Melhor Central e Bloqueadora do Mundial 2014; e Melhor Central no GP 2016.

Foto: Divulgação/FIVB

No dia 04 de abril de 2017, a central teve uma grave lesão atuando pelo Eczacibasi Vitra, da Turquia, em uma partida contra o Fenerbahçe, com ruptura do ligamento lateral e de parte do menisco – chegou a atuar no sacrifício antes dos exames apontarem a gravidade. Depois também precisou passar por um transplante de cartilagem devido ao desgaste no fêmur e na tíbia e ficou 10 meses em recuperação antes de voltar às quadras.

“Quanto mais falavam que eu estava manca, quanto mais falavam que eu estava lenta e que eu não ia mais voltar a ser como era, mais eu me apegava e pensava: “Vou mostrar que é o contrário e vou provar que eu posso.” disse Thaísa, para entrevista ao Esporte Espetacular.

Nos limites de tempo para a Olimpíada de Tóquio, que seria em 2020, Thaísa pediu dispensa da seleção em 2019, alegando desgaste físico, ainda consequência da contusão de 2017, e a vontade de focar na carreira de clubes. A comissão técnica tinha esperanças que ela voltasse a tempo de disputar os Jogos Olímpicos, adiados para 2021 por conta da pandemia da COVID-19. Porém, a atleta brasileira abriu mão da convocação em prol da longevidade de sua estrada como atleta e de uma recuperação mais precisa. 

O último ciclo e um desfecho triunfal

Sua volta para vestir a camisa amarela aconteceria apenas em 2023, às vésperas de mais uma Olimpíada, desta vez em Paris. Durante a Liga das Nações de 2023 e 2024, ela iniciou seu papel de preparar as já veteranas para uma liderança maior no time e as mais jovens para assumir o posto de titulares no futuro. Mas a importância da “Mami” nesse time ainda seria muito maior que isso.

Sendo um pilar da posição desde que chegou bem novinha na Seleção Brasileira, Thaísa Daher sempre foi aquela que protegia a porta de entrada contra os ataques adversários, para que suas companheiras pudessem se sentir bem ao desempenhar outros papéis. E não foi diferente em Paris. Titular em todos os jogos, foi essencial para a boa campanha do time brasileiro, que só parou na semifinal contra os Estados Unidos, adversárias que a central sempre encarou no seu caminho e as apelidou “carinhosamente” de “chicleteiras”. Mas essa queda não impediu dela auxiliar o conjunto para se levantar de novo e conquistar o bronze, sua terceira medalha olímpica, em cima da Turquia.

“Eu agradeci muito as meninas, eu queria muito trazer o ouro para elas, mas esse bronze vai valer como ouro, eu nunca vi um grupo tão dedicado, eu senti uma gama diferente desse grupo. Eu falei Diana toma que é seu o bastão, eu tenho muito orgulho de ter feito parte disso, mas dói, né…(a despedida)”, Diz Thaísa, em entrevista para Globo 

Foto: Reprodução | Globo

Thaísa Daher deixou um legado no vôlei brasileiro e mundial, que será lembrado para sempre. Reconhecida por sua habilidade técnica, força e liderança dentro e fora de quadra, ela é considerada uma das melhores centrais da história do esporte. Suas conquistas, especialmente as medalhas de Ouro olímpicas, são uma prova de sua importância para o vôlei brasileiro. 

Ela encerra sua jornada pela Seleção Brasileira de vôlei feminino, aos 37 anos, mas continua a inspirar novas gerações de jogadoras com sua carreira de sucesso e de barreiras derrubadas “na força do ódio!”.

Foto: COB/Alexandre Loureiro