Taças do Brasil: um inédito tricampeonato em meio à repressão
Considerada a melhor seleção de todos os tempos, o time brasileiro foi a primeira equipe a se tornar tricampeã da Copa do Mundo. Confira a terceira parte do especial “Taças do Brasil”
Por Mariana Walsh e Rafaella Azevedo
No dia 21 de junho de 1970 a seleção brasileira levantou, pela terceira vez, a taça mais desejada do futebol. O Brasil se tornava o primeiro tricampeão da Copa do Mundo. Com uma campanha perfeita, o escrete canarinho teve um aproveitamento de 100% – tendo vencido todos os seis jogos que disputou, marcando 19 gols e sofrendo apenas 7. Na final, o time comandado por Mário Jorge Lobo Zagallo, que contava com Pelé e Jairzinho, goleou a Itália por 4 a 1 no estádio Azteca, na Cidade do México.
Para muitos, essa foi a melhor seleção de todos os tempos. Era um time dos sonhos, que levou o povo brasileiro às ruas para celebrar cada vitória, cada exibição de um futebol-arte que encantava a todos. Mas, infelizmente, todo o êxito desse time foi usado para aumentar o espírito ufanista nacional, numa tentativa de unificar o país e ofuscar o endurecimento da repressão da Ditadura Militar.
“Ele escala o ministério, eu escalo a seleção”
Ao mesmo tempo que uma das maiores seleções se consagrava com mais um título, o Brasil vivia o período mais repressor e sanguinário da Ditadura Militar (1964-1985). Em outubro de 1969, o general Emílio Garrastazu Médici assumiu o poder e o time que havia passado pelas eliminatórias com uma campanha de 100% era comandado pelo jornalista e militante João Saldanha. Contudo, faltando apenas dois meses para a Copa, ele foi dispensado do cargo e substituído por Zagallo.
O Jornal do Brasil, ao noticiar a demissão de Saldanha, disse que a motivação fora o conflito com o diretor de futebol da Confederação Brasileira de Desportos (organização antecessora à CBF), Antonio do Passo. A gota d’água teria sido a decisão do treinador em deixar Pelé no banco reserva na partida contra o Chile naquela semana. Entretanto, em entrevista, poucos dias antes da destituição, Saldanha fez referências veladas à possibilidade de ser demitido pelos militares:
“Entre eu e a comissão técnica está [tudo] muito bem. Nenhum problema entre nós. Agora visivelmente há algo de podre no reino da Dinamarca, né? Esse time é o que vai jogar, se for eu o treinador. Se for outro, vocês perguntem a ele”.
A fala foi proferida a um repórter de televisão em meio à polêmica sobre a não escalação de Pelé.
Em outro episódio, apenas duas semanas antes da troca no comando da seleção, noticiava-se que o Médici, que era fã de futebol, queria ver o jogador Dario, conhecido como Dadá Maravilha, convocado. Saldanha, então, declarou, via imprensa: “Nem eu escalo o ministério e nem o presidente escala o time”.
Com a mudança na comissão técnica faltando pouco tempo para o evento, Zagallo manteve a base de Saldanha ao convocar o time, promovendo apenas algumas alterações certeiras entre os titulares. Brito entrou na zaga ao lado de Piazza, improvisado na posição. Clodoaldo se firmou como titular, Rivellino entrou no lugar de Edu e Tostão foi mantido no time, mesmo com Pelé e Jairzinho ao lado dele.
A campanha irretocável
Pela fase de grupos, os brasileiros teriam pela frente as seleções da Inglaterra, Romênia e Tchecoslováquia. Na estreia, diante dos tchecos, o time brasileiro já mostrou todo o seu grande potencial, vencendo por 4 a 1, com gols de Rivellino, Pelé e Jairzinho por duas vezes. Em seguida, ganharam dos ingleses por 1 a 0, com gol de Jairzinho. E pela última rodada, contra os romenos, mais uma vitória, dessa vez por 3 a 2, com gols de Pelé (em duas oportunidades) e Jairzinho.
Nas quartas de final, um duelo de países sul-americanos: Brasil e Peru. Em um jogo com seis gols, os brasileiros abriram o placar com Rivellino e, três minutos depois, aumentou a vantagem com Tostão. Antes do primeiro tempo acabar, aos 28’, os peruanos marcaram com Gallardo. Na segunda metade do jogo, aos 52’, Tostão ampliou o placar. Com 70’, o time peruano diminuiu de novo, dessa vez com Cubillas. E aos 75’, Jairzinho marcou para decretar a vitória brasileira por 4 a 2.
Em busca de uma vaga na final, mais uma vez o adversário seria um vizinho, o Uruguai. Em um jogo cheio de rivalidade, o Brasil saiu atrás no placar, já que os uruguaios marcaram primeiro com Luís Cubilla, aos 19’. Antes do intervalo, Clodoaldo fez um gol para empatar a partida. No segundo tempo, dois gols brasileiros, aos 76’ com Jairzinho e aos 89’ com Rivellino. Após a decepção de 1966, a seleção brasileira voltava à decisão de uma Copa do Mundo.
Na final, a partida começou equilibrada, mas o time brasileiro não deu chances a forte seleção italiana. Quando o relógio indicava 17 minutos de jogo, Pelé marcou de cabeça para abrir o placar. Aos 37’, Roberto Boninsegna empatou para a Itália. No segundo tempo, só dava o Brasil no ataque, aos 66’, Gérson marcou um golaço de perna esquerda e cinco minutos depois, Jairzinho fez o seu sétimo gol na competição. Para finalizar, aos 86’, Carlos Alberto Torres recebeu passe do Rei e, de primeira, chutou para o gol para fazer 4 a 1. O capitão Carlos Alberto levantou a taça, e a seleção brasileira se tornava a primeira tricampeã da Copa do Mundo.
Essa seleção brasileira encantou o mundo com a sua forma de jogar e ficou conhecida como a “Seleção das Seleções”. Jairzinho foi o vice-artilheiro da Copa do México, marcando em todos jogos da competição. Já o Rei Pelé, foi eleito o melhor jogador e se tornou o primeiro – e único até hoje – a ser tricampeão do mundo. E o Brasil passou a ser conhecido como o país do futebol.
Grupo campeão em 1970: Félix, Brito, Piazza, Carlos Alberto Torres, Clodoaldo, Marco Antônio, Jairzinho, Gérson, Tostão, Pelé, Rivellino, Ado, Roberto, Baldocchi, Fontana, Everaldo, Joel Camargo, Paulo Cézar Caju, Edu, Dadá Maravilha, Zé Maria e Leão. Técnico: Zagallo