O “Menino de Ouro” da política de Roraima, Jalser Renier (Solidariedade) não é mais presidente da Assembleia Legislativa desse estado, tampouco deputado. Ele, que já estava no sétimo mandato, foi cassado em sessão histórica realizada na manhã desta segunda-feira (28).

Há 27 anos, Jalser não poderá concorrer às eleições de 2022 e fica inelegível pelos próximos oito anos, conforme previsto na Lei Complementar Federal nº 64 de 1990, que trata sobre casos de inelegibilidade. Foram 18 votos a favor da perda do mandato; o deputado que presidiu a sessão, Jânio Xingu se absteve de votar e faltaram à sessão os deputados Dhiego Coelho, Lenir Rodrigues, Renan Filho e Odilon Filho. Jalser também não foi.

A maioria dos deputados considerou que houve quebra de decoro parlamentar pela suspeita de Jalser ter mandado sequestrar e torturar o jornalista Romano dos Anjos e instalar milícia militar dentro da Assembleia Legislativa.

A biografia de Jalser acumula muitos escândalos. Ele foi preso pela primeira vez em 2003 por envolvimento no maior caso de corrupção em Roraima, o “Escândalo dos Gafanhotos”. Em 2016, ele voltou a ser preso pelo mesmo motivo.

Já em 2019, o parlamentar foi alvo das operações “Cartas Marcadas” e “Royal Flush”, deflagrada pelo Ministério Público de Roraima, que investigou crimes de fraudes em processos licitatórios, contratos administrativos, lavagem de dinheiro, organização criminosa e obstrução de Justiça. A ação também mirou a esposa Cinthya Gadelha e outras cinco pessoas ligadas a ele.

No mesmo ano, ele foi condenado a pagar R$ 40 mil de indenização a então prefeita de Boa Vista, Teresa Surita (MDB), em um processo em que ela pedia reparação por ter sido xingada e ameaçada quando dava entrevista em uma rádio, em outubro de 2018.

O mais novo dos escândalos corresponde à suspeita de ter instalado uma milícia dentro da AL, que sob seu comando, teria sequestrado o jornalista Romano dos Anjos.

Milícia na AL de Roraima

O InfoAmazônia publicou uma série com três reportagens, chamada “O Poder da Milícia de Roraima”, a partir da análise de documentos sigilosos. Com base na denúncia do MP, a primeira reportagem aponta que policiais militares de elite, incluindo três coronéis e um major, agiam a mando do deputado.

O grupo era lotado no Serviço de Inteligência e Segurança Orgânica da Assembleia (SISO), criado pelo próprio deputado em 2016, quando já era presidente da Casa. O objetivo era utilizar a estrutura para apurações parlamentares, mas tornou-se um núcleo de perseguição, que atuava com base nos interesses de Jalser, visto hoje como um dos políticos mais poderosos do estado.

Apesar de a polícia e o Ministério Público entenderem que o deputado é o mentor intelectual da milícia, Jalser é o único entre os 10 denunciados que segue. Até então, protegido por sua imunidade parlamentar. Todos os demais denunciados seguem presos. Afastado da presidência da Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) desde janeiro de 2021, Jalser havia retomado o cargo na terça-feira (23). E nesta segunda-feira (28), foi cassado.

O sequestro do jornalista

Na segunda reportagem da série “O poder da milícia em Roraima”, do InfoAmazônia, Romano dos Anjos conta em detalhes como foi sequestrado. Pelo modo de agir do bando que invadiu sua casa, no primeiro momento detectou que se tratava de “gente com treinamento militar”.

Depois de várias horas sob o poder dos sequestradores, o jornalista da afiliada da TV Record em Roraima teve o carro queimado, os dois braços quebrados e foi abandonado com os olhos vendados e a boca coberta por fitas. Ele foi encontrado na manhã do dia seguinte, 27 de outubro de 2020. Romano lembra que à época, em plena pandemia, o nome do deputado Jalser Renier (Solidariedade) tinha sido associado a denúncias de “desvios de dinheiro para compra de respiradores, de médicos que recebiam e não trabalhavam”.

(Reprodução/InfoAmazônia)

Foi ao investigar as pistas do sequestro que a Polícia Civil chegou ao Serviço de Inteligência da Assembleia de Roraima, o SISO. Ao pedir a quebra do sigilo telefônico e bancário de diversos investigados, a Polícia Civil descobriu muito mais coisas. O grupo estava envolvido em esquemas com financeira, transferências ilegais de dinheiro, segurança para garimpos e serviços de segurança privada com armas do estado em cervejarias, bares e casas de loteria.

Ilustração Julia Lima/ Reprodução/InfoAmazônia

Por fim, na última reportagem da série, o InfoAmazonia exibe detalhes dos documentos que revelam os serviços e as relações estabelecidas entre o garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami e a milícia do deputado estadual Jalser Renier.