
SOM indica: Pedro Mizutani mostra suas marcas – e dentes – referenciando a bossa na música contemporânea
Carioca revela camada mais verdadeira da sua música em Mostrando os Dentes, lançado com produção do britânico Skinshape.
Por Davi Maia
Pedro Mizutani sempre soube que tinha muita coisa pra dizer. Mas demorou até encontrar na música o espaço seguro para essas palavras. “Sempre tive muita coisa pra falar que eu não falava. A música é esse lugar”, confessa o cantor e compositor carioca de 23 anos, que lança seu novo EP, Mostrando os Dentes, em parceria com o produtor britânico Skinshape.
Mesclando referências da bossa nova com uma sonoridade pop minimalista e uma lírica atravessada pela melancolia, o trabalho marca um ponto de virada na trajetória de Mizutani. “As letras passam isso, com um drive às vezes melancólico, que contrasta com a estética sonora. Talvez o nome do EP represente isso: os dentes aparecem no sorriso meio amarelo, mas também na raiva sutil das coisas como são”, conta ele.
Apesar de flertar com a estética pop, o som de Pedro transborda essa estética que se apoia na bossa de João Gilberto, João Donato e Nara Leão – nomes que ele cita como pilares de um som que, embora revisitado, carrega um respeito pela essência do gênero. “A bossa tem esse lugar da suavidade, do minimalismo, da simplicidade. É meio que um sinônimo de sinceridade pra mim. Acho que é por isso que me identifiquei tanto”, observa.
Ao lado de Skinshape, o produtor inglês que assina também o primeiro EP de Mizutani, ele encontrou um parceiro capaz de potencializar esse encontro entre o clássico e o contemporâneo. “Com o Will [Skinshape], eu pude experimentar essa mistura… deixar a coisa solta, mais fluida, sem medo de ser simples”, conta Pedro, sobre o processo criativo que uniu beats lo-fi, arranjos delicados e o violão como fio condutor das faixas.
O EP, lançado pela francesa Nice Guys Records, reúne cinco faixas autorais – “Criaturas da Noite”, “Sózin”, “Canal”, “Lugar de Agonia” e “Deixar” – e carrega nas entrelinhas a experiência de crescer no Rio de Janeiro, lugar onde Pedro aprendeu a lidar com o incômodo de se sentir sozinho em meio à multidão. “Meus amigos não são da música ou da arte. Sempre foi uma parada muito solitária pra mim… ficar no meu quarto sozinho, compondo, com vergonha de mostrar”, relembra.
Foi justamente a exposição espontânea na internet que virou a chave. “Postei uns covers no TikTok e a galera começou a gostar. Fiquei: se pá, sou bom… se pá, eu deveria tentar musicar de novo”, diz ele, que hoje soma mais de 700 mil ouvintes mensais no Spotify – boa parte deles fora do Brasil.
“Meu público do Spotify é 80% gringo. É tudo muito pulverizado. Tem sido difícil, estamos batendo cabeça, gastando dinheiro, mas tá começando a rolar”, revela, ao ser perguntado sobre a dificuldade de transpor o sucesso dos números das redes sociais para as bilheterias nos shows por palcos do Brasil.
E se as músicas carregam as angústias que Mizutani tinha dificuldade de dizer, é justamente no palco que ele sente o retorno mais genuíno. “O ao vivo é outra parada”, dispara. É lá que Pedro Mizutani tenta se debruçar em momentos mais experimentados do que o seu repertório já lançado, e explora seu lado ligado às influências da psicodelia. O artista inclusive confessou que uma colaboração dos sonhos seria com Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo, em entrevista ao Tracklist.
Mesmo se referindo a si próprio como um cara “chato com música”, Pedro parece ter encontrado na simplicidade um lugar de liberdade. “Às vezes a autenticidade tá na simplicidade”, afirma. E é com esse espírito que ele dá seu próximo passo. “‘Mostrando os Dentes’ é só uma provinha do que eu quero fazer”, avisa, já mirando o futuro.
O EP está disponível em todas as plataformas, e é mais um trabalho que posiciona Pedro Mizutani como uma das vozes mais promissoras de sua geração – um artista que não tem medo de deixar transparecer as rachaduras, e que sabe que a beleza da arte também está naquilo que incomoda. Ou, como ele próprio diz: “A arte tem que nascer do real, do verdadeiro, do que dá um pouco de medo de falar.”
Ouça o último lançamento de Pedro Mizutani: