Por Kaio Phelipe

Silvetty Montilla é a maior drag queen do país. Conhecida por seus bordões – quem frequenta a noite paulista com certeza já ouviu um “é o que tem pra hoje” ou um “foca nas joias” –, Silvetty é apontada por Nany People como pioneira do stand-up. Muito antes do humor dominar as redes sociais, ela já levava a comédia para os palcos diante de uma plateia. 

Silvio, o lendário ator de 57 anos que dá vida à drag queen, comemora em julho 36 anos de carreira. Embora o humor tenha sido inevitável, a trajetória de Silvetty Montilma começou nos cursos de beleza. E ganhou até o título de Miss Universo.

Conversamos com a lenda da comunidade LGBTQIA+ sobre sua trajetória, as memórias da Primeira Parada do Orgulho de SP e os planos que ainda guarda para o futuro.

Recentemente, Silvetty enfrentou um desafio de saúde e esteve internada devido à uma falência renal causada pela diabetes. Em meio à recuperação e na fila para um transplante, recebeu uma homenagem beneficente na Blue Space – uma das casas noturnas mais tradicionais de São Paulo –, em uma noite que contou com artistas como Victoria Principal, Natasha Princess, Grace Gianoukas e Wanessa Camargo.

Confira a entrevista completa.

Foto: Leandro Valton. Edição: Lucas Leal

Quando se montou pela primeira vez?

No próximo mês de julho, irei fazer trinta e oito anos de carreira. Quando comecei a me montar, jamais tinha imaginado fazer disso uma profissão. Eu comecei a me montar porque assisti ao show de um amigo meu. O nome dele era Paulo e, artisticamente, era Pauletty. Por isso que o meu nome Silvio virou Silvetty, foi uma homenagem. Eu achei tudo muito lindo no show dele. Aí comecei a pensar em fazer a mesma coisa, mas nunca imaginei que completaria trinta e oito anos de carreira ou que isso viraria o meu ganha-pão. Quando comecei, não cheguei a ter uma referência do que fazer. Achei o show do meu amigo muito lindo, mas não era uma referência. A Miss Biá e a Marcinha do Corintho são artistas que cheguei a ver na televisão, mas também não as via como referências para eu fazer o mesmo. Quando pude estar ao lado delas, foi muito gratificante. Foi muito bom poder contar com a amizade das duas. A Marcinha é minha amiga até hoje.

Quando começou a trabalhar com humor?

Ah, eu nem imaginava fazer humor. Eu participei, realmente, de vários concursos de miss e ganhava todos. Ganhei Miss Cidade, Miss Brasil, Miss Universo, Miss Primavera, Rainha do Carnaval. O humor se iniciou em um extinto bar chamado Vila Verde, que ficava na Rua Amaral Gurgel (SP). Um amigo falou pra eu subir no palco, eu disse que ele estava louco. Eu gritava no microfone, não tinha noção nenhuma. Mas acabou que deu certo, né? Estou aí até hoje e acabei virando totalmente para o humor. Comecei a apresentar várias casas e é o que eu amo fazer.

Eu faço stand-up, mas não digo que sou a primeira. A Nany People fala sempre que sou a pioneira, que a gente sempre fez stand-up, mas que não tinha esse nome. Hoje eu sei que é a mesma coisa e viajo o Brasil inteiro fazendo comédia, mas não digo que sou a primeira, isso é coisa da Nany.

Qual memória guarda da Primeira Parada do Orgulho de SP?

Foi em 1997. Lembro muito de quando subi em um moto, percorri a Consolação inteira, até o final. Antigamente, a gente conseguia descer no chão da Avenida Paulista. Hoje em dia, não é que a gente não queira, mas é muita gente. As pessoas querem tirar fotos, mas não dá pra fazer isso com todo mundo. Então acaba sendo complicado estar no chão entre milhares de pessoas. 

O que ainda gostaria de fazer profissionalmente?

Participei de muitos projetos maravilhosos. Foi maravilhoso participar de Academia de Drags. Amaria se o projeto voltasse. De todos os realities, Academia de Drags foi o único que teve três temporadas. Mas, no Brasil, para quem não tem um nome conhecido por todo mundo, patrocínio é muito difícil. Enquanto durou foi tudo, foi lindo, foi maravilhoso. Conseguir patrocínio é a maior dificuldade de fazer arte drag no nosso país. A não ser que você esteja na TV. Nós temos artistas maravilhosos na cena, mas que não estão na televisão.

Participei de Cartola – O mundo é um moinho. Eu não me considero cantora. Gravei muitas músicas, mas sempre paródias. O musical do Cartola foi outra coisa, um outro tipo de trabalho que amei ter feito. Foi um divisor de águas pra mim. Não conhecia tanto, mas já amava o Cartola. 

Muitas pessoas me perguntam o que ainda gostaria de fazer, mas a única coisa que nunca fiz foi novela. Não gostaria de fazer uma novela inteira, mas amaria fazer uma participação. Eu sou muito noveleiro, amo assistir novela. Então, fazer uma participação seria gratificante. Acho que é só isso o que falta pra minha carreira.

Foto: Leandro Valton. Edição: Lucas Leal

Como foi receber a homenagem na Blue Space e como está a sua saúde agora?

Ah, eu tenho muita gratidão. Três amigos meus, Alexandre, Vinicius e João, resolveram fazer esse espetáculo. Começaram a vender ingresso pela internet e logo esgotou. Aí eu vi que teria um público legal. Venderam muito ingresso fora da internet também. Primeiro preciso agradecer a esses três amigos. 

Agradeço também ao Victor, que além de amigo, foi um pai, um irmão, e é o proprietário da Blue Space. A Blue Space é tudo, é uma referência. Artistas de outros estados e até de fora do Brasil querem estar na Blue Space. O Victor cedeu a casa para que esse espetáculo acontecesse. Pra abrir uma casa de show sem cobrar nada, é preciso gostar muito da pessoa.

E também agradeço a todo mundo que foi. Quando os meus amigos convidaram a Nany People pra ser apresentadora, ela topou na hora. Fora os outros grandes artistas que estavam presentes. Fiquei muito feliz, fiquei muito emocionado. Foi uma noite incrível.

Eu estou fazendo hemodiálise três vezes por semana. Hoje eu fiz, inclusive. E estou na fila do transplante. Mas graças a Deus tenho dois anjos da guarda, que são as minhas irmãs, que cuidam de mim e me dão a medicação no horário certo. Uma dessas minhas irmãs é cem por cento compatível comigo. Só que, como eu fiz angioplastia há pouco tempo, preciso esperar mais ou menos um ano para o transplante.

Eu sou uma pessoa que corro atrás e não tenho medo. Faz duas semanas que voltei a trabalhar. Estou voltando aos poucos, mas não tenho medo. Estou fazendo o que escolhi pra minha vida. Eu sou uma pessoa que acredito muito em Deus e rezo todos os dias. Que Deus me dê muita saúde, o resto eu corro atrás.