Por Mauro Utida

O Seminário Internacional “Sistemas Alimentares: Oportunidades para Combater a Fome e o Desperdício no Brasil”, realizado pelo Sesc e The Global FoodBanking Network (GFN), reuniu especialistas para discutir soluções urgentes para a crise alimentar no país nesta última terça-feira (6), no auditório do Sesc Belenzinho. O evento celebrou os 30 anos do Sesc Mesa Brasil, maior rede privada de bancos de alimentos da América Latina, apresentou dados alarmantes sobre a insegurança alimentar e o desperdício de comida no Brasil, além de destacar o lançamento do Atlas Global de Política de Doação de Alimentos (https://atlas.foodbanking.org).

O Atlas, fruto de uma parceria entre a GFN e a Harvard Law School, com apoio do Sesc, analisa as leis e políticas que afetam a doação de alimentos em 25 países, incluindo o Brasil. A pesquisa, apresentada por Gray Norton, da Food Law and Policy Clinic de Harvard, revelou que o Brasil, apesar de ser uma potência agrícola, possui um sistema de doação de alimentos com lacunas e obstáculos. 

O Atlas apontou a necessidade de simplificar a legislação, reduzir a burocracia e oferecer incentivos fiscais para estimular a doação.  A proposta de redução de impostos para incentivar a doação, levantada por Norton, foi elogiada pelos especialistas, que veem essa medida como crucial para estimular as empresas a doarem seus excedentes.

Mesa Brasil: 30 anos de combate à fome e ao desperdício

O Sesc Mesa Brasil, que completa 30 anos em 2024, comemorou a data com a apresentação de dados impressionantes sobre sua atuação: trata-se de uma rede de 95 bancos que já distribuiu mais de 770 milhões de quilos de alimentos desde sua criação, beneficiando, atualmente, cerca de 2 milhões de pessoas por mês. Lisa Moon, presidente da GFN, destacou o trabalho do Sesc como inspirador para o mundo, afirmando que o Brasil tem potencial para ser o maior banco de alimentos do mundo.

A gerente de alimentação e segurança alimentar do programa, Mariana Meirelles, destacou a importância do trabalho e apontou os desafios que persistem na busca por um país livre da fome.

Mariana Meirelles sorri em frente a um quadro dourado
Mariana Meirelles, gerente de alimentação e segurança alimentar do SESC Mesa Brasil. Foto: Mauro Utida / Mídia NINJA

“A gente fica muito triste com os dados da fome, que tem uma presença histórica no Brasil. Quando o Mesa Brasil foi criado, em 1994, a ideia era que ele tivesse uma duração menor, já que se imaginava que o país superaria essa questão social em um tempo mais curto”, lamentou Mariana.

A realidade, no entanto, se mostrou mais complexa, ainda mais com crises globais de alimentação que estão sendo provocadas pelas mudanças climáticas. A gerente reconhece que a meta de acabar com a fome ainda está distante, mas destaca que a equipe do Mesa Brasil segue firme no propósito de minimizar a fome e reduzir o desperdício de alimentos. “O programa não nasceu para ter um longo prazo, mas enquanto o país vive essa realidade, nós continuamos trabalhando para atender as pessoas em situação de vulnerabilidade”, informa.

Nos dias 10 e 11/08, unidades do Sesc no Estado realizam um festival que inaugura uma campanha de arrecadação de alimentos não perecíveis, Neste fim de semana de celebração, o público pode acessar gratuitamente algumas atividades do Sesc e exercer a solidariedade, ao doar alimentos não perecíveis. Além disso, nos meses de agosto e setembro, as atividades educativas gratuitas do Sesc Mesas Brasil voltadas às instituições sociais atendidas pelo programa também serão abertas ao público, com temas relacionadas ao Guia Alimentar para a População Brasileira, à elaboração de cardápios saudáveis, e a técnicas de preparo e aproveitamento integral dos alimentos.

Saiba mais em sescsp.org.br/sescmesabrasil30anos

Um alerta sobre o impacto do sistema alimentar no planeta

João Campari, líder da prática de sistemas alimentares e agricultura da WWF (World Wildlife Fund), apresentou um panorama preocupante sobre o impacto do sistema alimentar atual no planeta, destacando sua contribuição para o aquecimento global. O sistema alimentar, segundo Campari, está em um círculo vicioso, com a produção e o consumo de alimentos intensivos em recursos naturais e gerando impactos negativos para a biodiversidade e o clima.

A WWF propõe a mudança para um círculo virtuoso, com a transformação do sistema alimentar para garantir a segurança alimentar, a saúde das pessoas e a conservação do meio ambiente. Para isso, é necessário repensar a produção e o consumo, priorizando alimentos nutritivos, produzidos de forma sustentável e com menor impacto ambiental. 

Dados revelam aumento da insegurança alimentar no Brasil

A professora Sandra Chaves dos Santos, em sua apresentação, evidenciou um cenário preocupante, com um aumento significativo da insegurança alimentar grave e moderada nos últimos anos. Conforme sua apresentação, a partir de 2018, observa-se um aumento acentuado da insegurança alimentar, com um pico em 2020 e uma leve redução em 2023, mas ainda em níveis preocupantes. 

“A insegurança alimentar no Brasil assumiu proporções alarmantes a partir de 2018, atingindo um pico durante a pandemia da COVID-19. Porém, a pandemia apenas aprofundou uma crise que já vinha se desenhando. A partir de 2018, a redução de investimentos em programas sociais, a política de austeridade e os cortes em áreas como a agricultura familiar minaram as políticas de segurança alimentar do país. A diminuição de investimento em áreas sociais afetaram diretamente o acesso a alimentos, especialmente para as populações mais vulneráveis”, destacou.