‘Saudosa Maloca’: O samba paulistano e a ditadura militar
Longa conta a história de Adoniran Barbosa, o célebre sambista que chegou a ser alvo de censura durante a ditadura militar, nos anos 60
Por Milene de Souza de Espindula
Exibido na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo no final do ano passado, “Saudosa Maloca” chega às salas de cinema nesta quinta-feira, 21 de março.
O diretor brasileiro Pedro Serrano, contou as histórias do músico Adoniran Barbosa em 2020, quando lançou o documentário “Adoniran – Meu nome é João Rubinato”. Em breve, lançará também o curta-metragem intitulado “Da licença de contar”, ainda sem data de lançamento.
Em “Saudosa Maloca”, o mestre Adoniran Barbosa é interpretado por Paulo Miklos, o músico narra sua história através de seus grandes sucessos “Samba do Arnesto”, “Trem das Onze” e canção que deu título ao longa-metragem “Saudosa Maloca”. Dentre as histórias e causos do paulistano, ele remonta a mudança abrupta na grande São Paulo dos anos 50 aos anos 60 com o avanço da urbanização. Juntamente de seus amigos Matogrosso (Gero Camilo) e Joca (Gustavo Machado). Adoniran (Paulo Miklos) e os dois amigos sambistas, invadem um velho casarão ou “palacete abandonado” (como diz a letra da canção lançada em 1951) no centro da grande cidade e apelidam carinhosamente de “Saudosa Maloca” de onde são expulsos posteriormente após a destruição do palacete. O longa pretende expressar uma interpretação bastante descontraída e leve, mesmo tendo como abordagem a aceleração da urbanização em São Paulo durante os anos 50 e 60 que trouxeram consigo um crescimento desigual e desordenado, exacerbando as disparidades sociais na cidade. Enquanto áreas urbanas se expandiram rapidamente, muitos habitantes foram deixados à margem, sem acesso adequado a moradia, educação e serviços básicos como foi o caso de Adoniran e seus companheiros.
Censura musical
A ditadura militar que se instalou nesse período também foi prejudicial ao sambista que, em 1973, teve uma de suas canções mais icônica censurada. A canção “Tiro ao Álvaro”, escrita por Adoniran Barbosa e Oswaldo Moraes, em 1960, foi impedida de tocar nas rádios por um motivo um tanto “inusitado”. A canção foi vetada por “falta de gosto” por conta da letra que brincava com a oralidade local da época, como “tauba”, “revorver” e “automóver”. Para a liberação desta e outras canções que foram vetadas pelo governo na época, o compositor precisaria reescrever as letras consertando os “erros” de português que era marca registrada do sambista. A música “Tiro ao Álvaro” chegou a ser reescrita para “Tiro ao Alvo” tirando todo o “tempero” da canção. Após isso, esta e as demais canções que foram vetadas ficaram “esquecidas” por um tempo até que os artistas pudessem ser livres novamente.
Mensagem principal
“Saudosa Maloca” oferece não apenas um retrato emocionante da vida e obra de Adoniran Barbosa, mas também lança luz sobre um período tumultuado da história paulista e brasileira. Ao destacar a censura enfrentada pelo músico, ressalto os desafios enfrentados pelos artistas durante esse período autoritário, ao mesmo tempo em que celebramos a resistência e a criatividade que permitiram que a música brasileira continuasse a prosperar. Por meio dessa história, somos lembrados da importância da liberdade de expressão e da necessidade contínua de proteger os direitos culturais e artísticos.