Por Milene Souza

“O Urso” (“The Bear”) é uma série norte-americana lançada em julho de 2022, criada por Christopher Storer. A trama gira em torno de Carmy (Jeremy Allen White), um renomado chef de cozinha que herda a lanchonete da família após seu irmão, que se suicidou.

Carmy, ainda em luto, enfrenta a enorme responsabilidade de gerenciar o restaurante que seu irmão deixou em pedaços e cheio de dívidas, além de lidar com uma equipe indisciplinada. Ele entra em um ciclo onde tudo parece dar errado enquanto tenta manter o restaurante funcionando para pagar os fornecedores. Carmy sofre de um complexo de inferioridade enquanto busca entender seu caminho e tudo ao seu redor em meio ao caos interno tendo diversas crises de pânico além das crises externas no restaurante. Em conversa com Richie, Carmy externa esse sentimento dizendo:

“Existe um nome para a sensação de ter medo que algo bom aconteça porque algo ruim vai acontecer em seguida?”

A personalidade de Carmy perfeitamente interpretado por Jeremy Allen White quebra todo o estigma que a sociedade coloca sobre os chefes de cozinha, desafiando a imagem de que são hostis e egocêntricos, além de trazer à tona de forma natural a necessidade de mais atenção quando se trata da saúde mental destes profissionais, que trabalham diariamente sob pressão e outras questões relacionadas à convivência na cozinha.

Além de Carmy, um dos personagens que me chamou a atenção foi Richie. Desde o primeiro episódio, ele se apresenta como um homem problemático. Ao longo dos episódios, percebemos que Richie, na verdade, tem muitos problemas de autoimagem e também sofre com o luto de seu melhor amigo Michael, irmão de Carmy. Richie pretende nunca abandonar o restaurante, mas ao mesmo tempo não se sente parte dele, pois acredita que não o querem por perto.

Constantemente, ele se sente uma carta fora do baralho, sem propósito de vida aos 40 e poucos anos. Tudo muda a partir do episódio 7 da segunda temporada, quando Carmy envia Richie para estagiar no melhor restaurante da cidade. No início, Richie não entende o propósito de tudo aquilo, mas, ao observar melhor ao seu redor, percebe que cada função, por mais simples que pareça, é vital para o desempenho global da equipe. Polir os garfos, preparar ingredientes, montar pratos ou comandar a cozinha: cada tarefa é interdependente e contribui para a experiência final do cliente. Ele vê que o trabalho em equipe e a atenção aos detalhes são essenciais. O estágio ensina Richie que a cozinha é um organismo vivo, onde todos têm um papel importante, e o respeito mútuo e a colaboração são fundamentais para alcançar a excelência. Essa lição é um dos principais aprendizados que Richie traz de volta ao The Bear, entendendo que todos, independentemente de sua função, são importantes para o sucesso do restaurante.

Mais uma personagem que merece atenção é Sidney, que, ao longo da série, sente uma falta de sintonia com Carmy, apesar de compartilharem o mesmo objetivo de melhorar o restaurante. Ela percebe que Carmy não a ouve verdadeiramente, o que gera frustração e tensão entre eles. Sidney carrega um trauma após o fracasso de sua tentativa anterior de abrir um negócio, o que a assombra profundamente. Ela não consegue pensar em nada além de fracasso ou sucesso, não consegue encontrar equilíbrio entre eles. Essa situação impede que ela consiga se descontrair com a equipe e se integrar totalmente.

Ao longo da primeira e da segunda temporada, Sidney começa a ganhar mais segurança e voz na cozinha, encontrando gradualmente sua posição e confiança, tanto nas relações quanto no seu próprio trabalho. No entanto, o sentimento de insegurança em relação ao seu parceiro de negócios, Carmy, persiste. Apesar de seu crescimento e das contribuições significativas para o restaurante, Sidney ainda luta para superar suas dúvidas e traumas passados, enquanto busca o reconhecimento e a colaboração plena de Carmy.

“The Bear” destaca de maneira incisiva e natural a questão da saúde mental, não apenas ao explorar os desafios enfrentados pelos personagens Carmy, Richie, Sidney e Michael (irmão de Carmy, que se suicidou), mas também ao enfatizar a dura realidade do trabalho na cozinha. A série ilumina como o ambiente culinário pode ser exaustivo e desgastante, ao mesmo tempo que oferece uma válvula de escape e propósito para muitos.

Por exemplo, Marcus encontra na cozinha uma maneira de lidar com a difícil situação de sua mãe, que está no hospital com uma doença terminal. Cozinhar se torna sua forma de fuga e de encontrar sentido em meio à dor.

Ebraheim, por outro lado, sente o cansaço da idade e teme ser substituído por alguém mais jovem, refletindo uma ansiedade comum entre os profissionais mais experientes.

Tina, que trabalha no restaurante desde a inauguração, finalmente recebe o reconhecimento que sempre quis. Sua história representa a perseverança e o desejo de validação que muitos trabalhadores de longa data experimentam.

Essas histórias refletem a realidade de muitas cozinhas na vida real, onde cada pessoa tem uma trajetória única marcada por desafios pessoais e profissionais. “The Bear” não só traz à tona a importância da saúde mental no ambiente de trabalho, mas também humaniza os profissionais da cozinha, mostrando que suas lutas, medos e vitórias são tão significativos quanto os pratos que preparam.

No dia 17 de julho será lançada a terceira temporada de The Bear no Star+, assista também pelo Disney Plus.