Rota do ouro leva PF à lista de suspeitos que vai de traficantes a policiais e empresários
Os agentes investigaram um total de R$ 27 bilhões em bens e negócios suspeitos, prenderam 225 pessoas e pediram a apreensão de 236 aeronaves
A equipe do Repórter Brasil mergulhou em uma série de investigações dos últimos cinco anos feitas pela Polícia Federal (PF), provando ligações entre traficantes, garimpeiros, policiais e empresários suspeitos de envolvimento com os chamados “narcogarimpos”.
Os agentes investigaram um total de R$ 27 bilhões em bens e negócios suspeitos, prenderam 225 pessoas e pediram a apreensão de 236 aeronaves. No entanto, os processos se arrastam na Justiça.
Em reportagem, a equipe apresentou o histórico de Heverton Soares Oliveira, o “Grota”, um empresário de sucesso no Pará, com investimentos em fazendas, gado e mineração.
Quando a Polícia Federal do Paraná detonou uma operação sobre tráfico internacional de drogas, em novembro de 2020, o “Grota” sequer era alvo dos agentes. Mesmo assim, segundo a PF, ele achou melhor se esconder em um garimpo ilegal de ouro em Itaituba (PA), a 3 mil quilômetros de Curitiba.
Grota entrou na mira da PF em outra operação, a Narcos Gold, em 2021. Ele e um piloto de avião, apontado como seu sócio, Silvio Berri, (que chegou a ser preso em 2004 acusado de prestar serviços ao traficante Fernandinho Beira-Mar), controlariam dezenas de aeronaves e pistas clandestinas usadas para o transporte de ouro e cocaína, movimentando, segundo a PF, cerca de R$ 1 bilhão no Pará, entre 2017 e 2020.
As exportações do minério de ouro extraído na Amazônia quase dobraram entre 2017 e 2022, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, saltando de 11,6 para 22 toneladas – um total avaliado em R$ 6,6 bilhões.
Foram anos prósperos para quem atuava no contrabando desses produtos, principalmente diante dos discursos violentos de Jair Bolsonaro (PL) e do afrouxamento das fiscalizações e leis que seu governo promoveu.
Silvio Berri: uma teia de traficantes
Dono de uma longa trajetória no tráfico, Berri é considerado pela PF o sócio de Grota. Em 2004, ele foi extraditado do Paraguai para cumprir 20 anos de pena no Brasil, depois de trabalhar como piloto de Fernandinho Beira-Mar.
Na operação de 2020, iniciada no Paraná, Berri foi preso novamente. Na época, além de atuar ao lado de Grota, ele também foi denunciado por participação em um esquema de venda de cocaína para África e Europa, comandado por Sérgio Roberto de Carvalho.
Conhecido como “Pablo Escobar brasileiro”, Carvalho responde a um processo de extradição na Hungria, onde foi preso no ano passado pela Interpol.
“Não podemos ver o crime organizado com uma cadeia única de comando. Por isso, vamos encontrar várias pessoas atuando em diferentes esquemas”, explica Roberto Magno, do Laboratório de Geografia da Violência e do Crime da Universidade do Estado do Pará.
Havia pelo menos oito pilotos que trabalhavam para Berri e Grota e que estavam envolvidos em práticas criminosas na Amazônia, segundo a PF.
As rotas aéreas na Amazônia são um dos principais elos entre o tráfico de drogas e o garimpo ilegal. Com cerca de 1,3 mil pistas clandestinas, a região é terreno fértil para diferentes organizações criminosas.
Após mapear aliados de Grota em diferentes inquéritos, a PF deflagrou a operação Narcos Gold em 2021. O alvo específico era Grota e o grupo supostamente encabeçado por ele.
A investigação prendeu alguns de seus parceiros, como a advogada Helenice Carvalho e seu irmão, Diego Oliveira, apontado como laranja dos garimpos e de fazendas adquiridas por Grota.
Casada com o superintendente da Polícia Civil em Itaituba, Helenice soube da operação antes que os agentes chegassem à sua casa às 6h do dia 4 de novembro de 2021 e, segundo a policia, disparou mensagens para o marido e para dois chefes de batalhão da PM na região, além de fazer contato com o segurança privado de Grota, que já não estava em sua fazenda quando a PF chegou para prendê-lo.
Enquanto esteve foragido, dois juízes se declararam incompetentes para julgar o caso, em meio a uma disputa sobre qual seria a vara adequada para o processo.
O Tribunal de Justiça do Pará (TJ-PA) interveio, retirando o caso do foro de Santarém e enviando-o à vara de combate ao crime organizado, em Belém.
Contudo, em setembro de 2023, um novo recurso do MPPA suspendeu o processo. Agora será o Superior Tribunal de Justiça (STJ) quem irá definir a vara adequada para o caso.
Essas mudanças acabaram beneficiando Grota, já que os mandados de prisão e apreensão foram anulados para análise do novo magistrado.
Em resposta, os advogados de Grota alegaram que “tal investigação não passa de uma estória com aspectos mirabolantes, sem qualquer fundamento ou prova”, referindo-se sobre a operação Narcos Gold.
Você pode conferir a reportagem na íntegra em reporterbrasil.org.br