A Conferência do Clima de Dubai já tornou-se escandalosamente a COP DO PETRÓLEO e do fracasso climático dos líderes mundiais. Lá é proibido protestar, mas é liberado fazer acordos para vender petróleo, maior causador da explosão das temperaturas globais.

A COP DO PETRÓLEO

A imagem da COP28 já está manchada de petróleo e marcada por um insuperável conflito de interesses. Documentos vazados pelo Center for Climate Reporting, que trabalham em conjunto com a BBC, revelaram que os Emirados Árabes querem usar a COP28 para fazer acordos de petróleo, inclusive com o Brasil. Com a emergência climática na sua máxima gravidade e a Terra vivendo o ano mais quente em 125 mil anos, começou a mais controversa das Conferências do Clima. 

A COP28 é presidida por um líder petroleiro e sediada num dos maiores exportadores mundiais de petróleo, uma ditadura onde não há liberdade de imprensa, nem de organização ou protesto. 

O estado conflagrado da emergência climática, conforme vaticinou o Secretário Geral da ONU, é uma sentença de condenação do fracasso dos líderes mundiais em impor limites ao aquecimento global.

A COP DO FRACASSO

Não há margem para ilusionismos, nem nada para celebrar. Até aqui, fracassaram todos esforços realizados ao longo de mais de meio século, desde a realização da Conferência de Estocolmo, em 1972, primeira grande reunião mundial de chefes de Estado organizada pela ONU para tratar sobre Meio Ambiente.

Passados 35 anos desde a criação do Painel Intergovernamental Para a Mudança do Clima – IPCC e 31 anos depois da realização da Cúpula da Terra, a ECO 92, no Rio de Janeiro, onde se elaborou a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima – UNFCCC, os países que são membros da Convenção estão reunidos em mais uma Conferência das Partes – COP,  que acontece até o dia 12, em Dubai, com o elefante climático no interior da loja dos mais preciosos cristais proporcionados pelos lucros da destruição climática. 

É a 28ª vez que as partes se reúnem desde a primeira Conferência, ocorrida em 1995, quando se assinou o Mandato de Berlim. No auge da gravidade da emergência, a COP28 é a mais controversa das conferências já realizadas. Primeiro por sua sede, Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. O país está entre os maiores exportadores mundiais de petróleo e vem aumentando sua capacidade de produção numa corrida suicida para lucrar ao máximo com suas reservas antes da transição para fontes mais limpas. 

A COP28 será presidida pelo Sultão Ahmed Al-Jaber, líder petroleiro e presidente da estatal ADNOC, a maior empresa de petróleo dos Emirados Árabes, o que por si só já configura um insuperável conflito de interesses.

A “COP DO PETRÓLEO” pretende reunir 60 dos maiores executivos mundiais do setor de petróleo e gás, depois da invasão já ocorrida nas mesas da COP27, ano passado no Egito, por lobistas da indústria petroleira que credenciou, naquela ocasião, 25% mais de representantes do que na edição anterior – a COP26, de Glasgow, na Escócia. 

Isto ocorre em meio ao consenso da urgente retirada de subsídios ao setor petroleiro, estimados em mais de US$1 trilhão, e da necessidade de imediata taxação dos lucros exorbitantes do setor que é, claramente, o maior responsável pelas emissões de GEE e pelo flagrante descontrole vigente.

UMA COP SEM PROTESTO?

Para completar o quadro dramático da COP28, os Emirados Árabes Unidos, além de reino do petróleo, são também uma ditadura dos sheiks. Sob regime monárquico absolutista, o país é um dos mais fechados do mundo e violador contumaz dos Direitos Humanos, não goza de liberdade de organização, nem de liberdade de imprensa. 

Um cenário que dificulta enormemente os protestos e pressão que exercem as ruas em despertar o mundo quanto à importância das decisões ali tomadas com o quadro acelerado da catástrofe climática que pode ganhar ainda mais impulso em Dubai. 

Geopoliticamente, a COP28 ocorre sob redobradas dificuldades, com o incremento na instabilidade no mundo, graças à Guerra de Israel e o massacre que seu exército vem promovendo em Gaza, cenário de um genocídio e do cometimento aberto de crimes contra toda a humanidade.  

Com a invasão da Ucrânia pela Rússia prestes a completar 2 anos, o teatro de operações da guerra também se mantém no continente europeu. Às inumeráveis perdas humanas somam-se os campos produtivos arrasados e a infra-estrutura destruída, cuja reconstrução deve custar mais de US$400 bi. 

O FUNERAL DO ACORDO DE PARIS

É também entre os cristais de Dubai que o elefante climático deverá concluir o primeiro balanço do Acordo de Paris. Em sua implementação, o Acordo de Paris previu a necessidade de realizar balanços a cada 5 anos, com 2 anos de duração e aprovação conjunta de novo Objetivo Global de Adaptação, também definido a cada 5 anos, razão pela qual a COP28 reservará parte importante de sua agenda à aprovação do primeiro balanço do tratado adotado em 2015, além de uma discussão geral de sua efetividade para a contenção da catástrofe em curso.

Como se sabe, o Acordo de Paris é o grande marco da liderança climática em seu esforço de gestão compartilhada da mudança do clima. O tratado celebrado na COP21 foi assinado pelos 195 países que compõem a UNFCCC. Nele, cada país apresentou suas próprias metas de redução de emissões, as chamadas Contribuições Nacionalmente Determinadas – NDC (Nationally Determined Contribution) de modo a limitar o aumento da temperatura global como respostas frente à ameaça da mudança do clima e, ao mesmo tempo, reforçar a capacidade dos países para lidar com os efeitos decorrentes dela.

LONGE DE PARIS, PERTO DO INFERNO

O objetivo mais importante do Acordo de Paris é manter o aumento da temperatura global abaixo de 2ºC, realizando o máximo esforço possível para limitá-lo a 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais. O dia 17/11 registrou uma média global 2,07ºC acima da era pré-industrial. Um recorde que não poderia em nenhuma hipótese já ter sido ultrapassado. Para cumprir com este objetivo, as emissões precisam ser reduzidas em 43% até 2030 e em 60% até 2035. O fato concreto e mais alarmante é que jamais houve redução das emissões, pelo contrário, o que se observa é seu crescimento contínuo, com o consequente aumento constante da concentração atmosférica dos gases de efeito estufa – GEE, cuja permanência mínima estimada é de 100 anos. 

Ao que tudo indica, as emissões dos GEE em 2023 atingirão um novo um recorde histórico sem precedentes, com aumento de até 1,5% nas emissões totais. O total de emissões em 2023 vai superar assim os recordes alcançados em 2022, quando subiram 0,9%. Em maio deste ano, a concentração total de CO2 na atmosfera atingiu o máximo já registrado na história, com 424 partes por milhão (ppm), superando a marca recorde que havia sido registrada em maio de 2022, quando foram detectados 421 ppm, de acordo com dados da National Oceanic & Atmospheric Administration (NOAA). Trata-se dos níveis mais altos de concentração de CO2 em pelo menos 2 milhões de anos.

O DURO BALANÇO DO ACORDO

O balanço do Acordo de Paris em Dubai deve ser balizado pelas descobertas mais recentes de cerca de 800 cientistas, o corpo mais qualificado e confiável do mundo sobre clima, que durante 8 anos trabalhou na produção do Sexto Relatório de Avaliação – AR6 do Painel Intergovernamental Para a Mudança do Clima – IPCC.  Composto de 8 volumes, 3 deles correspondem aos relatórios de cada um dos 3 Grupos de Trabalho do IPCC, 3 informes especiais temáticos, mais o Relatório Síntese, que tem 8 mil páginas e foi lançado em março, junto ao Resumo Para Responsáveis Por Políticas Públicas. 

O Relatório fornece a melhor e mais abrangente avaliação da crise, não deixa qualquer margem para os negacionistas, nem permite mais a adoção de medidas cosméticas. De acordo com essa verdadeira enciclopédia do colapso climático, a queima dos combustíveis fósseis e o uso insustentável dos recursos já provocou um aumento médio de 1,1ºC na temperatura do planeta, podendo chegar ao limite de 1,5ºC e até ultrapassá-lo antes de 2040. Mantido o cenário atual, o aquecimento pode ultrapassar os 2ºC por volta de 2050 e chegar a 3,6ºC no fim do século 21 — com potencial para alcançar os 4,6ºC. 

Cada fração de aumento nas temperaturas multiplica os efeitos devastadores do aquecimento. Cada 0.5°C de aumento da temperatura causará aumentos perceptíveis na frequência e gravidade das ondas de calor, inundações repentinas e secas em larga escala e por tempo prolongado. Para se ter uma ideia dessa escala, ondas sufocantes de calor que surgem em média uma vez a cada 10 anos, ocorrerão 4 vezes mais num cenário de aquecimento de 1.5°C e até 6 vezes se o aumento for de 2°C.

Tudo isso lembrando que, mesmo dentro do limite de 1,5°C fixado pelo Acordo de Paris, já não estaríamos num cenário seguro para todos. Caso haja sucesso e o aquecimento seja limitado a 1,5°C, calcula-se que 950 milhões de pessoas em todo o mundo estarão expostas a um quadro de estresse hídrico, estresse térmico e desertificação, com uma parcela de 24% da população mundial exposta a inundações. Ao ritmo que estamos, a Terra se tornará inabitável bem antes do previsto. 

AÇÃO CLIMÁTICA JÁ!

Por tudo isso, em todo o mundo, não é hora de cruzar os braços, e só reclamar do calor não adianta. 

Se é proibido protestar em Dubai, precisamos protestar nas redes e nas ruas do resto do planeta. 

Uma redução das emissões precisa acontecer já, de maneira drástica e continuada. É preciso retirar todos os subsídios e aumentar progressivamente os impostos sobre o petróleo e seus derivados. 

O dinheiro que falta para investir na transição energética e para reduzir nossa vulnerabilidade frente à mudança do clima precisa vir da indústria do petróleo e do bolso daqueles que enriqueceram com seus lucros imorais e mortais. 

Até o dia 12, em todo o mundo, é hora de AÇÃO CLIMÁTICA JÁ!