Revitimizados: Indígenas atacados por policiais saem do hospital para enfrentar acusação na delegacia
Presos em flagrante, são ouvidos neste domingo (26) e podem ser indiciados por crimes como tentativa de homicídio contra policiais, formação de quadrilha e roubo
Uma idosa, adolescentes e uma universitária que foram feridos durante a ação violenta e ilegal de despejo da polícia de Mato Grosso do Sul contra grupo de cerca de 30 indígenas do povo Guarani Kaiowá, foram do hospital – onde estavam sob custódia policial -, direto para a delegacia de Amambai (MS). Presos em flagrante, são ouvidos neste domingo (26) e podem ser indiciados por crimes como tentativa de homicídio contra policiais, formação de quadrilha e roubo.
As defensorias públicas do Estado e da União acompanham o caso para garantir que os direitos dos indígenas sejam resguardados. Segundo a defensora pública da União, Daniele Osório, o defensor público Lucas Pimentel acompanha a oitiva policial. As defensorias destacaram um intérprete para acompanhar os indígenas.
“Depois de serem ouvidos, vão para a audiência de custódia. Estamos aguardando o resultado. Vamos acionar a Justiça Federal. Entendemos que o que acontece com os Guarani Kaiowá envolve toda a coletividade indígena”, explica a defensora pública da União.
Para justificar a ação de despejo na propriedade rural do grupo VT Brasil, a polícia apresentou várias versões. Uma delas, que se tratava de uma ação contra o narcotráfico. Mas não houve qualquer apreensão de substância ilícita. Depois, que o grupo era composto por indígenas paraguaios, o que não se confirmou, já que só haviam indígenas Guarani Kaiowá.
Já sobre Vitor Fernandes, 42 anos, morto no confronto, alegaram que o indígena teria atirado contra o helicóptero da polícia, usando um fuzil. A arma também não foi apresentada.
Ao menos dez pessoas ficaram feridas no confronto e por coincidência, ou não, são estes que estão presos. Os relatos e imagens do ataque indicam que a PM fez uso de veículos, de armamento letal e não letal e, inclusive, de um helicóptero, utilizado como plataforma de tiro contra as famílias indígenas da retomada, incluindo crianças e idosos.
Os policiais alegam ainda, que os indígenas tentaram atingi-los e alguns policiais foram feridos, mas não há relatos sobre a situação de saúde deles, pois foram atendidos brevemente e liberados.
À espera infinita pela demarcação de suas terras, que originalmente eram habitadas por eles e hoje são ocupadas por produtores rurais – estes sim, invasores – o grupo de Amambai (MS) decidiu retomar o território ancestral Guapoy.
O Conselho Indigenista Missionário (CIMI) explica que “Guapoy é parte de um território tradicional que lhes foi roubado – quando houve a subtração de parte da reserva de Amambai”. Com a retomada (termo utilizado pelos indígenas), entre quinta (23) e sexta, os policiais foram acionados. Agora, alegam que foram à propriedade para “coibir o crime contra o patrimônio”.
Clima de tensão
Depois de terem sido retirados da sede da fazenda, os indígenas ocupam área no entorno da fazenda. É lá onde desde este sábado (25) ocorre o velório de Vítor Fernandes. De acordo com a cosmovisão do povo Guarani Kaiowá, ele deve ser enterrado na área de retomada, mas cerca de 100 policiais ocupam o local. Então, para evitar confronto, por ora, o enterro será adiado.
Em nota, a Aty Guasu, associação que representa os Guarani Kaiowá, denuncia que a situação em Amambaí segue sob tensão.
“É uma tradição de nosso povo plantar nossos mortos onde tombaram. Está tradição é espiritual e contrariá-la pode até trazer mal agouro para todos. Vítor é vítima do Massacre de Guapoy. Exigimos o respeito para que nosso Vitor seja plantado na retomada onde sofremos ação violenta da PM. Temos notícias que circulam de que novamente, a tropa de choque da PM estaria se deslocando para cá. Se confirmado, novo massacre será iminente. Não podemos recuar. Pedimos que divulguem para que estejamos protegidos… Caso contrário logo estaremos lado a lado com Vitor no chão”.