Por Emily Pinto

A chegada do mês de dezembro em Belém do Pará causa alvoroço nos aeroportos e no comércio da cidade. O frenesi não se deve apenas ao período natalino; na verdade, é por conta de um presente que a capital paraense recebe desde 2012: o Festival Psica. O evento tem como base a missão de tornar a cultura latina acessível e, desde os primórdios, tem como principais atrações os ritmos da Amazônia e das periferias de Belém — hoje, é considerado Patrimônio Cultural Imaterial da cidade.

O que Jesus e o Psica têm em comum? Além de ambos serem escritos com cinco letras, os dois nasceram em uma cidade chamada Belém. Ambos também têm origem em famílias simples. No caso do Psica, Jeft e Gerson Dias — idealizadores do festival — são irmãos que cresceram no bairro Cidade Nova 4, região metropolitana de Belém, e acompanhavam o pai comerciante no desafio das vendas. A mercadoria? CDs e pen drives com músicas de aparelhagens. Jeft conta que ele e o irmão também acompanhavam o pai em alguns festivais no interior do estado.

“A nossa vida inteira foi muito circulando nesse ambiente de festival. Vixe, fui várias vezes ao Festival do Caranguejo, em São Caetano de Odivelas, ao Verão do Marajó. Então, a gente tá muito envolvido nisso e acabou que se criou uma paixão muito grande por música periférica, por cultura periférica, por expressões periféricas”, afirma o produtor cultural.

Com o tempo, essa paixão se transformou em movimento e, assim, nasceu o Festival Psica, em 2012.

O evento começou em espaços com menor lotação, como a Casa Mangueirosa e o Espaço Náutico Marine Club. Hoje, os dois dias não gratuitos acontecem no Estádio Olímpico Mangueirão, com quatro palcos simultâneos e um de aparelhagem. O público também mudou. No início, o evento reunia, em média, de 3 a 4 mil pessoas; em 2024, mais de 80 mil pessoas passaram pelos três dias de festival.

Fotos: @midianinja

A vontade de estar no Psica furou a bolha paraense. É comum ver pessoas de outros estados do Brasil afirmarem que sonham em vir ao festival e conhecer Belém. Gerson Dias diz que o Psica também é uma forma de atrair visibilidade para a capital paraense:

“A gente usa muito essa isca que é o Psica para chamar, atrair a galera para Belém, para conhecer a nossa cultura, conhecer a nossa culinária, conhecer as nossas praias também. Muita gente que vem para o Psica fica três dias antes, três dias depois, justamente para conhecer e vivenciar a cidade, ter essa experiência imersiva em tudo que a cidade proporciona.”

Não é à toa que, em 2025, poucos dias antes da 14ª edição do festival, o Psica foi declarado Patrimônio Cultural Imaterial da Cidade de Belém. O projeto, defendido pela vereadora Marinor Brito (PSOL-PA), reconhece a relevância que o Psica tem para o turismo, a economia e a disseminação cultural.

“Esse reconhecimento que chegou é superimportante porque é o nosso reconhecimento de um trabalho de 12 anos, um trabalho árduo, difícil demais. Trabalhar com cultura aqui, desde 2012, como a gente vem trabalhando, é muito difícil. Até fazer engrenar, tem que ter muita dedicação, muito esforço e acreditar muito no projeto”, explica Gerson.

O Psica deixou de ser apenas um festival de música; hoje, representa identidade e liberdade, manifestadas ao longo dos três dias de evento de diversas formas: roupas, cabelos, unhas, sapatos. Para além do visual, é também o momento em que prevalece o sentimento de pertencimento e orgulho latino — um povo historicamente reprimido, mas que canta seus lamentos em ritmo de cumbia, salsa, brega e samba. A conexão do Psica é pan-amazônica.

Em meio à edição de 2025 do festival, Gerson Dias deixa um recado para quem, assim como ele e o irmão, sonha em viver da cultura e da arte na Amazônia:

“Se a gente tem um sonho, se todo mundo tem um sonho, tem que acreditar e dedicar tempo total, integral, para que esse sonho aconteça, porque isso vai dar certo. É um movimento natural do espaço-tempo que a gente vive.”

Ter conquistado o título de Patrimônio Cultural Imaterial do Pará não limitou os esforços dos irmãos; muito pelo contrário. Agora, os dois esperam atrair mais olhares para o evento, principalmente de patrocinadores, para garantir cada vez mais qualidade ao festival e também qualidade de vida para quem trabalha com ele — da montagem do palco aos fotógrafos.

O Retorno da Dourada, tema do evento em 2025, fala justamente sobre a valorização daquilo que o território oferece: seja a música, a culinária, os saberes ou o reconhecimento do Psica, um festival produzido como presente para a população do Pará e do mundo.